Crítica “Antes da Meia-noite”

Filme investiga se existe vida após o romance

Redação O Tempo

Por Daniel Oliveira
Publicado em 13 de junho de 2013 | 03:00
 
 
Jesse e Celine encaram o peso da realidade de uma vida a dois Diamond / divulgação

“Assim como o nascer e o pôr-do-sol, ela simplesmente... desaparece”. A fala de uma das personagens de “Antes da Meia-Noite” sobre a memória do marido falecido resume a proposta do diretor Richard Linklater e dos atores Ethan Hawke e Julie Delpy para o terceiro capítulo da história de Jesse e Celine.
 

Os idílios amorosos de “Antes do Amanhecer” e “Antes do Pôr do Sol” não eram realidade. Eram fantasias românticas de um dia só. Casados e com duas lindas filhas gêmeas, os dois quarentões têm a primeira chance de encarar essa realidade durante o último dia das férias da família na Grécia.


A mudança começa pelo fato de que, ao contrário dos longas anteriores, não existe um dispositivo temporal em “Antes da Meia-noite”. Não há um avião ou trem para pegar. A bomba-relógio que aguarda Jesse e Celine ao fim do capítulo é o “resto da vida”, esse monstro que assombra a maioria dos casais.


A segunda mudança para sair daquela fantasia idealista é que, aqui, o casal lida sistematicamente com personagens além deles mesmos. Em uma das melhores cenas do filme, os dois almoçam com uma família grega e escutam a história de cada casal.


É como se Linklater e os atores abrissem pela primeira vez as portas de seu universo para ouvir os romances dos fãs da trilogia e mostrar que não existe nada de tão especial na história de Jesse e Celine. Todo casal teve seus momentos “Antes do Amanhecer” e “Antes do Pôr do Sol” e toda história de amor é especial à sua maneira.


O processo culmina no ato final em um quarto de hotel, quando Jesse e Celine têm, pela primeira vez na trilogia, uma briga de verdade. É ali que “Antes da Meia-Noite” mostra que, com filhos, contas a pagar e a convivência diária, o romance termina. Os longos planos-sequência com os dois personagens próximos – que ressaltavam a química magnética do casal – dão lugar a uma decupagem mais rápida, com cortes secos e Jesse e Celine longes um do outro no enquadramento.


A briga é antecipada em uma cena no início do filme, quando Jesse menciona os personagens que está criando para seu novo livro. Ao falar de um homem que tem uma constante sensação de déjà vu ou de outro que não reconhece ninguém, nem a si mesmo no espelho, ele revela suas próprias neuroses.


Os quatro personagens citados nessa cena serão as máscaras alternadas por Jesse e Celine na discussão e que revelam as frustrações de qualquer casal junto há muito tempo. Desde o primeiro filme, quando fingem ligar para amigos no bar, os dois usam joguinhos de encenação para testar a temperatura de seu relacionamento.


Desta vez, a encenação serve para revelar como, a longo prazo, o amor é um sentimento egoísta, intolerante e exigente. E quando isso acaba com o romance, algo que acontece com todo casal, os que permanecem juntos são aqueles que se tornam melhores amigos um do outro.


E é aí que a trilogia de Jesse e Celine se mostra a história de dois melhores amigos que têm a sorte de se apaixonar um pelo outro. Não por acaso, a única trégua durante a briga é quando ele pede a ela que pense como amiga dele. O que “Antes da Meia-Noite” tenta descobrir é se essa amizade incrível pode sobreviver sob o peso do amor maldito de cada dia.