Bananada 2015

Imersão musical no cerrado

Com mais de 50 bandas e uma semana de duração, 17ª edição coloca festival no hall dos grandes eventos do país

Por Lucas Buzatti
Publicado em 19 de maio de 2015 | 03:00
 
 
[CREDITO]drin cortes

Goiânia. A imensidão do céu azul e a vegetação rasteira anunciavam, pela janela, que nosso ônibus já rasgava as aplainadas rodovias do Centro-Oeste brasileiro. Era quinta-feira quando, após mais de 13 horas de estrada, desembarcamos em Goiânia em missão jornalística: cobrir os quatro últimos dias da 17ª edição do Festival Bananada, que acontece na cidade desde 1997. O amigo Drin Cortes, artista que ilustra essa reportagem, me acompanhava na aventura de registrar impressões e viagens in loco sobre os mais de 20 shows que viríamos a assistir. Seguimos ao encontro de nossa querida anfitriã, uma amiga que divide moradia com integrantes do Boogarins – a banda-prata-da-casa do momento, uma das atrações mais esperadas do festival.
Nosso receio de acordar a turma se desintegrou instantaneamente quando entramos no apartamento. É que a festa do dia anterior ainda não tinha acabado, pelo contrário; estava no auge. Figuraça, o carioca Diogo Valentino, baixista da banda Supercordas, animava o rolê com causos e sacadas hilárias, enquanto Dinho, o vocalista do Boogarins, sapecava um set de You Tube com pedradas de William Onyeabor, Ave Sangria, Beto Guedes e Tom Jobim, entre talagadas de cachaça.

Mais tarde, os integrantes do quarteto goiano se juntaram a Diogo formando uma banda instrumental de improviso, apelidada The Abdalas, que encheu de psicodelia e experimentalismo um charmoso bar e brechó da capital goiana.

Três dias depois da abertura do festival, na segunda-feira, a cidade ainda reverberava o show de Caetano Veloso, que deu um “abraçaço” em mais de 3.500 pessoas no espaçoso Centro Cultural Oscar Niemeyer, desenhado pelo arquiteto carioca para receber grandes eventos artísticos – de fazer inveja em Belo Horizonte.

Entre terça e quinta-feira, a programação migrou para pequenas casas da cidade, com bandas como Luziluzia (GO), Maurício Pereira (RJ) e Ternorei (SP). Pesado e em boa forma, o Merda, icônica banda de hardcore capixaba, encerrou a primeira parte do festival com um show devastador no Diablo Pub, irrompendo moshs entusiasmados no agradável inferninho.

Na sexta-feira, a festa voltou para o Centro Cultural Oscar Niemeyer com um line-up que contava com apenas uma apresentação certeira; o resto era surpresa. Eu já tinha visto os Boogarins em Belo Horizonte, na última edição do Transborda, mas foi incrível assistir aos meninos tocarem para o público cativo de sua cidade-natal, com uma estrutura de som gigantesca e bem montada. A sintonia do jovem quarteto arrebatou a plateia, ainda pouco volumosa, e me causou novamente a sensação de testemunhar o início do voo de uma banda que tem tudo para marcar o nome na música brasileira.

O show começou com uma música-introdução do aguardado segundo disco, “Manual”, que também deve sair neste ano, assim como o debut “Plantas que Curam”, lançado em 2013 nos Estados Unidos, que chega ao Brasil pela Skol Music. Diferentemente de várias outras apresentações do line-up, a mesa de som foi totalmente competente, criando um som alto, com elementos equilibrados e texturas espaciais e macias. Entre caras, bocas e vocalizações, o showman Fernando Almeida, o Dinho, cantou sucessos como “Doce”, “Lucifernandis” e “Erre”, acompanhado pelo prodígio guitarrista Benke Ferraz, o competente baixista Raphael Vaz e o baterista Ynaiã Berntholdo, ex-Macaco Bong, que deixou o som do Boogarins ainda mais conciso e potente desde sua entrada.

O surf rock viajandão dos norte-americanos do Allah-Las, de Los Angeles, já havia instaurando a aura psicodélica da noite para os poucos que prestavam atenção. Em alguns shows, de bandas menos conhecidas, o público ficava bem disperso e aproveitava para comprar uma cerveja ou um drinque – que compensava bem mais, diga-se de passagem, já que R$ 6 numa lata de cerveja não é lá um dos preços mais honestos. Mas vale destacar que os preços de alimentação, assim como as filas para comprar e ir ao banheiro, eram menores do que qualquer outro grande festival.

O som latino hiponga do Francisco El Hombre, de Campinas, foi responsável por dar um pouco de suingue à desanimada programação do dia, que teve shows fracos como os do Jalloo, dos gaúchos do Wannabe Jalva (muito prejudicados pela mesa de som) e dos mineiros do Patu Fu. Apesar do som limpo e audível, e da habilidade do guitarrista John Ulhoa, as músicas “fofinhas” do grupo de Fernanda Takai ficaram totalmente deslocadas no line-up. Mas não deixaram de despertar o interesse da plateia, que observou atenta, ainda que desanimada, até o fim.