Muito além do Jaspion

Mesmo fora da TV, séries do Japão têm público cativo

Gênero completa seis décadas neste ano em meio a nostalgia e renovação

Por Priscila Brito
Publicado em 05 de janeiro de 2014 | 04:00
 
 
Dedicação. O baiano Raphael Maiffre dirige o projeto Mega Hero, que reúne virtualmente e em encontros em Salvador fãs de tokusatsu Ana Luiza Bélico

Não é “Friends”, nem “Breaking Bad”. Sequer passa na televisão – ou no Netflix. Mas, ainda assim, são assistidas à exaustão, mesmo após seu fim, como a história dos seis amigos de Nova York, e arrebanham seguidores fiéis até o último episódio, como os fãs da saga de Walter White. São as chamadas tokusatsus, séries japonesas focadas em super-heróis e efeitos especiais.
 

Mesmo tendo sumido da TV aberta após seu auge no Brasil, nos anos 1990, quando as tardes da TV Manchete eram povoadas por Jaspion, Jiraya e afins, essas produções seguem conservando e atraindo um público aficionado que se reúne em comunidades virtuais e eventos para difusão e troca de material e notícias sobre as séries.

Duas das principais comunidades do gênero hoje no Brasil são a Senpuu, uma das pioneiras, fundada em 2006 pelos mineiros Mozart Gomes, Luiz Schenk e Ana Carolina Dias, e a Mega Hero, em atividade desde 2011 com os baianos Raphael Maiffre e Leonardo Cruz à frente do projeto. Apesar da origem regional, os dois grupos agregam fãs de todo o país em sites e redes sociais. São jovens entre 20 e 30 anos “órfãos” das séries exibidas na Manchete, movidos pela nostalgia dos personagens da infância, e adolescentes entre 12 e 15 anos atraídos pela linguagem renovada de um mercado que neste ano completa seis décadas de existência e nunca parou de produzir – o filme “Godzilla”, de 1954, é considerado o marco das tokusatsus e só a Toei, principal produtora do segmento, realizou quase 70 séries de TV entre 1959 e 2013.

“Existem séries para o público infantojuvenil, só para crianças, e algumas para adultos, que têm carga dramática muito maior. Algumas têm roteiro bem elaborado, outras nem tanto, mas são todas focadas em super-heróis”, detalha Mozart Gomes, 28, fã de tokusatsu da “geração Manchete”. Ele calcula que já tenham sido feitas mais de 400 produções do gênero.

Com bastante precisão, Mozart e Raphael citam os mesmos três nomes ao serem questionados sobre as três séries mais cultuadas pelo público brasileiro em meio a tantas produções: “Jaspion”, “Kamen Rider Black” (que no Brasil sofreu uma inversão no título e foi exibida como Black Kamen Rider) e “Changeman”.

Entre as mais recentes, responsáveis por atrair o público mais jovem, ambos mencionam “Gokaiger”. “Os efeitos especiais tiveram uma melhora bruta. Os personagens também são mais jovens, de aparência mais adolescente. O que se manteve foram os valores de companheirismo, força e união, que são as marcas das tokusatsus”, nota Raphael, 21, ao comparar séries mais recentes a produções clássicas. “As séries antigas, que seguravam crianças e adolescentes até 10, 12 anos, já não seguram as crianças de hoje”, conclui o jovem, que descobriu as séries em fitas VHS tomadas de empréstimo em locadoras, quando esses programas já perdiam espaço na TV aberta.

Garimpo. Fora da televisão brasileira, as séries (novas e antigas) hoje são garimpadas na internet. Segundo Mozart, a principal fonte de material são sites norte-americanos que legendam em inglês os programas. Posteriormente, as legendas são vertidas para o português. Em alguns casos, os episódios não são legalmente liberados para download. Raphael lamenta a carência de lançamentos oficiais. “As empresas perdem com isso. Se lançassem DVDs aqui no Brasil, teriam um público para consumir”.

Por enquanto, os olhos das grandes produtoras foram abertos apenas para o mercado norte-americano. Em setembro do ano passado, a Toei lançou nos Estados Unidos o canal pago Toei Japan Channel, com 24 horas de programação dedicadas à exibição de tokusatsus.

Dia do Tokusatsu. Mesmo diante da indiferença das donas do mercado, até dia para festejar as séries japonesas o Brasil já tem. Em 2012, o Mega Hero criou o Dia do Tokusatsu, que desde então é celebrado no dia 3 de novembro, mesma data em que o filme “Godzilla”, precursor do gênero, foi lançado nos cinemas, em 1954. A ideia é promover o universo tokusatsu por meio de encontros e manifestações nas redes sociais. “Queríamos comemorar, mas também chamar mais gente pra conhecer essas séries. Tivemos um feedback muito positivo. De 2012 pra 2013, mais pessoas participaram da data. Não imaginávamos que tanta gente iria aderir”, avalia Raphael.

Conheça

Notícias, críticas e podcasts dedicados aos tokusatsus estão no www.senpuu.com.br. No www.megahero.com.br, também há novidades sobre o gênero, além de cobertura de filmes e séries em geral