Artes cênicas

Na superfície das relações 

Ao lado de Tato Gabus Mendes, Vera Fischer volta aos palcos com comédia do dramaturgo inglês Alan Ayckbourn

Por Joyce Athiê
Publicado em 28 de novembro de 2015 | 04:00
 
 
Traição. Montagem brasileira de “Relações Aparentes” ironiza comportamento da classe média e aborda o rompimento dos cânones familiares a partir de situações de extrema comicidade e sarcasmos Caio Galucci/divulgação

Quase uma década sem trabalhar no teatro, Vera Fischer retorna para interpretar os conflitos de uma mulher traída pelo marido. “Já se passaram nove anos e parece que foi nesta sexta. Mas o teatro foi onde aprendi muita coisa dessa arte de interpretar, e acho que é mesmo como andar de bicicleta’, diz a atriz.

A última vez que subiu nos palcos foi em 2006, no elenco de espetáculo “Porcelana Fina”, do dramaturgo parisiense Georges Feydeau. Agora, ela divide a cena com os atores Tato Gabus Mendes, Michel Blois e Anna Sophia Folch para encenar texto de Alan Ayckbourn, premiado dramaturgo britânico. Um dos principais sucessos do autor, a comédia “Relações Aparentes” terá única apresentação em Belo Horizonte, neste sábado, às 21h, no Grande Teatro do Palácio das Artes.

A história narrada já conquistou importantes prêmios do teatro britânico e da Broadway com outras produções. E, na montagem brasileira, dirigida por Ary Coslov e Edson Fieschi, a fidelidade ao texto foi regra para contar os desencontros vividos entre dois casais na Londres de 1960. “Não fizemos nenhuma adaptação, não seria necessário. As confusões e os sentimentos vividos na trama transcendem o tempo”, afirma Vera.

Mas o humor do inglês ganhou alguns retoques. “Nós tentamos manter a sobriedade que Alan imprime, mas é inevitável que, como artistas, deixemos nossas marcas. Acho que a nossa versão ganha uma certa latinidade. É mais extrovertida e menos contida”, diz Tato, pontuando que não há escrachos.

“Relações Aparentes”, escrita em 1965, é uma das principais comédias de Ayckbourn, relevante nome do teatro contemporâneo britânico, conhecido por sua veia irônica. Sua biografia aponta para uma criança que cresceu vendo a mãe escrever, na cozinha, crônicas para a imprensa feminista e, em 1952, quando ele ganhou uma bolsa de estudos, decidiu estudar jornalismo.

Foi depois da graduação que ele se aproximou do teatro. Seus primeiros escritos eram feitos sob o pseudônimo Roland Allen, e, mesmo com alguns trabalhos mal recebidos pela crítica, ele escreveu cerca de 80 peças.

“Alan não é o autor mais montado da Inglaterra depois de Shakespeare à toa. Sua carpintaria teatral é de excelente nível. O autor consegue pela comédia, ironia e sarcasmo, mergulhar nas facetas interpessoais do ser humano de maneira magistral. E isso me chama muito a atenção”, conta Vera. Para ela, o mais peculiar de Ayckbourn é a sutileza do jogo de palavras. “Nem tudo que se diz é realmente o que se pensa”, diz a atriz.

Em “Relações Aparentes”, o autor ironiza o mundo da classe média londrina, tratando do rompimento dos cânones familiares com a traição entre casais. A trama se inicia com as desconfianças de Greg (Michel Blois), que acreditar estar sendo traído por Ginny (Sophia Folch), com quem é casado. Intrigado com uma viagem de sua esposa que vai visitar “seus pais” no interior, ele decide segui-la. O fato é que Ginny está indo visitar seu amante, um homem bem mais velho, para dar um fim em seu relacionamento secreto.

“Essa peça fala do casamento, das relações a dois, tema de grande comunicação com o público. O tema é abordado de uma maneira divertida, mas também reflexiva e crítica”, conta Vera. Sua personagem é Sheila, esposa de Philip (Tato Gabus Mendes), que a trai com Ginny. “Apesar da história se passar em 1965, Sheila é uma mulher que se pode perfeitamente encontrar nos dias de hoje. Uma mulher que luta pelo seu casamento, quer ser vista, quer ser notada pelo marido, e que, como mulher, também é capaz de tecer uma teia de aparências para atingir seus objetivos”, explica a atriz.

Mas a leitura feminista da situação pode ser apenas aparente. “O feminismo aparece, mas o final surpreende e tira essa possível análise. Desconfia-se de tudo. Não tem nenhum culpado ou inocente na história”, afirma Tato.

Agenda

O quê. Espetáculo “Relações Aparentes”

Quando. Neste sábado, às 21h

Onde. Grande Teatro do Palácio das Artes (av. Afonso Pena, 1.537, centro)

Quanto. Plateia I e II: R$ R$ 60 (inteira) e R$ 30 (meia); Plateia superior: R$ 50 (inteira) e R$ 25 (meia)