Luto

O adeus ao Bond clássico

Ator que mais interpretou o agente 007 no cinema, o inglês Roger Moore faleceu nessa terça-feira, aos 89 anos, na Suíça

Por Da Redação
Publicado em 24 de maio de 2017 | 03:00
 
 
Ícone. Moore foi o primeiro inglês a viver Bond e o ator que mais viveu o personagem no cinema MGM/ Divulgação

LONDRES, INGLATERRA. O ator britânico Roger Moore, que interpretou o agente James Bond em sete filmes, faleceu aos 89 anos, na Suíça, vítima de câncer, anunciou a família, nessa terça-feira (23). “Com grande pesar anunciamos que nosso querido pai, Sir Roger Moore, morreu, na Suíça, após uma batalha breve, mas corajosa, contra o câncer”, afirmou a família em uma nota divulgada no Twitter. “O amor que o cercou em seus últimos dias é tão grande que não pode ser medido em palavras”, diz a nota, assinada por seus filhos Deborah, Geoffrey e Christian. “O afeto que nosso pai sentiu quando entrava no palco ou diante de uma câmera o manteve bem e ocupado”, completaram ao recordar sua última aparição pública, no Royal Festival Hall de Londres, em novembro de 2016. O ator terá um funeral privado em Mônaco.

Moore tornou o agente 007 um cavalheiro inglês com mais fleuma, após a fase viril do escocês Sean Connery. O ator deu a Bond, “Jimmy” Bond – como o chamava – um gesto característico, a sobrancelha levantada para indicar ironia. Um gesto que repetiu nos sete filmes em que interpretou o agente secreto a serviço de Sua Majestade.

Era uma estrela cinematográfica da velha guarda, que vivia de modo luxuoso entre a Suíça e a Riviera francesa. Foi amigo do cantor norte-americano Frank Sinatra e do ator britânico David Niven. Também foi uma das primeiras estrelas a emprestar sua imagem para a beneficência como embaixador do Unicef e nunca se gabou de um grande talento de interpretação. “Não sou do estilo ‘assassino frio’, por isso interpreto mais para fazer rir”, disse em uma ocasião.

Roger George Moore nasceu em 14 de outubro de 1927 no subúrbio londrino de Stockwell, filho de um policial e de uma dona de casa. “Não foi ruim ser um jovem de Stockwell, onde olhava maravilhado para a tela grande, sem imaginar que algum dia seria parte desse mundo mágico”, destacou na autobiografia “My Word Is My Bond”.

Antes dos palcos, Moore trabalhou como cartunista em Londres, ganhando US$ 7 por semana. Iniciou a carreira de ator como figurante nos anos 40, antes de entrar para a Real Academia de Artes Dramáticas. Assinou contrato com os estúdios MGM, mas durante os anos 50 limitou-se a papéis de coadjuvante, sustentando-se como modelo.

A fama veio na década de 1960, quando interpretou Simon Templar, na série de TV britânica “O Santo”, exibida em diversos países e inspirada no sucesso de James Bond, que ele viria a interpretar. No início dos anos 70, participou de outra série de grande sucesso, “The Persuaders”, uma parceria com o norte-americano Tony Curtis. Moore explica em sua autobiografia que havia sido procurado em 1967 para interpretar Bond, mas só assumiu o papel do personagem criado pelo escritor Ian Fleming, o espião com licença para matar, em 1973. Ele tinha 45 anos, dois anos e meio a mais que Sean Connery, o ator a quem substituiu como 007.

Moore fez sua estreia no filme “Com 007 Viva e Deixe Morrer”, depois que os produtores o obrigaram a perder peso, entrar em forma e cortar o cabelo. Depois vieram “007 contra o Homem com a Pistola de Ouro” (1974), “007: O Espião que Me Amava” (1977), “007 contra o Foguete da Morte” (1979), “007: Somente para os Seus Olhos” (1981), “007 contra Octopussy” (1983) e, finalmente, “007 na Mira dos Assassinos” (1985), quando tinha 57 anos.

“Ele ampliou o escopo do que o Bond poderia ser como personagem e atingiu um público mais infantojuvenil, que não via os filmes com Sean Connery. Isso rejuvenesceu a franquia”, avalia o crítico Carlos Quintão. Para ele, o trabalho de Moore perpetuou o legado de 007, que, sem o ator, poderia ter desaparecido após a aposentadoria de Sean Connery como o agente. “Ele é o Bond dos anos 70, mais espalhafatoso, satirizando sucessos do cinema, como ‘Star Wars’ e ‘Caçadores da Arca Perdida’, com um humor britânico, quase a ponto de virar uma paródia”, descreve.

A rainha Elizabeth II o tornou cavalheiro em 2003 por seu trabalho para o Unicef. Também era um ativista contra a produção de foie gras. Em 1993, foi operado por câncer de próstata, em 2003 teve que colocar um marca-passo e, dez anos depois, foi diagnosticado com diabetes.

Moore se casou quatro vezes e deixou dois filhos, Geoffrey e Christian, e uma filha, Deborah. Ao jornalista Piers Morgan, da TV inglesa, ele confessou que suas duas primeiras esposas, a patinadora Doorn Van Steyn e a cantora Dorothy Squires, o teriam agredido. Depois se casou com a atriz italiana Luisa Mattioli e, por fim, com a dinamarquesa Kristina Tholstrup. (AFP, com Daniel Oliveira)


‘Era bonito demais para 007’

Atuando em sete filmes durante 12 anos, Roger Moore acabou tornando-se sinônimo de James Bond

SÃO PAULO. Sim, Roger Moore, que morreu, na Suíça, em decorrência de um câncer, como anunciou a família, nessa terça-feira (23), era um homem bonito. E é preciso ser um pouco apressado para imaginar que isso, necessariamente, facilita a vida dos atores.

Moore, por exemplo, foi considerado bonito demais para o papel 007, quando o primeiro filme da série foi produzido, em 1962 (“O Satânico Dr. No”). O papel foi para o escocês Sean Connery.

Roger teve de se contentar em ser Simon Templar, o aventureiro “O Santo” da série de TV britânica. E séries de TV não gozavam, na época, do prestígio que têm hoje: era coisa para atores de segunda linha vista por adolescentes e crianças. Ponto.

Já era esse o destino que se anunciava para Roger Moore como o intrépido Ivanhoé, uma espécie de vice de Robin Hood, em que despontou pelo menos como galãzinho carismático ao longo dos anos 1958 e 1959.

Seguiram-se séries de TV, papéis em filmes nem tão conhecidos assim: tudo o credenciava a uma carreira mais que discreta até 1973, quando surgiu a oportunidade de se tornar James Bond, depois que Sean Connery pulou fora e George Lazenby não emplacou no papel.

Ao longo de sete filmes em 12 anos, Moore acabou tornando-se sinônimo de James Bond. Ninguém pense que ficou amargurado com a identidade.

Destino. A vida do ator nascido em Stockwell não foi fácil. Depois que deixou os estudos regulares, aos 18 anos, fez sua primeira figuração em cinema em “César e Cleópatra” (1944) e estudou na Royal Academy of Dramatic Arts.

Tudo mais promissor do que proveitoso. Entre tentativas de emplacar em Hollywood e retornos à Inglaterra, parecia destinado ao anonimato. Já maduro, com seus 45 anos (nasceu em 10 de outubro de 1927) foi finalmente aceito como James Bond: o estigma da beleza de galã de matinê estava vencido. Seria tão injusto dizer que fracassou quanto que foi um 007 extraordinário.

Moore não tinha as qualidades necessárias a fazer a série emplacar em 1962. Era preciso um tipo mais maduro, mais cínico, mais desenvolto: Connery era o tipo certo. Também não seria hoje em dia, quando Daniel Craig relança o personagem e adapta-o ao gosto do novo século. Mas
Moore deu sequência ao personagem com correção e ânimo. Mais que isso, sua passagem pelo papel marca pela resistência.

Ninguém até hoje durou tanto no papel quanto ele (verdade seja dita: Daniel Craig está chegando lá, mas com míseros quatro filmes). Ninguém escapou mais da morte quanto o ator que estreou no papel no sintomático “Com 007 Viva e Deixe Morrer”.

Moore, que teve carreira sem brilho depois do papel, notabilizou-se sobretudo pelo trabalho humanitário. E, na vida real, escapara da morte em 2003, quando sofreu uma parada cardíaca em Nova York. Desta vez teve, conforme os familiares, uma batalha dura porém curta contra o câncer. (Inácio Araújo)


Tributo

Homenagem de 4 outros James Bond

Quatro atores que interpretaram o agente secreto James Bond usaram as redes sociais para prestar homenagens a Roger Moore. Sean Connery, Timothy Dalton, Pierce Brosnan e Daniel Craig publicaram mensagens no Twitter e Instagram. “Minhas condolências à família de Roger Moore, um grande homem e cidadão do mundo. Sentiremos sua falta”, escreveu Sean Connery.

Pierce Brosnan escreveu “que é realmente com o coração pesado que eu ouvi a notícia de sua passagem. Você era uma grande parte da minha vida”, publicou Daniel Craig em seu Instagram.

No Brasil. Roger Moore fez aquele que é muitas vezes considerado o pior longa – justamente aquele que levou o agente ao Brasil: “007 contra o Foguete da Morte”. No país, Bond duelou contra um oponente de dentes de aço em pleno bondinho do Pão de Açúcar, pegou um Carnaval de rua, passeou de táxi por Copacabana com seu português de gringo, deu um rolê pelos pampas e encontrou as cataratas de Iguaçu, pasme, numa Amazônia com pirâmides maias.