Artes visuais

Obras em contínua exposição

Com relevante acervo de arte pública, BH enfrenta desafios em relação às políticas de instalação e conservação dos trabalhos

Por Daniel Toledo
Publicado em 17 de maio de 2011 | 01:39
 
 

A cada mês, várias exposições de artes visuais entram e saem de cartaz em Belo Horizonte, oferecendo ao público da cidade a oportunidade de conhecer incontáveis poéticas artísticas. Ao mesmo tempo, entretanto, um rico conjunto de trabalhos ocupa os espaços públicos da cidade, estabelecendo, em maior ou menor medida, relações com o próprio entorno e com seus frequentadores.


Amilcar de Castro, Mary Vieira, Franz Weissmann, José Pedrosa, Alfredo Ceschiatti, Ricardo Carvão Levy, Jorge dos Anjos e Léo Santana são apenas alguns dos artistas que, a partir de diferentes caminhos, oferecem suas criações a uma convivência irrestrita com moradores e visitantes da cidade.


“A arte, seja ela qual for, é uma atividade de criação de um para muitos. E quando isso se concretiza, quando muitas pessoas conseguem o acesso, a convivência e a interação com a arte, conseguimos contribuir para o desenvolvimento e o amadurecimento cultural do país”, afirma o artista Rodrigo de Castro, filho de Amilcar e um dos responsáveis pela divulgação da obra do pai.


Criador de trabalhos que habitam, por exemplo, as praças do Papa e da Liberdade, Ricardo Carvão Levy engrossa o mesmo coro. “É extremamente gratificante ver que um trabalho está saindo do espaço fechado em direção à cidade, e que ele vai estar ali por muitas décadas, como um testemunho da nossa época. Mais do que isso, é bom saber que um trabalho está aberto à apreciação de qualquer pessoa, independente de classe social ou nível cultural”, defende Carvão, que reconhece o limitado alcance dos ambientes institucionais da arte.

Já o artista Jorge dos Anjos, cuja obra é marcada por elementos da cultura africana, enxerga na arte pública a possibilidade de explorar questões como representatividade e identidades culturais.

“Penso, por exemplo, em um sujeito negro, que vive na periferia da cidade e, de repente, ao chegar em certo lugar, vê um trabalho que valoriza a sua cultura e as suas raízes”, reflete o artista, cujos trabalhos ocupam espaços como a lagoa da Pampulha e a praça de Santa Efigênia.


Desafios.Para além dos desafios inerentes a qualquer processo de criação artística, as obras de arte pública requerem de seus criadores esforços que, muitas vezes, ultrapassam o campo estético.


“A instalação de uma obra de arte em um espaço público é uma questão sempre complexa. É preciso que haja uma curadoria cuidadosa, além de um diálogo intenso com o público que, dali em diante, vai conviver com o trabalho”, pondera o curador e pesquisador Fernando Pedro da Silva.


Acostumado a criar obras de grandes dimensões, o artista Ricardo Carvão Levy ressalta outros aspectos que devem ser considerados ao longo do desenvolvimento de um trabalho. “É preciso pensar na proporção da obra em relação ao espaço que ela vai ocupar, além de tomar cuidados relacionados à aterração do trabalho e à sustentação da sua estrutura. Além disso, ainda é preciso prever e lidar com a possibilidade de vandalismo”, enumera.


Fernando Pedro, por sua vez, chama atenção para o papel da Prefeitura de Belo Horizonte (PBH) junto a essas obras. “Boa parte dos trabalhos que existem na nossa cidade não é sinalizada adequadamente e não é bem tratada pelo poder público”, diz.


“Não há, por exemplo, um instrumento específico para a gestão desses trabalhos, o que poderia ser feito por meio de parcerias com empresas de conservação. Se você instala uma obra, você precisa mantê-la”, completa.


Estímulo. Na visão do pesquisador, entretanto, algumas questões se impõem antes mesmo da instalação de uma escultura. “Seria importante haver iniciativas mais sistematizadas para a implantação de novas obras, como já aconteceu em cidades como São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Fortaleza, dentre outras. A estrutura da av. Paulista, por exemplo, é algo fantástico, em que o pedestre vai caminhando e se encontrando com trabalhos feitos por inúmeros artistas”, exemplifica.“O que se tem, atualmente, é o investimento do poder público por meio das leis de incentivo, que realmente deixa as portas abertas para esse tipo de trabalho. Por outro lado, é preciso que a prefeitura (PBH) dê mais atenção às iniciativas voltadas ao espaço urbano e, em alguns casos, torne os processos menos burocráticos”, analisa Fernando Pedro.


Rodrigo de Castro, de igual maneira, lamenta a tratamento dispensado pela prefeitura em relação à questão da arte pública. “Não vejo um planejamento para a seleção dos artistas e obras, com critérios coerentes de relevância cultural e histórica para a cidade. E com atitudes e medidas sérias e até simples, tudo isso poderia ser realizado”, afirma. 


O artista Jorge dos Anjos, por sua vez, acredita no surgimento de um novo cenário para a arte pública local. “Vemos que a cidade está se desenvolvendo e criando novos espaços de convivência e passagem, como a Linha Verde, por exemplo. É, sem dúvida, um excelente momento para que as políticas relacionadas à instalação de obras de arte pública passem a funcionar melhor”, aposta.