Música independente

Oscilações da cena autoral 

Produtores e donos de casas noturnas falam sobre comportamento do público de shows de rock em Belo Horizonte

Por gustavo rocha
Publicado em 31 de outubro de 2015 | 04:00
 
 
Porte médio. Na Autêntica se destaca a boa estrutura de palco e sua capacidade para 400 pessoas TM0131101505

Se a internet mudaria para sempre a relação que as pessoas têm com a música, com a supremacia dos downloads sobre os CDs, gerando uma nova ordem (econômica) na relação público, gravadoras e artistas, a mesma lógica parece imperar quando se observa o cenário da música autoral em Belo Horizonte, e, principalmente, a relação que seu público tem com os artistas. Desde as tradicionais casas de shows de música independente (como Matriz e A Obra) às recém-inauguradas (A Autêntica, por exemplo), é possível sentir uma dificuldade em se atrair a “moçada” para ouvir música autoral e, principalmente, o rock.

De modo similar, a profusão de atrações musicais na cidade parece não ser acompanhada pelo público, que já se mostrou mais entusiasmado com o que acontecia nos palcos independentes da cidade. “Antes, as pessoas que gostavam de música convergiam para o mesmo lugar. Cadê essa galera?”, indaga Bart Ramos, da 53HC, que organiza, há nove anos, o festival Flaming Night, com artistas da cena independente “É verdade que, quando começamos, não havia a quantidade de coisas que acontecem hoje na cidade”, pondera.

A Flaming Night parte da ideia de um festival difuso, que, ao invés de concentrar suas atrações, as deixa espalhadas em algumas ocasiões durante o ano. Assim, já foram feitas 28 edições. Em média, ocorriam cinco “nights” por ano. No entanto, em 2015, já no ritmo de “Então, É Natal”, o evento acontece somente agora pela primeira vez. “Eu me lembro da edição de 2010, com bandas ainda pouco conhecidas. Colocamos mais de mil pessoas no Lapa Multishow (espaço que se transformou em estacionamento recentemente). Hoje, estamos com uma procura muito menor na venda antecipada”, ressalta Bart.

Hoje, a 29ª edição recebe um dos ícones do hardcore, o Dead Fish, os goianos da Hellbenders, além das atrações locais Lively Water e Refuzer. “O Dead Fish já tem mais de dez discos, não precisa provar nada pra ninguém, e o Hellbenders é uma das bandas mais promissoras que a gente tem no Brasil na atualidade. Os caras foram para os EUA e gravaram no mesmo estúdio que o Foo Fighters e o Queens of the Stone Age. Os norte-americanos querem vê-los, e aqui não?”, reclama Bart.

Com mais de 40 anos de idade e muitos deles dedicados às produções de música independente, Bart alfineta os mais novos: “A festinha de DJ está sempre cheia, né? Será que música é só para dançar agora?”. Outro ícone da cena independente e noturna de BH, Claudão Pilha – que está à frente da Obra – não concorda plenamente com Bart. “As pessoas gostam de sair para dançar. Tem gente que nem era nascida quando A Obra abriu (a casa tem 18 anos de atividades) e que hoje frequenta o espaço. Aquela turma ficou velha, se casou, teve filhos, sei lá. Os tempos são outros”, pontua.

A Obra sempre abrigou shows de música independente, em noites durante a semana. No entanto, com o passar do tempo, foi preciso adaptar-se a uma nova realidade. “A gente percebia que, para quem não é bon vivant, os shows começavam tarde demais. Assim, agora eles começam às 21h e meia-noite o cara já está em casa, para trabalhar tranquilo no dia seguinte”, revela.

Além dos shows em dias da semana, Claudão resolveu apostar em uma nova faixa para a casa, nas noites de sábado, com o “Sábado 22h em Ponto”. “A gente tinha toda a estrutura aqui e não aproveitava. Então, a gente resolveu usar para fazer shows periódicos nesse horário. Começou uma vez por mês, depois passou para duas. O que sempre aconteceu é que o público geralmente vinha para encerrar a noite aqui, a partir de meia-noite. Com esse projeto, invertemos a mão. Ele ainda não está ficando cheio, mas é um processo lento mesmo”, revela.

Claudão vê o público da cidade com um comportamento atípico “É oscilante. Depende da atração. O sujeito é capaz de pagar R$ 200 para ver um show gringo na esplanada do Mineirão, mas não paga R$ 15 para ver o show do amigo”. Ainda assim, ele segue firme no propósito que o fez abrir A Obra. “Nós mantemos nossas raízes desde o início: música autoral independente e DJ com música que não toca na rádio. Já ouvi: ‘Não conheço nenhuma música que tocou aqui hoje, mas não consegui ficar parado’”, finaliza.

 

Agenda

  • O quê. Flaming Night
  • Quando. Hoje, às 21h
  • Onde. Local: Music Hall BH (avenida do Contorno, 3.239, Santa Efigênia)
  • Quanto. De R$ 50 a R$ 70(Inteira). Venda virtual na página: www.sympla.com.br