Sucesso

Reverência e provocação com o Clube da Esquina

Djonga diz que gosta e ouve muito o Clube e todos os artistas que o orbitam

Por Daniel Barbosa
Publicado em 10 de julho de 2017 | 03:00
 
 
Djonga tem feito mais shows em outros Estados do que em Minas 1993agosto / Divulgação

Djonga tem consciência de que, em pouco tempo, conquistou muito e, na hora de falar dessa trajetória, deixa a modéstia de lado. Essa postura está expressa na curiosa capa de “Heresia” – que reproduz a foto que estampa o clássico “Clube da Esquina”, só que substituindo a imagem dos dois meninos que aparecem sentados pela do próprio rapper, em dois cliques distintos – e no conceito que a embasa. Ele diz que título do álbum e a capa prestam, sim, uma reverência ao célebre movimento capitaneado por Milton Nascimento, mas também encerram uma provocação.

“Quis criar um disco com esse conceito de conflitar o estabelecido, com o significado do que é ser um herege mesmo. Sou um cara de BH, um lugar onde a cultura é grande, a arte é forte, mas onde quase ninguém consegue vingar. O Clube da Esquina deu certo, vingou, no sentido de romper as barreiras do Estado. É a questão do cânone. Quis, humildemente, me comparar. Assim como eles, consegui ter êxito na carreira”, diz, explicando o sentido dúbio da capa e do título. “É, ao mesmo tempo, uma homenagem e uma heresia, tipo, ‘quem é esse cara para estar fazendo isso?’. É a falta de medo que tem que se ter na arte”, afirma.

Ele diz que gosta e ouve muito o Clube e todos os artistas que o orbitam, mas ressalva que, em termos estéticos e de temáticas, seu trabalho tem uma feição bem personalista, que não herda nada do célebre movimento. Djonga aponta que, quando foi convidado a gravar pelo selo Ceia, começou a escrever falando do atual momento de sua vida. “Tinha acabado de descobrir que ia ser pai, então tem isso, a questão da paternidade, muito forte no disco. Como é ser um bom pai aos 23 anos? Como fazer as coisas direito? Isso aparece muito no álbum, junto com a questão dos conflitos sociais”, diz, destacando que as temáticas também passam pela crítica ao próprio universo hip-hop. “Falo do embranquecimento da cena, embranquecimento no sentido das ideias, da falta de preocupação das letras do rap atual com a causa negra, a causa da periferia”, salienta.

Sobre seu processo de composição, ele destaca que não segue nenhuma fórmula. “Cada música é de um jeito, tem coisas que saem em um minuto, e tem outras que podem demorar um mês. Escrevo muito sempre sobre o que vejo”, diz. Falar do que o cerca, ele acredita, também é uma forma de falar de empoderamento. “Lá atrás eu ficava pensando o que ia fazer da minha vida. Hoje eu sei bem o que fazer da minha vida, então coloco isso na crônica, como um sentido de se empoderar, seja enquanto artista, mulher, negro, homossexual, enquanto povo. Falar sobre o que acontece comigo, meu processo, é falar sobre o rap e sobre essas questões todas”, ressalta.

Ex-estudante do curso de história da Universidade Federal de Ouro Preto, que abandonou a partir do momento em que a carreira engrenou, Djonga se diz um cara família, que, quando não está gravando nem viajando, gosta de ficar em casa cuidando do filho de 3 meses e assistindo a filmes com a mulher. “Também gosto de diversão, de circular, de comprar as coisas que antes eu não podia ter”, diz.