Lançamento

Pedro Santos lança primeiro disco autoral e, ainda, um livro de poesia

O cantor, compositor e poeta já disponibilizou o clipe da faixa que dá nome ao disco, “Feliz Cidade”, no seu canal de YouTube

Sex, 30/07/21 - 03h00
O músico e autor também lança seu primeiro livro de poesias,“O Cavaleiro de Copas” | Foto: Na Onda Assessoria/Divulgação

Em meados de 2015, Pedro Santos integrava o grupo Projeto Alpercata, atuando como compositor e violonista. No entanto, como suas composições, como ele mesmo aponta, só contemplavam o projeto até certo ponto, quando se deu conta, o músico tinha um verdadeiro acervo guardado. "Músicas que necessitavam ser direcionadas para um projeto solo". recorda. Em 2016, ele conheceu o produtor musical Luiz Camporez, que se tornou, mais que um grande parceiro, "amigo e irmão". Foi justamente deste encontro que o disco  "Feliz Cidade", seu primeiro trabalho autoral, inspirado em “paisagens sonoras” de Belo Horizonte, começou a ganhar forma. "Ele acabou tendo um papel fundamental na organização das minhas ideias artísticas. Nós dividimos os arranjos do disco e assim começou nossa imersão no álbum, gravado entre os anos de 2017 e 2019". Com 14 faixas, “Feliz Cidade” será lançado nesta sexta, nas principais plataformas digitais, como Spotify, Deezer, ITunes, Apple Music e YouTube. 

De acordo com o artista, o disco reflete a sua maneira de "experenciar" o mundo no qual vive. "Para citar Dori Caymmi e Nelson Motta, 'cantador não escolhe o seu cantar, canta o mundo que vê'.  Um mundo difícil, cheio de intempéries existenciais, mas generoso na possibilidade de momentos de amor; compondo um itinerário dinâmico em que dores e alegres, indissociáveis, passeiam por paisagens sonoras", elocubra ele, que também buscou uma abordagem da cidade "enquanto espaço habitado e perpassado pelas experiências e subjetividades de seus habitantes".  "As minhas andanças pela cidade, tanto na época de estudante e profissional de psicologia quanto em minha atuação como músico, me provocaram a querer versar sobre o tema de se viver em cidades. Digo no plural, pois o disco aborda a vivência de sentimentos e lugares distintos".

Mas, claro, Belo Horizonte, a cidade no qual o artista transita - em particular pelos bairros Floresta e Santa Tereza, e pela região Centro-Sul, num âmbito mais amplo -, também é de certa forma matéria-prima do conjunto sonoro. "Belo Horizonte é uma cidade linda, digna do nome que tem. Eu particularmente gosto muito das paisagens, do céu com as serras, e das pessoas com esse tempero mineiro de ser (risos). Mas a faceta de metrópole da cidade sempre me causou angústias e sentimentos conflitantes. O tempo acelerado, o excesso de carros, a poluição sonora e visual, a desigualdade social, todos esses elementos são coisas que sempre me deram um aperto no coração por vê-los atropelarem a possibilidade de respiro e de zelo com o tempo e com a vida. A sensação é de que não me cabia ali. Aí eu criei pela arte um lugar onde eu me reconhecesse diante disso tudo: o disco".

A segunda faixa, que batizou o álbum, é antecedida por uma vinheta com ruídos capturados na região central da capital mineira. "Além de dar nome ao disco, foi a faixa escolhida para a produção do clipe (disponível no seu canal de YouTube, com direção e roteiro assinados por Camporez e Wiver Machado). É uma composição cuja harmonia é inspirada nas músicas do Clube da Esquina, que cresci escutando por influência do meu pai e que se tornou uma referência importante no meu trabalho". Os elementos rítmicos da música, salienta ele, se confundem com sons de buzinas, alarmes e outros barulhos. "O eu lírico da canção tem uma percepção melancólica da cidade, um lugar que sempre está do mesmo jeito, um lugar enlouquecedor, que não oferece amor". 

Já "Ciranda da Saudade" vem no que ele chama como uma tradição mineira, a de viajar para encontrar o mar. "Em uma dessas viagens, junto do meu pai, concebi a música. Por isso ela tem um clima praiano, traz consigo o frescor da Bahia. Fala de uma saudade e de querer estar com alguém em um lugar bonito. É curioso como ela se apresentou para mim como um sopro em uma das minhas caminhadas à beira da praia, sem instrumento algum", repassa. “Ciranda” é o primeiro single lançado, a nona faixa do disco e uma das músicas mais conhecidas do repertório do artista. 

Cumpre ressaltar que Pedro também está lançando um livro, “O Cavaleiro de Copas” (Editora Urutau), de poesias, veio que ele começou a explorar aos 20 anos (está com 31), e que hoje ocupa o mesmo lugar que a música em sua vida. Entre os poemas, está, por exemplo, “Cautela”, que traça um paralelo entre a experiência de se enamorar vendo uma pessoa dormindo e a possibilidade da existência de Deus. "O poema tenta traduzir um intenso enamoramento de tal forma que o eu lírico, imbuído de uma sensação calorosa de deslumbramento e amor, passa a confiar na providência divina", descreve. 

Já "Bonança” fala de enlouquecimento e do encontro com o amor no meio do caos. "Exprime a ideia de que chances existenciais são insubstituíveis e que se não vivemos aquilo que somos destinados a viver podemos ficar a margem de nós mesmos". Como assinalado no material de divulgação do artista, a organização dos escritos se deu em meio a um período de adoecimento psíquico. "Não compreendo inteiramente tudo que vivi, mas posso dizer que foi ocasião de aprendizados valiosos sobre a vida, sobre as relações humanas e sobre mim", diz, à reportagem. "Desajustar-se em mundo doente pode significar um convite a se reposicionar e a se conhecer profundamente. É descobrir luzes nas veredas da autonomia e do exercício da liberdade frente ao que se é". 

E como a pandemia acaba sendo quase que um tema obrigatório nas entrevistas destes tempos de quarentena, Pedro acabou sendo também inquerido sobre os sentimentos que o perpassaram (perpassam) em meio ao flagelo. "Durante o contexto que estamos vivendo fui atravessado por vários tipos de sentimentos. Solidão, desesperança, desamparo, impotência... Mas, ao mesmo tempo, estou sendo provocado a olhar e a agradecer pelas coisas que realmente importam. Fé e amor têm movido minhas intenções e ações ainda mais nesse momento. Tanto que 'Outras alegrias sobre o amor e a fé' pretende ser o nome do próximo disco que estou produzindo. Sigo compondo e escrevendo. Não há vida possível para mim sem isso", pontua.

Confira, aqui, alguns poemas de Pedro Santos

"Cautela"
Dormes agora em meus braços
sonhas com o quê?
tu o sabes   
Deus também há de saber
se Ele existe
não sei
meu palpite é dizer:
tem a ver com o não dito 
e não se pode ver
conversar sobre A  
desejando Z
insistir desejar
o que é de perecer  
azar ou sorte
este sonho de crer
numa estrela tão forte
que ilumina ao morrer?
e meu amor não te acordes
pelo menos não tão cedo
eu também te prometo
não acordo a mim mesmo
se o teu corpo esta noite
é tangível  
uno
bonito
quente
beira contente

o infinito

e o infinito 

justamente
não é 
de se conter
viver é 
possível
Deus também 
há de ser   

 

"Bonança"

Quando enlouqueci
era uma manhã delicada
os bem-te-vis cantavam
como se não soubessem 
de nada
O céu me cumprimentava
em sua veste alaranjada
o vento passou
bagunçou minhas palavras
as letras que 
gastei a vida inteira
para dar sentido
sem eira 
nem beira
Eu rezava por quietude
enquanto o céu amiúde
trocava de vestido
não nego
desespero havia
não falar língua alguma
é estar sozinho
na ventania
Me dei conta 
de que algo acontecia
quando os olhos e as mãos
que me cercavam
eu reconhecia
mesmo que nunca 
os tivesse visto
nascia uma chama
em meu coração
isto

eu não sabia
o amor
é a língua de quem ama
a despeito da palavra
a despeito da ventania
a negritude celeste
finda o dia


Vento peste
eu amaria?
quem eu teria sido?
se você não soprasse

se eu não tivesse
enlouquecido

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