Doces

Confeitarias clássicas de BH entregam suas receitas para o sucesso

A cozinheira Dona Theresa Oliveira, que é a inventora da coxinha de Catupiry, diz que se concentra no cuidado artesanal

PUBLICADO EM 19/11/17 - 02h00

“Os artistas sabem que suas obras não são para ser compreendidas, mas para ser degustadas”, escreveu Rubem Alves no livro “Variações sobre o Prazer”. Além do mineiro de Boa Esperança, outro que comparou culinária e arte foi o poeta gaúcho Mario Quintana: “Eu sonho com um poema/ Cujas palavras sumarentas escorram/ Como polpa de um fruto maduro em tua boca,/ Um poema que te mate de amor/ Antes mesmo que tu lhe saibas o misterioso sentido:/ Basta provares o seu gosto”. Os dois não estão sozinhos nessa história. Dona Theresa Oliveira garante que o sucesso do sabor se concentra no cuidado artesanal.

“Quis, acima de tudo, chegar à perfeição. Nunca usei produto químico nos meus doces, nenhum desses ‘antes’ impressionantes. Antes do lucro, a coisa tem que ser bem feita”, explica. Ela, aliás, tem ensinado, na prática, à contadora Adriana Lima, que, ao lado do marido, reabriu uma das mais tradicionais confeitarias da capital mineira e agora também se dedica à arte do sabor. A Doce Docê, criada por dona Theresa em 1972, estava fechada há 20 anos. “É a primeira vez que trabalho com loja de doces, sempre gostei como hobby. Aprendo muito com dona Theresa, não só as receitas, como a preocupação em oferecer o melhor e a garra que ela tem”, ratifica Adriana.

Foi graças a uma iniciativa do filho de dona Theresa que deu-se o laço sobre esse encontro doce. Ele buscou sócios para reabrir o empreendimento quando percebeu a tristeza da mãe com a morte do marido, falecido em fevereiro. Apesar disso, a cozinheira, que é inventora da coxinha de Catupiry, jamais largou o ofício. Durante os 17 anos que morou em Tiradentes, participou de diversos festivais gastronômicos na cidade. Outra invenção de Theresa é o bombom de uva. “Até hoje é uma coisa rara fora de Minas, tenho uma irmã que mora em São Paulo e me conta que até hoje não encontra lá”, revela.

Nova fase. Na reabertura da casa, uma surpresa para todos. O sucesso gerou filas no local. Entre os doces mais pedidos estavam a tartelette de morango, a torta de nozes e a trouxinha de maçã. “Apareceram idosas que se recordam de 20 anos atrás, jovens casais que ainda eram crianças na época. Cada lembrança bonita, contando de quando comeram um doce e onde elas estavam. Eu fiquei muito satisfeita”, diz Theresa.

Foi pelas redes sociais que os donos se comunicaram com os novos clientes para tranquilizá-los de que haveria mais no dia seguinte. “Eu não esperava isso tudo, hoje as redes sociais são uma loucura, um sai falando com o outro. Uma postagem nossa teve mais de 4.000 visualizações”, conta Theresa, superantenada com as novidades.

História. Embora jamais tenha fechado suas portas desde que foi aberta pelo italiano Claudio Gontero em Belo Horizonte, em 1976, a confeitaria Mole Antonelliana passou por processo parecido ao da Doce Docê. Lorena Cozac, que atualmente cuida do empreendimento, recebeu todos os ensinamentos de Gontero quando ele decidiu voltar para sua terra natal em 2006. “Faço chocolate desde os 16 anos e forneci trufas para ele durante um ano”, conta Lorena. Mas a relação dela com a loja vem de antes.

“Meu avô era diplomata e trabalhava para o governo italiano. Desde que nasci as festas na casa da minha avó eram com doces da Mole Antonelliana”, relembra. Foi essa ligação antiga, aliás, que levou Gontero a confiar o projeto nas mãos de Lorena. “Ele queria alguém que mantivesse a história e o conceito da loja”, diz, e aponta a que considera a marca da doceria. “A torta saint honoré, ela é muito exclusiva, bonita. É a única do mundo que qualquer confeitaria pode conceber do jeito que preferir, desde que tenha massa folhada e bombinhas que você pode rechear como quiser; as nossas são de baunilha”, afirma.

O advogado Marcelo Braga, um dos clientes mais assíduos do local, concorda. “A primeira vez que fui à loja foi em 1983, estava na faculdade de direito. Essa torta é o carro-chefe, é muito leve e saborosa”, elogia. Ele se lembra de outro aspecto peculiar do empreendimento. “Os doces sempre foram postos nos mesmos lugares. Você não precisa perguntar se tem, pois, se não está ali onde deveria na vitrine, é porque acabou”, assegura.

Tradição. Outra confeitaria para lá de tradicional em BH é a Momo. Criada em 1989 pelos pais de Henrique Guerra, que cuida dos negócios atualmente, a iniciativa começou como self-service. “Nos tornamos confeitaria em 1998 e agora estamos voltando a nossa origem”, considera. Apesar de contar com refeições salgadas no cardápio, Guerra admite que a maior parte dos clientes associa a Momo aos doces, vários deles de dar água na boca, como a torta floresta negra, feita de nozes e brigadeiro, e uma novidade, colocada na vitrine há um mês.

“É um doce de morango com camada de brigadeiro envolto no granulado Callebaut”, conta, sem piedade de provocar o paladar. Nuno Afonso também herdou outro empreendimento muito conhecido na capital quando o assunto tem a ver com açúcar, mas na medida certa e, como ele afirma, com simplicidade. “A doceria conventual é secular, tem receitas de 1820, 1800, que passaram de geração para geração. Os ingredientes sempre foram os mais básicos. Fios de ovos, as babas de anjo, a maioria leva açúcar, ovos e amêndoas ou nozes. O segredo é a forma de preparo, a temperatura, o ponto da calda”, sublinha.

Nascido em Angola, ele veio para o Brasil com os pais para fugir da guerra que eclodiu no país em 1975. Em 1983, sua mãe começou a vender doces típicos de Portugal, seu país de origem, na antiga Feira de Antiguidades da praça da Liberdade e, em 1989, inaugurou a Doces de Portugal, que até hoje mantém suas tradições. “O destaque da loja é o pastel de santa clara, feito de nata, como o de Belém, mas que tem outro nome porque o de Belém é só lá em Portugal”, admite.

Espetacular novidade na cidade

O objetivo de Elisa Dayrell é que sua Espetacular Doceria, inaugurada há um ano, tenha a mesma longevidade das demais confeitarias da cidade. Para isso, ela aperfeiçoou seus estudos na conceituada Le Cordon Bleu”, em Paris. Como era de se esperar, as produções da jovem chef trazem para BH o que há de melhor na doce culinária francesa.

“Temos o ópera, que é um doce típico francês e leva nove camadas – e, apesar disso é superleve, fininho. É uma espécie de torta à base de musse que intercala creme de café, chocolate, amêndoas e outros ingredientes”, conta. Outra pedida frequente é pelo macaron, que ela confessa ser seu predileto.

“A culinária francesa é muito baseada na união da estética com o sabor, e o macaron é o exemplo perfeito, porque a casquinha não interfere no recheio, que é o que dá o sabor. Você pode brincar com vários jogos de cores”, atesta. O doce nada mais é do que um pequeno bolo granulado e que tem conquistado, a cada dia, mais fãs pela cidade. “Estamos começando, e tem dado certo”, conclui Elisa.

FOTO: Denilton Dias
Elisa Dayrell traz agora para a capital sua Espetacular Doceria

Serviço

DOCE DOCÊ
Rua Ministro Orozimbo Nonato, 215, loja 4, Vila Castela, Nova Lima. (31) 3262-2132

MOLE ANTONELIANNA
Avenida João Pinheiro, 156, centro. (31) 3224-1342

MOMO
Rua Pouso Alegre, 1.000, Floresta. (31) 3421-5020 (há outras lojas)

DOCES DE PORTUGAL
Rua Santa Rita Durão, 949, Funcionários. (31) 3261-5772 (há outras lojas)

ESPETACULAR DOCERIA
Rua Bernardo Guimarães, 229, Funcionários. (31) 2535-0790

Receita

Floresta negra, por Eugênia Procópio (Momo)

 
 

Ingredientes:
Pão de ló de chocolate:
6 ovos
280 g de açúcar
30 g de cacau em pó
80 mL de água
300 g de farinha de trigo 5 g de fermento em pó

Modo de preparo:
Bata os ovos com o açúcar até virar uma gemada. Coloque a água e acrescente a farinha, o cacau e o fermento peneirados e misture levemente. Transfira para forma untada e coloque no forno preaquecido a 160°C por 35 minutos.

Recheio de Chocolate:
1/2 litro de leite
600 mL de leite condensado
150 g de chocolate em pó (50%)
25 g de manteiga
10 g de lecitina de soja

Modo de preparo:
Coloque todos os ingredientes na panela e leve ao fogo para cozinhar até formar um creme, por uns 20 minutos

Recheio de nozes:
1/2 litro de leite
600 mL de leite condensado
100 g de nozes
25 g de manteiga
10 g de lecitina de soja

Modo de preparo:
Coloque todos os ingredientes na panela e leve ao fogo para cozinhar até formar um creme, por uns 20 minutos

Montagem da torta:
Divida o pão de ló em três partes e recheie a primeira camada com o recheio de chocolate e a segunda camada com o recheio de nozes. Coloque a última camada do pão de ló e cubra toda a torta com o recheio de chocolate. Enfeite com lascas de chocolate e cerejas