Cuidado

Geriatria preventiva é segredo para um envelhecimento saudável

Acompanhamento com especialista desde cedo pode evitar problemas no futuro; mesmo para idosos que ainda não apresentem nenhum tipo de limitação, consulta é válida

Por Da Redação
Publicado em 26 de maio de 2019 | 03:00
 
 
Até 2060, a expectativa é que haja mais de 73 milhões de idosos no Brasil, segundo o IBGE; busca por um médico geriatra antes de apresentar limitações implica numa velhice mais ativa Foto: Mabel Amber/Pixabay

Geriatra era o último especialista que a odontopediatra Erica Zaidan, 44, imaginava que resolveria seus problemas quando, há quatro anos, passou por um momento difícil, em que sentia muita ansiedade, estava sempre esgotada, comia mal e tinha dificuldade para dormir. Apesar disso, resolveu aceitar a indicação de sua nutricionista para tentar entender melhor o que acontecia com seu corpo.

“Foi um tiro certeiro. Hoje, eu tenho uma energia enorme, durmo a noite inteira, faço corrida. Não trocaria os 44 pelos 22. E isso eu só consegui com o auxílio do meu geriatra, a quem eu inclusive recomendei a toda minha família”, conta. “Muita gente tem preconceito porque acha que é médico de velho, não veem o benefício da prevenção. Depois dos 60, possivelmente ele já vai curar, não prevenir”, diz.

O médico fez uma espécie de check-up, verificando como estava a situação geral do organismo. Após a realização de exames, concluiu que Erica estava com colesterol e triglicérides altos, ajustou sua dieta, introduziu vitaminas e mudou sua rotina de exercícios. “Foi um conjunto de ações e também não foi só a parte clínica. Para mim, o mais interessante é a conversa, existe uma condução do paciente com relação ao seu estilo de vida”, afirma.

O processo pelo qual Erica passou tem a ver com o que é chamado de “geriatria preventiva”. E é por isso que não é preciso esperar a chegada da velhice para procurar um médico dessa especialidade, basta que haja preocupação com as questões de saúde que possam provocar impacto sobre o processo de envelhecimento.

Também não existe necessariamente uma idade determinada para se procurar o especialista, como explica o médico geriatra e presidente da seção estadual de Minas Gerais da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia, Marco Túlio Gualberto Cintra. “Quanto mais cedo a pessoa se atenta para as mudanças necessárias para se envelhecer com mais qualidade, maior o benefício. Planejar a velhice aos 30, 40 anos é diferente de fazê-lo aos 70, quando ela já chegou”, afirma.

É o que Erica tem em mente para o seu futuro. “Eu quero chegar à velhice sem ter neura do que está acontecendo comigo, porque envelhecer todo mundo vai. Quero estar bem disposta pra cuidar dos meus netos quando os tiver, estar ativa o tempo inteiro. Evitar qualquer tipo de problema evitável e chegar bem lá na frente. As pessoas me acham louca por fazer acompanhamento com geriatra, mas eu acho que elas é que são”, diz.

Atualmente, há mais de 29 milhões de pessoas no Brasil com mais de 60 anos e, a expectativa, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), é que o número ultrapasse os 73 milhões até 2060. Nesse sentido, quanto mais pessoas se atentarem para o benefício de procurar um geriatra cedo, menor será o impacto do envelhecimento da população. 

Cedo, mas nem tanto

Mesmo que a geriatria seja primordialmente orientada ao cuidado de idosos frágeis, quem já tem mais de 60 anos não precisa esperar o surgimento de uma limitação para procurar esse especialista, como observa Marcelo Starling, geriatra e fisiatra. “Nosso foco não é a doença, é o indivíduo e como melhorá-lo no meio em que vive”, diz ele. 

Foi sob influência da filha Erica que Mazza Zaidan, 67, também recorreu ao especialista. “Eu vinha me recuperando de uma depressão quando minha filha sugeriu que eu o procurasse, há uns dois anos. É um pouco complexo porque preciso ir a outra cidade para vê-lo, mas vale todo o esforço, porque ele me olha até de ponta-cabeça”, conta.

O desânimo que ela sentia passou graças às recomendações do médico – entre elas, inclusive, a prática de atividades físicas, que não era um hábito da empresária. Com consultas a cada dois ou três meses, Mazza acabou descobrindo que tem uma condição cardiovascular que precisa ser informada caso ela venha a ter um AVC. “É algo que não é grave por si, mas poderia colocar a minha vida em risco se não fosse descoberto”, explica.

A proximidade com que o médico a trata e a preocupação que demonstra são grandes responsáveis pelo apreço que a empresária sente, assim como a segurança de saber que está vivendo com uma melhor qualidade de vida. “Nessa proposta de vida que eu encontrei com o auxílio dele, se eu viver com qualidade, não importa quantos anos eu ainda tenha pela frente, mas a certeza de que viverei da melhor forma possível”, conclui.

Boa alimentação, exercício e sono são trunfos para idosos
Quando um paciente mais jovem recorre a um médico geriatra, o atendimento é norteado por uma longa conversa. “Vemos como é o estilo de vida que ela leva, se faz exercício físico, alimenta-se bem, como dorme. Também verificamos se há alguma doença crônica, como hipertensão ou diabetes, se as vacinas estão em dia, e fazemos exames preventivos. Fazemos uma pesquisa para identificar fatores que podem comprometer uma velhice com qualidade e independência”, explica o médico especialista em geriatria e fisiatria Marcelo Starling.

O médico acrescenta que é preciso deixar claro que o processo de envelhecimento não é doença e que a busca por tratamentos milagrosos norteados por conceitos como antienvelhecimento são ineficazes. “Não há o que se possa fazer para deixar de envelhecer, é algo que vai acontecer com todos. O que se pode fazer nesse sentido tem a ver com três atitudes: prática de exercício físico, dieta balanceada e sono de qualidade”, afirma.

Sono subestimado

Os prejuízos de uma dieta pobre e de uma rotina sedentária são largamente discutidos, mas nem sempre o mal causado pelas noites maldormidas é encarado com a mesma seriedade. Estudo de cientistas do Instituto do Sono, ligado à Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), publicado em 2014 na revista “Sleep Medicine”, concluiu que o sono não REM, ou seja, caracterizado por uma atividade cerebral lenta, garante um sono restaurador e é fundamental para a recuperação corporal. Isso acontece graças à liberação de alguns hormônios, como o do crescimento, importantes para a regulação do funcionamento muscular. De maneira oposta, a perda de sono pode estar ligada à perda de massa muscular na velhice, o que pode levar à dificuldade de locomoção.

“Espera-se que uma pessoa de 78 anos tenha dormido por cerca de 28. É ao dormirmos que nos recuperamos, o cérebro faz a limpeza. Mas com a velocidade da tecnologia da informação, do estresse, do trabalho, as pessoas começam a dormir menos e pior. Isso aumenta o risco de doenças como diabetes, ataque cardíaco, AVC. A boa qualidade do sono é um dos principais pilares para um envelhecimento saudável”, conclui.