DIA DA VISIBILIDADE TRANS

Mesmo com qualificação, pessoas trans encontram barreiras no mercado de trabalho

A população trans vem tentando ocupar, ainda que de forma tímida, espaços em outros segmentos do mercado de trabalho

Por Cristiana Andrade, Maria Irenilda, Milena Geovana e Queila Ariadne
Publicado em 29 de janeiro de 2024 | 05:00
 
 
Primeiro salário fixo de Liana Alice, coordenadora da Reprograma, foi aos 30 anos. Foto: Reprodução / Vídeo

Mesmo que ainda seja imperceptível para a maioria dos brasileiros, a população trans vem tentando ocupar, ainda que de forma tímida, espaços em outros segmentos do mercado de trabalho. E também nas universidades. Uma pesquisa da TransEmpregos, plataforma com oportunidades para pessoas trans e travestis, cursos de formação e atividades, mostrou que em 2023, do universo de 24.646 usuários e usuárias do portal, 39% responderam ter graduação, mestrado ou doutorado

Embora considerado um indicador positivo para essa população, na prática, o preconceito ainda parece ser o principal obstáculo para que essas pessoas conquistem vagas em suas áreas de formação - o que dirá cargos de média e alta gestão. Quem vivenciou isso na pele foi Liana Alice, mulher trans, ex-aluna e atual coordenadora de Ensino da Reprograma, iniciativa criada em 2016 em São Paulo, que oferece cursos de programação gratuitos para mulheres e adolescentes em situações de vulnerabilidade social, econômica e de gênero, priorizando as negras, trans e travestis. 

“Depois que me graduei em Marketing, nunca consegui trabalho na área. A maioria dos meus trabalhos foram informais até eu migrar de carreira. Comecei trabalhando numa imobiliária, usando identidade masculina. Nessa época, eu já queria muito começar a transição, já estava tomando hormônios; eu tinha 22 anos. Saí e fui para outra imobiliária e meu chefe direto disse que estava tudo bem eu ser do jeito que era. Trabalhei uma semana e me mandaram embora. Acho que eu não era muito ‘passável’; o início da transição é mais complicado, principalmente para quem como eu já tinha vivido a puberdade”, conta.

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Liana buscou então oportunidades que estavam disponíveis: trabalhou como recreacionista infantil em shopping - foi sua primeira carteira assinada -, mas ganhava mal e não era bem tratada. Depois, encontrou vaga como babá, de maneira informal, até que decidiu migrar de área. Ouviu falar da Reprograma e se inscreveu para participar, em 2019. 

“Meu ponto principal era ‘eu preciso de um trabalho que me dê dinheiro’. Então, me mudei para São Paulo, e a primeira semana do curso foi presencial. Na segunda semana, tudo fechou por causa da pandemia e a gente foi para o online. Aprendi muita coisa, foi intenso. E, depois do curso, retornei para a Reprograma como monitora voluntária, apoiando outras meninas a entrarem. Logo depois, consegui meu primeiro trabalho na área de tecnologia como desenvolvedora. Tive dois, eram em empresas pequenas de tecnologia, mas ganhava mais do que em todos os trabalhos que eu já tinha tido. Em 2022, participei de uma seleção para ser coordenadora fixa na Reprograma, na área de gestão e educação. Algo que eu não imaginava, estar nesta posição. Então, nada como fazer para aprender, né?”, filosofa.