Opinião

Maio Amarelo

Desafios do trânsito pós-pandemia

Por Alysson Coimbra*
Publicado em 01 de maio de 2021 | 03:00
 
 

Dificuldade de concentração, medo, ansiedade, estresse, irritação e tristeza. Difícil encontrar um brasileiro que, no último ano, não tenha vivido em uma montanha-russa de emoções. Desde 2020, a nossa saúde mental piorou muito e esse retrato é visto diariamente nos consultórios dos médicos examinadores de trânsito. Os motoristas estão mais desatentos, irritados, com dificuldade de concentração e em uma condição física preocupante.

O aumento do sedentarismo fez crescer a incidência de sobrepeso e a falta de acompanhamento médico tem impacto no descontrole de doenças crônicas como diabetes e hipertensão. Resumindo: a saúde física e mental dos nossos motoristas vai de mal a pior.

E, quando a saúde falha, os riscos se multiplicam, já que o fator humano é causa determinante dos acidentes. Em uma analogia simples, o motorista estressado não respeita os limites de velocidade; o desatento perde o controle da direção do veículo e atropela pedestres ou atinge ciclistas, e o irritado briga no trânsito. Todos se acidentam mais e, inevitavelmente, colocarão nossas vidas em risco!

Esse cenário, aliado à flexibilização das leis de trânsito, à redução da fiscalização e às péssimas condições de conservação das nossas rodovias, fará o número de mortes no trânsito crescer nos próximos anos.

O Brasil tem hoje um dos trânsitos mais violentos do mundo, com uma média anual de 40 mil mortes e mais de 350 mil feridos. Em vez de adotarmos medidas mais rígidas para a preservação de vidas, seguimos na direção oposta.

Outro grave impacto dessas alterações que a pandemia provocou nos motoristas é a incidência de mortes e agressões decorrentes de brigas de trânsito. O aumento dos transtornos mentais deixou nossos motoristas mais irritados e agressivos. Diariamente o noticiário expõe casos de desentendimentos que terminam em tragédias.  

Diante desse cenário, os desafios são muitos. Reduzir mortes no trânsito passa por cuidar da saúde física e mental dos condutores e por investir em educação e prevenção. Como mostrou o Observatório Nacional de Segurança Viária, investimentos de R$ 500 milhões em mecanismos simples e eficazes nas rodovias reduziriam em 50% o número de mortes e em 30% o número de feridos. É mais barato salvar vidas do que tratar os feridos e reparar os danos provocados pelas mortes, tarefas que consomem 3% do nosso PIB, cerca de R$ 220 bilhões.

Precisamos garantir que os motoristas sejam avaliados psicologicamente quando renovam sua CNH, não apenas no momento da obtenção da permissão para dirigir, aos 18 anos. Se em um período de um ano passamos por tantas transformações biopsicossociais, imagine as mudanças que décadas nos provocam!

Neste Maio Amarelo, o envolvimento de toda sociedade é fundamental para o entendimento de seu papel como potencial causador de acidentes. É importante que as autoridades modifiquem o perfil dos gastos com o sistema nacional de trânsito, adotando medidas que priorizem a educação e segurança como agentes transformadores da epidemia de violência viária que todos os anos deixa mais de 40 mil mortos. 

*Coordenador da Mobilização Nacional dos Médicos e Psicólogos Especialistas em Medicina do Trânsito