Como mãe de dois meninos, vivo imersa num universo infantil, mas desempenhando um papel particular, como se o observasse de fora. Por isso, convidei a menina que fui a falar por mim hoje, neste Dia das Crianças. Gostaria de deixar nesta crônica o meu olhar de criança sobre uma dimensão da vida humana, e encontrei no meu velho diário um registro, entre tantos, de como eu enxergava esse aspecto da nossa existência neste mundo.

 

Belo Horizonte, 26 de dezembro de 1994

Capítulo 3

“Sinto que um dia vou realizar meu sonho: ser escritora de livros.

Todas pessoas têm um sonho. Algumas, tem mais de um. Tem muitos.

Quando eu era pequena, queria ganhar uma Barbie. Ganhei. Depois tive outra. E mais outra. Ao todo foram 3 Barbies. Agora minha irmã tem duas e eu brinco com elas.

Quando eu crescer quero realizar meu sonho. Pode ser que, a medida vou crescendo vai aparecendo mais sonhos.

Quem consegue explicar o significado da palavra sonho?

O sonho, é um pensamento que a gente têm vontade de fazer ou ganhar.

Sonho também é um pensamento que acontece quando dormimos. Ás vezes temos pesadelos, os sonhos ruins.

Terminando esta página, acredito escrever todos os dias e sonhar mais e mais.”

 

Esta era eu, aos 10 anos, numa página de diário de capa cor-de-rosa – com uma imagem, pode-se dizer, romântica –, transcrita exatamente como no original.

Nessas linhas traçadas na meninice, eu parecia vislumbrar o sonho enquanto algo mais palpável, concreto, como no caso da Barbie, e também pela perspectiva do que viria a acontecer. Como se fosse uma obra a ser construída, um plano a ser traçado, um caminho a ser percorrido, um livro a ser escrito.

Na infância tudo parece ser sonho, promessa, expectativa, possibilidade. É o tempo do que pode vir a ser, quando o que se tem à frente é um enorme e desconhecido futuro. É o tempo do sonhar, imaginar, formar-se, crescer. Do experimentar, cair e se levantar, aprender, descobrir. Do encontrar o outro e se encontrar, perceber, sentir.

Quanto ao desejo revelado nessa página de diário, certamente eu esperava ter, ao crescer, muitos livros publicados – infantis, especificamente, como contei em outro capítulo –, com uma brilhante carreira de escritora. Não cheguei a tanto. Mas ainda me é permitido sonhar. Quem sabe um dia?