Neurologia

O simples ruído de alguém mastigando pode levar à ira

Patologia não desaparece com o tempo nem tem tratamento

Patologia não desaparece com o tempo nem tem tratamento | Foto: STOCKXPERT
PUBLICADO EM 14/09/11 - 00h00

NOVA YORK, EUA. Para pessoas portadoras da condição médica chamada misofonia, a hora do almoço pode ser uma verdadeira tortura. O som das pessoas comendo - mastigando, mordendo, sugando, gorgolejando - pode levá-las a um estado instantâneo de raiva que chega a "ferver o sangue".


Ou, como explica a norte-americana Adah Siganoff, "raiva, pânico, medo, terror e ódio, todos misturados". Suganoff, 52, explica que a reação é irracional e tão intensa que ela declaradamente não mais faz refeições com seu marido.


Muitas pessoas podem ser distraídas por determinados sons que não parecem incomodar os outros - como mascar chicletes, sapatos batendo no chão enquanto andamos e murmúrios. Mas, para quem sofre de misofonia - uma condição recentemente reconhecida e que carece de estudos por ainda ser pouco compreendida -, o problema chega a um outro nível de compreensão.


Essas pessoas, segundo especialistas, seguem um padrão consistente. A condição geralmente começa no início da adolescência e tende a piorar com o tempo, geralmente se expandindo de forma a incluir mais tipos de sons na lista dos intoleráveis, como os ruídos de comer e respirar.


Segundo Marsha Johnson, uma audiologista em Portland, EUA, que mantém um fórum de discussão para portadores de misofonia, a doença não é uma escolha. "Não é como se uma criança acordasse em um belo dia com a ideia de não mais tolerar o mastigar dos pais à mesa", explica.


Mas a chegada da misofonia é inesperada. A audiologista afirma, ainda, que a condição é tão grave que algumas crianças simplesmente não aguentam se sentar à mesa ou ir à escola.


A neurocientista da Universidade do Texas em Dallas, nos EUA, Aage R. Moller, especialista em sistema auditivo nervoso, recentemente incluiu a misofonia no guia médico que editou em 2010.
Ele acredita que a doença é uma condição enraizada, como ser canhoto ou destro, e provavelmente não é um distúrbio auditivo, mas uma "anormalidade fisiológica" que mora nas estruturas do cérebro que processam o som.


Segundo o cientista, não existe um tratamento eficaz. Os pacientes acabam passando por centenas de médicos sem conseguirem resolver o problema, sendo diagnosticados de formas variadas - obsessivos compulsivos, bipolares, maníacos, distúrbios de ansiedade, dentre outros.


Marsha explica que começou a estudar a doença quando viu seu primeiro caso, em 1997. A frustração, segundo a médica, é intensa. "As pessoas choram muito, porque os parentes e amigos lhes dizem que é possível controlar se elas quiserem, mas elas não podem".


A condição passa a estruturar a vida da pessoa. "Ela não desaparece com a idade e não pode ser suprimida no organismo", diz Marsha.


Taylor Benson, 19, estudante universitária, conta que os sons de chiclete e da respiração de outras pessoas geram uma sensação de peso no tórax e um ritmo acelerado de batimentos cardíacos. Com frequência a jovem se percebe rangendo os dentes e encarando a pessoa que emite o som, o que já a fez perder alguns amigos e entrar em brigas.

Traduzido por Luiza Andrade