MINISTÉRIO PÚBLICO

Não posso ter medo de investigar políticos, diz Nepomuceno em retorno

Em conversa com a reportagem de O TEMPO, promotor disse ainda estar receoso, mas que não pode temer investigações contra políticos

Por LUCAS RAGAZZI
Publicado em 25 de junho de 2018 | 16:12
 
 

Depois de ficar mais de um ano afastado da Promotoria de Defesa do Patrimônio Público do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), o promotor Eduardo Nepomuceno retornou ao cargo na última semana. A área costuma investigar casos envolvendo corrupção. Em conversa com a reportagem de O TEMPO, Nepomuceno disse ainda estar receoso por conta do processo interno, mas que não pode temer investigações contra políticos.

“É claro que, depois do que aconteceu, há um receio. Foi uma ação política que me afastou. Mas não posso me deixar intimidar, se eu tiver medo de investigar políticos não posso ter o direito de atuar nesta promotoria”, avaliou. 

A decisão da Justiça Federal que ordenou a volta de Nepomuceno à promotoria se deu no final de abril. Ele havia sido afastado pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) por supostamente ter descumprido deveres previstos na Lei Orgânica do MPMG. O promotor sempre negou e afirmava que a decisão se deu por motivos políticos.

O promotor também disse que teve um retorno tranquilo e que, até o momento, foi bem recebido pelos servidores e colegas. “Por enquanto foi tudo bem, tudo normal”. 

Após a da decisão do CNMP, em março de 2017, Nepomuceno foi encaminhado para a 12ª Promotoria de Juízo Criminal de Belo Horizonte. No entendimento da juíza federal Vânila Cardoso André de Moraes, no entanto, houve pena desproporcional ao promotor e, por isso, ela solicitou a anulação do afastamento. 

Nepomuceno ficou conhecido por abrir investigações contra políticos famosos no Estado. 

Para o presidente da Associação Mineira do Ministério Público (AMMP), Enéias Xavier Gomes, a decisão de devolver o promotor à promotoria de Defesa do Patrimônio Público é correta.

“O retorno do Nepomuceno a essa promotoria é um meio de reparar um dano. Ele foi afastado injustamente, tanto que nós, da associação, assim como a maioria dos membros do MP, jamais aceitamos. Ele retorna para onde não deveria ter saído”, disse Gomes. 

Apesar da decisão da Justiça Federal já ter sido atendido, a expectativa é de que o CNMP possa recorrer e tente afastar Nepomuceno mais uma vez. “É bem provável que eles recorram, e é de direito deles. Mas a questão está muito favorável ao Nepomuceno. A leitura já definiu que não houve motivação para que ele fosse afastado”, argumenta o presidente da AMMP. 

Questionamentos

Em palestra durante congresso da Associação dos Juízes Federas do Brasil (Ajufe), em abril, Nepomuceno chamou a atenção ao criticar a maneira como o MPMG sofre influências externas para prejudicar o trabalho de promotores e procuradores.

“Infelizmente, não vejo no MPMG uma independência plena em relação a fiscalização e atuação contra atos da administração pública, principalmente contra Executivo e Legislativo. Talvez por conta daquele processo eleitoral que ocorre de dois em dois anos”, disse.

Ele questionou, ainda, o papel histórico das procuradorias estaduais no âmbito de denúncias contra governadores. “Não temos precedentes em denúncias contra titulares dos cargos (governadores). É só ver o caso do Sérgio Cabral. Durante oito anos de mandato não vimos nenhuma ação contra ele, e hoje já é condenado em vários processos. Que fenômeno impediu que ele fosse denunciado na época em que ele era governador? É essa simbiose entre os poderes”.

Nepomuceno também fez referência ao seu próprio caso. “É uma situação que contamina a formação do Conselho Nacional do MP também, na minha opinião, já que você precisa ir no Senado e, depois, o mesmo senador que sancionou o seu nome vai reclamar de promotores, como é o caso que aconteceu comigo. Aí é o sistema político interferindo no MP”, argumentou, à época.