No interior

Nos passos do poeta e do escritor paraibanos

Em Sapé e Pilar, cidades a apenas 60 km de João Pessoa, estão os legados de seus mais ilustres filhos: Augusto dos Anjos e José Lins do Rêgo

Por Petrônio Souza Gonçalves
Publicado em 14 de outubro de 2017 | 03:00
 
 
Casas em ruínas no interior da Paraíba Petrônio Souza Gonçalves/divulgação

É impressionante como, na Paraíba, ainda se encontram tantas belezas sem a devida divulgação ou badalação nos pacotes de turismo brasileiro. O fato é que sua beleza vai muito além das praias urbanas da bela e histórica João Pessoa e se estende por toda a faixa litorânea do Estado, desde a porção sul, onde estão as praias mais badaladas, à porção norte, ainda sem a devida divulgação. É desproporcional o potencial turístico da Paraíba com a atual procura pelo destino e seus pacotes em agências de viagens espalhadas pelo Brasil.

Se adentrarmos um pouco mais na cultura paraibana, vamos ao encontro de dois nomes dos mais importantes da literatura brasileira do século passado: um na prosa, José Lins do Rêgo, e outro na poesia, Augusto dos Anjos. Ambos nasceram em cidades próximas a João Pessoa, em um raio de apenas 60 km de distância.

Curiosamente, as cidades natais desses dois gênios parecem estar uma de frente para a outra. Somente esses dois nomes e toda a história que os envolve – eles são da época do Brasil dos grandes engenhos – tudo isso a menos de uma hora da capital. Para conhecer essas histórias de perto, é preciso deixar o litoral e ir ao interior da Paraíba.

Augusto dos Anjos

Por estar do lado direito da BR–230, visitamos primeiro a cidade de Sapé, onde ficava o lendário Engenho do Pau d’Arco, local de nascimento do poeta Augusto dos Anjos, que faleceu prematuramente, aos 30 anos, na cidade mineira de Leopoldina.

Antes de chegar a Sapé, vê-se que a cidade reverencia e reconhece seu poeta maior. Pela estrada, lê-se em alguns outdoors “A terra da poesia”. Ao longo das ruas de Sapé, vimos imagens e versos de Augusto, até que pedimos informações para chegar ao engenho onde ele nasceu, que fica em área rural, a 11 km do centro do pequeno município. Ao sair da rodovia, uma bela escultura batizada com o título do único livro do poeta, “Eu”, marca onde se deve entrar (à esquerda) e andar por mais 2 km. Ao fim da estrada de asfalto, chega-se ao Memorial Augusto dos Anjos e às ruínas do engenho que viu o poeta nascer e escrever seus versos imortais.

Muito do que inspirou a obra do poeta ainda está lá, como testemunha da poesia que ali nasceu e não existe mais. Há um memorial com algumas relíquias, como a agenda pessoal do poeta, com poemas escritos, além de documentos, como o contrato de publicação de seu único livro, fotos e lembranças de Augusto e de sua família. Vê-se que o que mantém o memorial é a força devocional de quem lá trabalha. Chega a ser comovente o amor daquelas pessoas por Augusto e sua obra. Lá, é possível comprar alguns suvenires, camisetas e até um licor dos frutos do tamarindeiro que tanto ele cantou em seus poemas. A centenária árvore está viva até hoje.

Tour guiado

No memorial, faz-se um tour de 1h30, em que o guia conta um pouco sobre a vida de Augusto e mostra a capela onde ele foi batizado, o tamarindeiro de suas histórias e o pequeno lago encantado que tanto lhe inspirou.

No pequeno auditório para 70 pessoas são proferidas palestras, exibidos vídeos e feitas apresentações sobre a obra augustiniana. O memorial é sediado na casa da ama de leite de Augusto, personagem de alguns de seus poemas, Guilhermina, que ele homenageou dando ao filho o nome de Guilherme.

 

No Memorial Augusto dos Anjos e na Fundação Menino de Engenho estão as lembranças dos autores.


Memória do famoso escritor regionalista

De volta à BR–230, no sentido João Pessoa, entra-se na estrada para Pilar, seguindo por mais 16 km até a terra do autor de “Menino de Engenho”, José Lins do Rêgo. Cidade de pouco mais de 12 mil habitantes, suas casinhas, com arquitetura única, remetem à história do município, que teve seu auge com a produção de açúcar. A forte presença dos engenhos lhe rendeu, em 1859, a visita do imperador dom Pedro II, que ficou hospedado no Solar do Barão de Maraú, um belo prédio histórico – único no estilo colonial na Paraíba e um dos 37 exemplares no país –, hoje a sede da Fundação Menino de Engenho.

A fundação é um espaço cultural, que recebe apresentações artísticas, grupos folclóricos, exposições, oficinas culturais, entre outros eventos. Lá, encontra-se o artesanato local, além de uma pequena biblioteca batizada em homenagem ao dia de nascimento do escritor: 3 de julho.

Bem-preservado, o casarão abriga algumas fotos de José Lins do Rêgo, além de pinturas e artesanatos com imagens e figuras da obra do romancista. Na praça em frente, que também leva seu nome, uma homenagem a José Lins do Rêgo (e, talvez, a única): um busto inaugurado por ele próprio em 1951.

Em Pilar, fomos informados que todo o acervo do escritor encontra-se em João Pessoa, no moderno e gigantesco Espaço Cultural José Lins do Rêgo, com biblioteca, objetos pessoais, arquivos, fotos e alguns originais do autor.

Histórias pra contar

Ao contrário de Sapé, em Pilar não se vê nas ruas menção (frases ou placas) a seu filho mais ilustre, porém, os moradores falam com orgulho e contam histórias do autor.

A sede do tão aclamado engenho ainda está lá, mas não há nada na estrada indicando que ali funcionou um dos engenhos mais importantes do Brasil: o Engenho Corredor. Agora, restaurado e ainda de propriedade de familiares (primos) de José Lins. (Com Tânia Ramos)


Nome inusitado, cultura indígena e praias únicas

Tão perto de João Pessoa (85 km) quanto as cidades literárias, está Baía da Traição, que fica dentro de uma reserva indígena – são 13 as aldeias espalhadas pelo município. Com seu nome inusitado, ele tem praias com falésias, um antigo forte, um belíssimo farol, lagoa e rio de águas cristalinas, além de nascentes e córregos por todos os lados.

Uma das versões para o nome do município, de cerca de 10 mil habitantes, seria uma traição dos antigos índios potiguara (nos primórdios da colonização) a uma tripulação portuguesa que recebeu permissão para atracar na baía e foi alvejada pelos índios que já estavam cooptados pelos franceses.

O portal de entrada da cidade é um arco, com uma flecha no meio, tendo como base uma canoa indígena, tudo muito sugestivo e original. Ao andar pelas ruas, depara-se com pequenas embarcações espalhados pelas calçadas.

Na baía, de 11 km, ficam as praias Jangadinha, da Trincheira, Ponta das Trincheiras, da Baía, Central, do Forte, Tambá, Jerimum e Cardosas.

 

Natureza
Muitas lagoas e rio do Gozo
Com seus rios preservados, existem belas lagoas – como Canário, Encantada e do Mato – e um rio de águas límpidas e cristalinas: do Gozo, que lembra os mananciais de Bonito, no Matogrosso do Sul. Lá também pode-se ver os peixes e o fundo do rio de areias brancas. Preservado e mais visitado, o rio ainda não conta com infraestrutura turística. Ele fica a 13 km do centro da Baía, dentro da aldeia indígena de Tracoeira, sendo acessado por estrada de terra. Além de ponto de lazer, o Gozo é um importante manancial que abastece boa parte da região. 


Serviço

Sapé

M. Augusto dos Anjos
Visitação: Um dia é suficiente para visitar o velho engenho e o memorial 
Horário (memorial): Funciona de terça a sábado, das 8h às 16h, e aos domingos e feriados, das 8h às 12h. 
Informações: (83) 99421-3010 ou www.memorialaugustodosanjos.com
Preço: R$ 2 por pessoa

Onde comer
Bar da Charque. Restaurante self-service de comida regional, na saída para a BR–230. (83) 98808-1109


Pilar

Engenho Corredor (no local, há espaço para aula de campo, encontros e eventos)
Visitação: só agendada
Horário: de segunda a sexta-feira, das 8h às 11h e das 13h às 15h, e, aos sábados, das 8h às 11h
Contato: (83) 98787-9705 (WhatsApp)
Preço: R$ 20

João Pessoa

Espaço Cultural José Lins do Rêgo
Endereço: rua Abdias G. de Almeida, 800, Tambauzinho
Informações: (83) 3211-6201

Baía da Traição

Onde comer
Restaurante Forasteiro. Os pratos custam, em média, R$ 60 (duas pessoas)
Terraço Potiguara. Especializado na culinária regional. Os pratos com carne de sol são saborosíssimos e saem em média a R$ 60

Onde se hospedar
Pousada Beira do Mar. Diária para casal a R$ 150. (83) 3296-1675
Pousada Alto Astral. Diária para casal a R$100. (83) 98770-9247