A batalha comercial entre China e Estados Unidos ganhou mais um capítulo nesta quarta-feira (9), com a resposta de Pequim às tarifas de 104% impostas por Donald Trump para a entrada de produtos chineses em território norte-americano. A decisão de Xi Jinping, ao impor alíquota de 84% às exportações dos EUA, ainda não teve uma reação da Casa Branca, mas demonstra que o conflito entre as duas maiores economias do mundo está longe de chegar a um denominador comum.
Somados, os Produtos Internos Brutos (PIBs) dos dois países representam 44% da economia global, somando cerca de US$ 47 trilhões. Na avaliação do professor de Direito Internacional da Fundação Getúlio Vargas e da Universidade Federal Fluminense, Evandro Menezes de Carvalho, a guerra comercial encabeçada entre Washington e Pequim deve ganhar novos capítulos, até que seja encontrada uma saída diplomática para estabelecer um acordo entre os dois países.
“Em algum momento essa guerra comercial vai ter que chegar a um ponto em que as partes terão que acertar e negociar, a questão é saber quando. Os dois estados saem perdendo, a China evidencia que ela não está disposta a se curvar, muito embora a tarifa de 84%, numa postura diferente da anterior, quando ela igualou, né, o percentual dela à tarifa dos Estados Unidos, sinaliza aí uma disposição para o diálogo. Resta ver se o Trump quer fazer isso ou se ele quer continuar fustigando os chineses”, avaliou Carvalho.
Para Evandro, uma negociação entre os dois países deve ser iniciada após Trump avaliar os resultados financeiros das tarifas comerciais estabelecidas pelos EUA. “Se Trump perceber que está se dando bem, ele vai insistir nessa política agressiva com a China. E quando eu digo se dar bem, digo dentro do objetivo dos Estados Unidos de tentar prejudicar a economia chinesa e o papel que a China tem exercido na economia global”, acrescentou Menezes, também docente na Cátedra Wutong da Universidade de Língua e Cultura de Pequim.
Risco ao multilateralismo
De acordo com o professor Evandro Menezes de Carvalho, o protecionismo de Trump tem como objetivo pôr abaixo as diretrizes de livre comércio, estabelecidas pela Organização Mundial do Comércio (OMC). Ele lembrou que apesar da agressividade e intensidade das medidas recentes, o modelo também foi defendido no governo de Joe Biden, que antecedeu o republicano, com barreiras, sobretudo, à China.
“Me parece que a estratégia do Trump é colocar todos os países de joelho para negociar, um a um, as condições que melhor favoreçam os Estados Unidos. Ele (Trump) desde o primeiro mandato tem explicitado a preferência dele pelo bilateralismo nas relações internacionais. O Trump é avesso ao multilateralismo. Porque o multilateralismo implica a possibilidade da maioria se unir contra os Estados Unidos. Já em uma negociação bilateral, os Estados Unidos sempre serão a parte mais forte por ser a maior economia do mundo”, sinalizou Carvalho.
Menezes ponderou que a China, por ser a segunda economia global, acaba sendo o elo mais frágil na relação bilateral com os EUA. “Porém, no outro lado, a China é um país que tem uma economia robusta, não é um negociador que irá facilmente se sujeitar aos desejos do Trump. E aí os Estados Unidos ,muito provavelmente dentro dos seus estudos de cenários, sabem que até um determinado momento eles precisam reagir à ascensão chinesa sob pena de ser tarde demais”, completou o professor sobre a batalha entre os dois países na busca pela dianteira global.
Nesta quarta-feira, ao anunciar que a alíquota para produtos dos EUA subiria de 34% a 84%, o governo chinês criticou a Casa Branca. Em um comunicado, o Ministério das Finanças da China, classificou que a decisão de Trump em impor tarifas de 104% à economia chinesa é um erro. "A prática dos Estados Unidos de atualizar as tarifas na China é um erro, o que infringe seriamente os direitos e interesses legítimos da China e prejudica seriamente o sistema de comércio multilateral baseado em regras", disse a pasta.
E os europeus?
Na avaliação do especialista, Trump vê a União Europeia como 'aliados ingratos'. O bloco recebeu taxas da Casa Branca de 25% sobre automóveis, aço e alumínio, além de alíquotas de 20% para praticamente todos os produtos. Nesta quarta, porém, os europeus seguiram os chineses e reagiram com o anúncio de 25% a produtos estadunidenses. No comunicado, a União Europeia afirmou que as medidas de Trump são injustificadas, prejudiciais e causam danos econômicos ao mundo.
“E por que aliados ingratos? É como se, ao taxar, Trump disse o seguinte: ‘até agora os Estados Unidos ajudaram vocês, só que agora é hora de vocês ajudarem os Estados Unidos. E qual a mensagem implícita? É de que os Estados Unidos estão em risco de perder a liderança econômica no mundo para a China, porque perderam muito tempo ajudando esses países. Então, é neste sentido que ele está colocando taxas e aumentando tarifas na Europa”, observou Menezes de Carvalho.