Mudanças climáticas

COP28: o que todos podemos fazer para evitar o aquecimento global?

Empresas, indústrias, autoridades, bancos e até as pessoas físicas podem ajudar muito no combate às emissões dos gases de efeito estufa

Por Alexandre Nascimento
Publicado em 30 de novembro de 2023 | 07:00
 
 
 
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Começa nesta quinta-feira (30) em Dubai, nos Emirados Árabes, a 28ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP28), que reunirá líderes de cerca de 190 países. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva estará presente no evento, que ocorrerá até o dia 12 de dezembro e deverá fazer um balanço da implementação do Acordo de Paris – estabelecido na COP21, em 2015. 

Na última semana, o Relatório sobre a Lacuna de Emissões 2023 da Organização das Nações Unidas (ONU) alertou que as emissões de gases de efeito estufa previstas para 2030 precisam cair entre 28% e 42% para que a temperatura global não suba mais do que 1,5°C. Mas o mesmo relatório aponta que as emissões globais aumentaram 1,2% entre 2021 e 2022, atingindo um novo recorde.

Na COP28, o Brasil deverá endossar o compromisso de manter o aumento da temperatura média global em até 1,5°C, além de cobrar recursos para reparação e para uma transição justa para os países em desenvolvimento.

 

O uso de energia mais limpa, o combate ao desmatamento e a emissão de menos gases poluentes são fundamentais para que o mundo consiga alcançar as metas do Acordo de Paris. 

E outras pesquisas recentes confirmam a importância dessa discussão. Um estudo do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), divulgado neste mês de novembro, aponta que o número de dias de calor extremo passou de 7 para 52 por ano no Brasil na última década.

“O que nós estamos percebendo é que esses eventos extremos estão ficando mais intensos e mais frequentes. E isso se dá pelas mudanças climáticas, consequência do aumento das emissões dos gases de efeito estufa globalmente”, afirma Mári Feldman, pesquisadora do INPE.

E mesmo com esse aumento de dias seguidos de calor extremo, o Brasil ainda dá exemplo para o mundo em ações para reduzir o aquecimento global. 

“80% das emissões de gases poluentes no mundo estão ligadas à energia, que o Brasil é beneficiado porque a nossa matriz é limpa, mas o mundo ainda queima carvão, gás e diesel em grande escala”, justifica o professor Carlos Braga, coordenador do Centro em Referência em Inovação do ESG da Fundação Dom Cabral (FDC). 

No Brasil, 86% da energia produzida vêm de fontes renováveis, como a água (hidrelétricas), o sol (painéis solares) e a força dos ventos (turbinas eólicas).

Maiores poluidores

Alguns setores poluem mais do que os outros durante o processo de produção, com maior emissão de gases poluentes, como a siderurgia, a indústria petroquímica, o transporte, a construção civil e a agropecuária. Mas o maior culpado pelas emissões brasileiras é o desmatamento ilegal, com a grande quantidade de queimadas.

“Aqui no Brasil, 50% das emissões têm a ver com o desmatamento ilegal, cuja solução é impor a lei. Globalmente, o vilão é a energia, que o Brasil tem uma matriz limpa”, reforça Carlos Braga. 

“O segundo grande setor poluidor no país é a indústria, concentrando muito em três setores presentes em Minas Gerais: a siderurgia, com 9% das emissões; a petroquímica, com 7%; e as cimenteiras, com 5% a 6%. Esses são os grandes poluidores. E não é porque eles são malvados, é porque o processo produtivo do cimento, da petroquímica e do aço precisa daqueles fornos enormes com energia muito alta, de 1.000 a 1.500 graus, e ainda não tem uma solução mais interessante que não seja carbono, especialmente na siderurgia e no setor do cimento”, explica o professor da FDC.

A agropecuária também é um setor que polui bastante, pois geralmente precisa desmatar para a criação de áreas de produção do gado. E os bois também soltam gases poluentes.    

“O metano também é associado ao gado bovino, que libera esse gás ao ruminar. Nós temos oito bilhões de pessoas na terra e temos cinco bilhões de cabeças de gado. Então a pecuária tem um peso sim. As soluções técnicas para reduzir isso passam por muitas medidas. Uma delas é reduzir o tempo para o corte e quando os pecuaristas fazem aquele confinamento, em vez do gado demorar três anos para engordar, ele engorda em dois, então é um ano a menos de emissões de metano. E há algumas iniciativas e aditivos, especialmente para o gado em confinamento. É como se ele tivesse tomando um ‘Luftal’ para reduzir um pouco as emissões”, destaca Braga.

O transporte também é extremamente poluente e já responde por 11% das emissões de gases no país, segundo o professor. Neste caso, a ação do indivíduo também tem um peso grande, assim como no caso das empresas.

Por isso, uma solução é evitar o uso de veículos movidos a gasolina e a diesel e dar prioridade para biocombustíveis, para o transporte público e para outros meios de locomoção mais sustentáveis, como a bicicleta. 

O que cada um pode fazer para evitar a emissão de gases poluentes?

1 - Empresas e indústrias

As grandes e médias empresas do país não estão paradas e a maioria já investe muitos recursos em busca de práticas mais sustentáveis de produção, com foco nas políticas ESG (do inglês Environmental, Social and Governance - em português, Governança Ambiental, Social e Corporativa). 

“Hoje, 96% das empresas que estão na bolsa de valores já anunciam práticas ESG. E 83% estão fazendo o inventário de carbono. Esse é o ponto central de uma empresa, seja grande ou média, que queira entrar numa agenda ESG. Ela vai fazer um diagnóstico, como se fosse uma pessoa para tratar uma doença. Você vai ao médico, ele te manda rapidamente fazer uns exames, tirar sangue e fazer uma chapa. A ressonância magnética do carbono é esse inventário, que segue normas mundiais”, afirma o professor da FDC.

O inventário de carbono divide as emissões em três aspectos. No escopo 1, estão as emissões feitas pela própria empresa no processo produtivo; no escopo 2, é analisada a energia que ela consome; e o mais difícil é o chamado escopo 3, que engloba as atitudes que os fornecedores daquela empresa estão fazendo para reduzir as emissões e o que o clientes dela também fazem para auxiliar nesse processo.

2 - Construção Civil 

Um dos grandes problemas da construção civil é a produção de um tipo de lixo de difícil destinação. As principais construtoras já discutem o assunto e tentam aumentar a reciclagem no setor. 

“Cerca de 30% dos materiais usados na construção civil acabam indo para entulho. Então há emissão de gás para poder preparar aqueles materiais, mas eles não são 100% aproveitados. A questão de destinação de resíduos e de reciclagem está sendo discutida. Quando a empresa recicla, ela evita ter que fazer uma coisa virgem, aproveita algo que já foi feito e já usou a emissão de carbono no passado”, explica Carlos Braga. 

3 - Siderurgia

Ao fazerem o inventário de carbono, as empresas de siderurgia tentam buscar formas de reduzir a emissão do CO2 (gás carbônico) nos alto-fornos usados para produzir ferro-gusa.  

“A ArcelorMittal, por exemplo, tem investido muito na tentativa de sair desses fornos a carvão para uma tecnologia de hidrogênio verde, iniciativas que aqui no Brasil estão lá no Ceará. O hidrogênio verde é como se fosse uma energia do futuro, pois ele não solta CO2”, aponta o especialista em ESG da Fundação Dom Cabral.

4 - Agropecuária

Além de combater o desmatamento ilegal e reduzir o tempo para o corte do gado, como já foi citado nesta matéria, os empresários do agronegócio também podem investir em fertilizantes menos tóxicos para evitar tanto desgate do solo. 

“Existe a história do uso de fertilizantes mais orgânicos, mais biológicos, para evitar os produtos mais químicos e preservar mais a terra. É a tal da economia regenerativa, você cansa menos a terra ao usar esses fertilizantes mais modernos. E as empresas vão acabar usando menos a (indústria) petroquímica para produzi-los, ou seja, também reduz um pouco o impacto dessa indústria”, diz Braga.

5 - Transporte

As empresas podem tentar buscar meios de transporte mais sustentáveis, como os veículos movidos a biocombustíveis. No caso do caminhão, a preferência pode ser por um modelo mais novo, que emita menos gases poluentes, ou por veículos elétricos.

As pessoas físicas também podem ajudar nesta situação, pois o impacto da queima dos combustíveis fósseis (gasolina e diesel) no aquecimento global é grande. 

Uma alternativa é dar preferência para meios de locomoção mais sustentáveis, como carros movidos a etanol e bicicletas, além do transporte público. Apesar de um ônibus a diesel ainda emitir CO2, ele transporta mais pessoas de uma só vez e isso reduz a emissão total de gases na cidade.

6 - Pessoas físicas

As pessoas físicas podem até ajudar a combater o aquecimento global economizando energia, não queimando lixo, denunciando desmatamentos ilegais, comendo menos carne e aumentando as áreas verdes em casa.

No entanto, a maior contribuição que as pessoas físicas podem dar é em relação ao transporte, como citado no tópico anterior.

7 - Sistema financeiro

Os bancos têm papel essencial na agenda climática por serem os financiadores das empresas e dos governos. E eles já estão oferecendo linhas de crédito melhores para as companhias e países que comprovem ações para evitar a emissão de gases poluentes. 

“Cada vez mais os bancos, como o BNDES e os bancos privados, oferecem linhas com condições especiais para as empresas que estão tomando esse tipo de atitude”, confirma Braga. 

Recentemente, o Uruguai tornou-se o primeiro país do mundo a obter um empréstimo do Banco Mundial (BM) que lhe permite reduzir juros se o setor agropecuário poluir menos. 

Trata-se de um empréstimo de US$ 350 milhões (R$ 1,7 bilhão) pelos quais o país pagará até US$ 12,5 milhões (R$ 61 milhões) a menos de juros se conseguir "uma diminuição verificável das emissões de metano da agropecuária", afirmou a instituição em um comunicado. 

8 - Autoridades

Além de combater o desmatamento ilegal, as autoridades precisam criar incentivos para a expansão da energia limpa. No Brasil, um exemplo foi o programa de renovação da frota de caminhões, lançado no meio do ano pelo governo federal, que criou um mecanismo de desconto para facilitar a compra de veículos mais sustentáveis por autônomos e pessoas jurídicas. 

Além de aquecer o mercado automotivo e manter funcionando a cadeia produtiva do setor, o programa contribuiu para colocar em circulação veículos com maior eficiência energética e, portanto, menos poluentes. 

Na época do lançamento do programa, o vice-presidente Geraldo Alckmin explicou as vantagens da renovação da frota do país. “Veículo muito velho polui 20 vezes mais. [A troca por novos veículos] Vai melhorar a qualidade do ar, contribuir para a saúde. Tem frenagem moderna, evita mortes. Ou seja, é menos poluente, mais confortável, evita acidentes e salva vidas”, disse.

Outro exemplo de ação no Brasil para estimular o consumo da energia limpa é a tentativa do governo federal em aumentar o percentual de álcool na mistura com a gasolina, o que pode obrigar os consumidores a usarem mais o biocombustível. Desde 2015, o etanol corresponde a 27,5% da gasolina. O governo federal quer passar esse percentual para 30% e enviou ao Congresso Nacional, em setembro, o projeto de lei (PL 4516/2023), apelidado de “Combustível do Futuro”. 

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