Internacional

Na Colômbia, ONG acusa polícia de atirar em civis em protestos: entenda a crise

A ONU condenou o uso excessivo da força: Estamos profundamente alarmados com os acontecimentos ocorridos na cidade de Cali, quando a polícia abriu fogo contra os manifestantes

Por Da Redação, com AFP
Publicado em 04 de maio de 2021 | 08:44
 
 
 
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A Colômbia mergulhou essa semana em mais uma crise política com protestos violentos que já causaram a morte de 19 pessoas, após a tentativa da aprovação de uma reforma tributária. Entenda a situação no país:

Quantas pessoas morreram?
Até a noite dessa segunda-feira (3), havia 19 mortos, sendo 18 civis e um policial. Já o ministério da Defesa contabilizou 846 feridos, dos quais 306 civis.

Onde ocorrem as manifestações?
Os manifestantes protestaram nas ruas de Bogotá, Medellín (noroeste), Cali (sudoeste) e Barranquilla (norte). Os organizadores convocaram uma nova marcha para quarta-feira, apesar de já estarem em vigor nas principais capitais medidas que limitam a mobilidade para conter a terceira onda da pandemia.

A polícia está atirando nos civis?
ONGs e a oposição acusam a polícia de atirar em civis. O diretor para as Américas da ONG Human Rights Watch, José Miguel Vivanco, confirmou a morte de uma pessoa nas mãos de um policial em Cali, uma das cidades mais afetadas pelos distúrbios.  De acordo com a ONG Temblores, 940 casos de abusos policiais ocorreram nos últimos dias e são investigadas "as mortes de oito manifestantes supostamente agredidos por policiais". 

O governo atribui os atuais distúrbios a "organizações criminosas (que) tentaram se camuflar nos protestos". Embora o acordo de paz tenha reduzido significativamente a violência, um conflito de seis décadas persiste na Colômbia que envolve dissidentes das Farc, rebeldes do ELN e gangues de tráfico de drogas de origem paramilitar. Houve atos de vandalismo em 69 estações de transporte, 36 caixas eletrônicos, 94 bancos, 14 pedágios e 313 estabelecimentos comerciais, e o ministro da Defesa, Diego Molano, garantiu que os atos de violência foram "premeditados, organizados e financiados por grupos dissidentes das FARC" que se afastaram do acordo de paz assinado em 2016, e pelo ELN, a última guerrilha reconhecida na Colômbia. As autoridades prenderam 431 pessoas durante as dispersões e o governo ordenou o envio de militares para as cidades mais afetadas. 

A Organização das Nações Unidas (ONU) condenou o "uso excessivo da força" na Colômbia contra as manifestações. "Estamos profundamente alarmados com os acontecimentos ocorridos na cidade de Cali, na Colômbia, na noite passada, quando a polícia abriu fogo contra os manifestantes que protestavam contra a reforma tributária, matando e ferindo várias pessoas, segundo as informações recebidas", declarou em Genebra a porta-voz do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Marta Hurtado.

Marta também lançou um apelo à calma antes de um novo dia de protestos, previsto para quarta-feira. "Nosso escritório na Colômbia está trabalhando para verificar o número exato de vítimas e estabelecer as circunstâncias desses terríveis incidentes em Cali", disse Hurtado.

A porta-voz acrescentou que "os defensores dos direitos humanos também relataram que foram perseguidos e ameaçados". "Dada a situação extremamente tensa, com soldados e policiais destacados para vigiar o protesto, fazemos um apelo à calma", insistiu Hurtado. "Lembramos às autoridades do Estado sua responsabilidade de proteger os direitos humanos, inclusive o direito à vida e à segurança pessoal, e de facilitar o exercício do direito à liberdade de reunião pacífica", acrescentou a porta-voz. 

"Ressaltamos também que os agentes encarregados de se fazer cumprir a lei devem respeitar os princípios da legalidade, precaução, necessidade e proporcionalidade, ao monitorar as manifestações", frisou. Hurtado concluiu que "as armas de fogo podem ser usadas apenas como último recurso diante de uma ameaça iminente de morte, ou de lesões graves".

Por que as pessoas estão protestando?
Os protestos maciços começaram no dia 28 de abril contra uma polêmica reforma tributária na Colômbia, mesmo após o presidente Iván Duque ter recuado em seu projeto fiscal.  Pressionado pelas manifestações nas ruas, o presidente Duque ordenou no domingo a retirada da proposta que era debatida com ceticismo no Congresso, onde um amplo setor a rejeitava por punir a classe média e ser inadequada em meio à crise desencadeada pela pandemia de coronavírus.

O presidente propôs a elaboração de um novo projeto que descarta os principais pontos de discórdia: o aumento do ICMS sobre serviços e mercadorias e a ampliação da base de contribuintes com imposto de renda. 

O governo apresentou a reforma tributária ao Congresso em 15 de abril como uma medida para financiar os gastos públicos na quarta maior economia da América Latina. As críticas vieram tanto da oposição política quanto de seus aliados, e o descontentamento logo se espalhou pelas ruas. 

O projeto de reforma tributária de Duque visava arrecadar cerca de 6,3 bilhões de dólares entre 2022 e 2031, para resgatar a economia.  Em seu pior desempenho em meio século, o Produto Interno Bruto (PIB) do país despencou 6,8% em 2020 e o desemprego subiu para 16,8% em março. Quase metade dos 50 milhões de habitantes está no setor informal e a pobreza atinge 42,5% da população.  A iniciativa gerou inquietação contra o governo. Desde 2019 o chamado Comitê Nacional de Desemprego tem convocado inúmeras mobilizações para pedir a Duque uma mudança de rumo. 

“As pessoas nas ruas estão exigindo muito mais do que a retirada da reforma tributária”, disseram os líderes da manifestação em um comunicado. Com índices de aprovação em vermelho (33%), Duque reclama do "vandalismo" que irrompeu nas ruas e dos protestos em meio a um pico mortal da pandemia.  A Colômbia é o terceiro país da América Latina com o maior número de infecções por covid-19 (2,8 milhões), atrás do Brasil e da Argentina. 

Em termos de mortes (74.700), só é superado na região pelo gigante sul-americano e pelo México. Em proporção à sua população, é o quarto com mais mortes e o sexto com o maior número de infectados no continente.

Qual ministro deixou o cargo?
Nesta segunda, o ministro da Fazenda, Alberto Carrasquilla, renunciou ao cargo. "Minha continuidade no governo dificultaria a construção rápida e eficiente dos consensos necessários" para executar uma nova proposta de reforma, informou em um comunicado. Carrasquilla será substituído pelo economista José Manuel Restrepo, atual ministro do Comércio, anunciou o presidente Duque no Twitter.

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