Não era bem esse o mundo que eu desejei pra você, minha querida. Imaginei que, quando você chegasse aos 16, como agora, não teria mais que lutar as mesmas lutas, não seria preciso mais enfrentar os mesmos inimigos, nem temer os mesmos fantasmas de sempre. Desejei um mundo em que você não ouvisse cantadas toda vez que sai às ruas, não fosse encoxada no metrô, não fosse culpabilizada pela roupa que usa.
Eu realmente não queria que você – diferente de mim, sua mãe, sua tia, sua avó e sua bisavó – se acostumasse com o assédio nosso de cada dia.
Como imaginar que a campanha #meuprimeiro assédio ia fazer sentido, quando você fosse adulta?
Queria que você pudesse viajar sozinha com suas amigas pela América Latina ou Índia sem ser assassinada.
Queria que se você resolvesse, sei lá, jogar futebol e viesse a ser a maior jogadora de todos os tempos, por exemplo, você fosse tão reconhecida e amada como o maior jogador de todos os tempos e, principalmente, ganhasse o mesmo salário que ele.
Fantasiei um mundo em que você pudesse se espelhar em muitas e diversas roteiristas e diretoras de cinema, se fosse essa a sua praia. E, se quisesse ser escritora, teria as mesmas chances de sucesso dos escritores. Ou cientistas, ou engenheiros ou astronautas...
Idealizei um mundo em que “o seu lugar” fosse onde você bem entendesse e que a expressão “coisa de mulher” se encaixasse onde fosse melhor pra você.
Queria que você fosse livre, meu amor!
Você não é, como também não sou. Não somos. Mas podemos pelo menos lutar juntas, lado a lado na mesma trincheira. Lutar por tudo que nos é negado, diariamente, há séculos. Porque, embora tenha apenas 16 anos, você já entendeu que não se pode ignorar esse estado de coisas. Não dá pra ficar de braços cruzadas vendo uma mulher ser agredida a cada sete minutos neste país. Não se pode achar normal que a mulher não tenha direito sobre o próprio corpo. Não é possível aceitar que os homens tomem decisões sobre nossas vidas.
Podemos lutar juntas graças ao feminismo ter invadido as ruas, as rodas de conversa, a internet. A luta é árdua e constante porque envolve mudar desde pequenas atitudes a legislações; requer muitas transformações: de nós mesmas, de quem está do nosso lado e de uma sociedade inteira.
Vai ser difícil, mas vai ser com você, o que faz toda a diferença.
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