Fábio Pires é superintendente de Comunicação e Marketing da APPA – Cultura & Patrimônio

O cenário corporativo vive um paradoxo. Enquanto gigantes da tecnologia recuam em suas políticas ESG, cortando iniciativas ambientais, flexibilizando a agenda da diversidade ou abandonando compromissos recentes, empresas brasileiras seguem na direção contrária. A Natura, por exemplo, reafirma sua política de negócios sustentáveis investindo na preservação da Amazônia e consolidando um modelo que gera lucro e impacto positivo. Não por acaso, sua reputação se mantém alta.

A continuidade dessas ações reforça um compromisso real, enquanto retrocessos geram ruptura e quebra de confiança. Tratar o ESG como modismo ou marketing resulta em perda de credibilidade. O trabalho de anos pode desmoronar em dias. Um exemplo disso está na migração de jovens americanos para o RedNote após a ameaça de banimento do TikTok. A preferência por startups chinesas em detrimento das big techs dos EUA sinaliza um recado claro: coerência importa.

O ESG não deve ser visto como protocolo interno, e sim como estratégia. Empresas que reduzem investimentos na área podem cortar custos no curto prazo, mas perdem a confiança de consumidores, investidores e do mercado. O impacto disso é imediato. Estudos da McKinsey indicam que marcas com forte compromisso ESG superam concorrentes em crescimento e valorização a longo prazo. No Brasil, vemos esse movimento se consolidar. De Ambev a MRV, empresas locais assumem protagonismo enquanto gigantes globais hesitam.

Magazine Luiza apostou em um programa de trainee exclusivo para candidatos negros. Gerou discussão, mas provou ser uma medida eficaz de inclusão. Ambev ampliou investimentos em inovação sustentável, reduzindo o uso de plástico e promovendo circularidade na cadeia produtiva. Localiza investe na renovação de sua frota com veículos menos poluentes e na mobilidade sustentável. Seu gerente de sustentabilidade, Fernando de Faria Vilela, sintetiza o segredo do sucesso: liderança comprometida, equipe motivada e parceiros alinhados aos mesmos valores.

Posicionar-se gera riscos? Sim. Mas omitir-se é pior. Quando a Patagonia decidiu destinar todo o lucro para iniciativas ambientais, não seguiu uma tendência, mas redefiniu o jogo. O resultado foi um engajamento ainda maior de seus consumidores. Em contrapartida, o fracasso da Pepsi ao tentar se apropriar de pautas sociais no comercial estrelado por Kendall Jenner escancarou o perigo do “greenwashing”. O comercial foi retirado do ar, mas o dano à reputação permaneceu.

No Brasil, algumas marcas entendem esse recado, mas ainda há espaço para avanço. A oportunidade é clara: enquanto empresas globais dão passos para trás, podemos consolidar um modelo que alia rentabilidade e responsabilidade. Mas não basta “fazer” ESG. É preciso comunicar com consistência. Branding não se sustenta em discurso vazio. Empresas que embarcam nessa narrativa sem base concreta são rapidamente desmascaradas. O “greenwashing” e o “social washing” já são vistos como ameaças à reputação corporativa, e a nova geração de consumidores exige coerência.

Philip Kotler dizia que “o marketing autêntico não é vender o que você faz, mas saber o que fazer”. Hoje, isso significa incorporar impacto social, cultural e ambiental à estratégia de negócio. Quem entender isso antes lidera a próxima década; quem ignorar fica para trás