Gabriel Portela é mestre em economia e consultor em políticas públicas para o audiovisual (*)
O cinema brasileiro vive um momento histórico de visibilidade e projeção internacional. A consagração de “Ainda Estou Aqui” – indicado ao Oscar de Melhor Filme e de Melhor Atriz e vencedor inédito na categoria de Melhor Filme Internacional – recoloca o Brasil sob os holofotes da indústria global. O impacto simbólico e político da conquista vai além da estatueta: ela reposiciona a produção brasileira no circuito das grandes narrativas contemporâneas e reafirma o papel estratégico da cultura como ativo de desenvolvimento, identidade e inserção global. Esse novo ciclo de reconhecimento não é acaso: resulta do amadurecimento do audiovisual brasileiro, com talento, política pública, inovação e articulação internacional.
Mesmo que o mineiro carregue a fama da fala mansa e do passo contido, o audiovisual produzido no Estado vem desafiando esse estereótipo. Rompe montanhas e avança para o mundo, com produções premiadas, talentos reconhecidos e uma cadeia produtiva em expansão. Essa trajetória tem raízes no pioneirismo de Humberto Mauro em Cataguases, um dos criadores do cinema nacional, e se fortalece hoje como resultado de trabalho, criatividade, política pública e articulação.
Há quem ainda subestime o potencial do audiovisual mineiro. Mas basta olhar com atenção. “Marte Um”, de Gabriel Martins, foi o filme escolhido para representar o Brasil na disputa por uma vaga de Melhor Filme Internacional no Oscar e conquistou prêmios em diversos festivais. Produzido pela Filmes de Plástico, de BH/Contagem, a obra evidencia a força de uma geração que tem projetado Minas no cenário global. “Chef Jack – O Cozinheiro Aventureiro”, animação 100% mineira dirigida pelo saudoso Guilherme Fiuza, disputou espaço com blockbusters e figurou entre os mais vistos na semana de estreia.
Esses exemplos não são exceções e tampouco representam toda a riqueza do setor. São apenas a ponta de um iceberg criativo. Minas tem uma cena viva, plural, com estéticas diversas e capacidade de conectar o enraizamento cultural local a narrativas globais. No mercado internacional, isso é um ativo valioso.
Os números confirmam essa potência: Minas é o terceiro maior polo audiovisual do país, com 6% dos agentes econômicos cadastrados na Ancine. Entre 2014 e 2021, o número de empresas cresceu 52% no Estado e mais de 110% em BH. O setor se diversifica em áreas como games, animação e pós-produção, impulsionado por políticas públicas e pela atuação de suas entidades.
Além da produção, o Estado também se afirma como ambiente de negócios. A MAX – Minas Gerais Audiovisual Expo movimentou mais de R$ 750 milhões em prospecções na última edição.
No LatAm Content Meeting 2025, a delegação mineira coordenada pelo Sindav-MG prospectou R$ 13 milhões, dos quais R$ 4,7 milhões já contratados. Isso se chama mercado, e Minas já está nele.
O que falta, então? Falta visão estratégica de longo prazo. Falta que as instituições, públicas e privadas, reconheçam o audiovisual como vetor de desenvolvimento. Não como algo acessório, mas como política de Estado. Países que entenderam isso hoje colhem os frutos: empregos, inovação, imagem internacional, renda e fortalecimento simbólico.
Minas tem tudo: criatividade, talento, produção e uma identidade audiovisual singular. O que precisa agora é de continuidade. Investir em internacionalização, formar profissionais, ampliar a presença em mercados globais e articular o setor a agendas como inovação, turismo e tecnologia.
O audiovisual mineiro já mostrou a que veio. A hora de transformar essa energia em políticas estruturantes é agora.</CW>
(*) Secretário adjunto de Cultura de Belo Horizonte por sete anos, onde liderou a criação do BH nas Telas – Programa de Desenvolvimento do Audiovisual e da Belo Horizonte Film Commission