Alexandre Aroeira Salles é mestre e doutor em direito público
A Sociedade Mineira de Engenheiros, em parceria com o Centro Universitário Dom Helder, promoveu nos dias 18 e 19 de março um relevante encontro sobre como retomar as 6.000 obras paralisadas em Minas Gerais. Os números apresentados no evento são assustadores: há no Brasil atualmente mais de 11 mil obras inacabadas ou paralisadas, sendo que 85% delas são para a educação e para a saúde.
Os principais motivos para tal triste situação seriam:
(i) planejamento malfeito pelo poder público e correspondente insuficiência público-orçamentária;
(ii) projetos mal-elaborados;
(iii) descontinuidade de gestão política; (iv) falha na fiscalização dos contratos;
(v) incapacidade técnica de empresas contratadas; e, “para variar”,
(vi) a corrupção.
Desses seis principais motivos, quatro estão relacionados a dificuldades de o poder público bem planejar. Isso acontece fortemente nos municípios, mas também acomete as obras tentadas pelos Estados da Federação, incluindo Minas Gerais que possui atualmente 6.000 obras paralisadas, incluindo as de sua responsabilidade e as somadas com as dos municípios mineiros.
Como de conhecimento de todos, depois de quase duas décadas, em 2021 foi promulgada a Lei 14.133, substituindo a famosa Lei 8.666/1993, com a clara intenção de modernizar as contratações públicas no Brasil. Essa nova lei não introduziu apenas normas gerais para as contratações, mas também inúmeros e minuciosos dispositivos normativos relacionados ao planejamento e aos projetos, bem como outros tantos dispositivos dirigidos aos licenciamentos ambientais, à matriz de riscos e ao orçamento estimativo de obras.
Agente público de contratação
Para superar as falhas de gestão e fiscalização, a lei criou a figura do agente público de contratação, com detalhamento de como deve atuar e quais as suas responsabilidades, bem como introduziu mecanismos que ajudassem a evitar a interrupção de obra por incapacidade de se alcançar o reequilíbrio econômico financeiro do contrato pela administração pública, entre tantas e tantas regras sancionatórias, procedimentais, rituais e principiológicas.
Não obstante seus notórios esforços, percebe-se que a Lei Nacional 14.133/2021 foi produzida para atender as dinâmicas próprias da União federal e suas autarquias, como Dnit e Codevasf, tendo integrado ao seu corpo legal muitas das instruções normativas produzidas pelas entidades da União federal para alcançar os desafios que elas próprias criaram ao longo dos últimos 30 anos.
É de todo evidente que essas tantas e tantas regras não terão o condão de auxiliar os municípios e os Estados membros a terminar suas obras inacabadas. Tanto isso é verdadeiro que no final do ano de 2023 houve necessidade de se criar o Pacto Nacional pela Retomada de Obras e Serviços de Engenharia Destinados à Educação Básica e à Saúde, por meio da edição da Lei 14.719, que poderá auxiliar alguns municípios e Estados a terminar parte de suas obras, mas nunca para garantir um cumprimento sistemático de contratações que levem as obras em geral, incluindo as de infraestrutura, ao bom termo.
Para que o Estado de Minas Gerais, por exemplo, tome a dianteira no enfrentamento dos enormes desafios normativos para atender suas peculiaridades e as de seus municípios, será inevitável que promova uma lei estadual de licitações e contratações, atendendo, obviamente, as normas gerais da Lei 14.133, mas adequando aquelas normas especiais (e são muitas) feitas apenas e sob medida para a União federal.
Se assim o Estado fizer, darão segurança jurídica para os seus agentes públicos, que poderão atender uma legislação muito mais compatível com as estruturas e os processos internos de seus órgãos e estruturas administrativas