Um dos integrantes daquela mesa, num desabafo, confessou que a pandemia o tornou mais velho: “Nunca me senti tão alquebrado. Sinto isso, e constato diariamente, com nitidez”, disse ele.
A vida caminha hoje mais depressa do que ontem? Para minha calejada e sofrida geração, com certeza. Para os jovens, talvez, nem tanto, embora alguns deles, por coincidência, no penúltimo fim de semana, tenham afirmado que sofrem da mesma sensação (a de que o tempo está passando mais depressa também para eles). Que o diga sobre o assunto – que hoje seria mais da alçada dos neurocientistas – o escritor e filósofo francês Paul Janet (30.4.1823 – 4.10.1899).
A verdade é que o tempo é igual para todos, mas cada um percebe a sua velocidade de modo pessoal, vale dizer, diferente. Não sei explicar os motivos, mas, no meu caso, desde muito jovem, preocupava-me com a velocidade do tempo de vida de que dispunha (dispunha?). Por isso, fui cauteloso ao mirar e cuidar do futuro. Sempre achei que a velhice imprimiria maior velocidade ao tempo.
Não sei por que motivo essas ideias me motivaram a compor este texto com o intuito de levá-lo, leitor, quem sabe, a reflexões desagradáveis e até inoportunas. Talvez porque esteja hoje mais ansioso do que ontem. Ou talvez porque a ansiedade só passa mesmo com o “fazer alguma coisa”, tornando a vida, sim, mais veloz, mas, em compensação, mais leve e mais criativa, senão ao menos mais curiosa.
Assusta-me, sem dúvida, que o primeiro caso do novo coronavírus já tenha completado nove meses. Foi detectado na cidade de Wuhan, na China, no dia 31.12.2019. Jair Bolsonaro já “governava” havia um ano e se preparava para adotar o “império do casuísmo”. Desde o seu início, chamou a doença de “gripezinha” e partiu para provar o que afirmou tão irresponsavelmente, deixando de lado qualquer precaução.
Abraçou, aglomerou, ridicularizou a ciência e se mostrou impermeável a qualquer ato de empatia. Acabou vítima da doença, que não lhe foi algoz.
Hoje, o Brasil está em segundo lugar em óbitos no mundo provocados pela Covid-19. São mais de 150 mil. Só está atrás dos Estados Unidos (com mais de 210 mil vítimas), cujo presidente segue ao encontro da derrota – depois de perder, também, para o coronavírus – na tentativa de reeleição para a Presidência da República da maior democracia do mundo. Talvez, um bem para a humanidade, que se verá livre de alguém que faz uso da palavra quase sempre para exalar apenas arrogância e, pior, para divulgar mentiras pelo mundo afora.
Aprendamos com a pandemia. Que ela nos desperte para a realidade dessa estúpida polarização política. E que nos torne “capazes de reagir com um novo compromisso de fraternidade e amizade social que não se limite em palavras”, adverte o papa Francisco.