A chaga aberta no patrimônio dos mineiros há anos ganha mais força. Por vezes acompanhamos a agressão ao patrimônio religioso e cultural de Caeté se tornar algo ainda mais violento. Aos poucos, a mineração destruidora avança na serra da Piedade.
Nem mesmo o alerta da Arquidiocese de Belo Horizonte pela área tombada pelo Iphan é capaz de frear o que acontece no local que abriga o Santuário Estadual Nossa Senhora da Piedade. Aos poucos, estamos perdendo nossa serra da Piedade para um processo destrutivo de extração mineral, que já deixou muitas sequelas. Ao todo são 1.746 m de altitude com reservas de Mata Atlântica e cerrado. Uma área de 1.945 hectares, com mais de mil nascentes, sendo abruptamente tomada dos mineiros.
Em março, a licença para essa depredação à serra foi mantida, mesmo com o pedido e o esforço da Arquidiocese de Belo Horizonte para que fosse interrompida a exploração do local. Mais do que parar imediatamente o que acontece hoje em um dos maiores polos de turismo religioso do país, recebendo mais de meio milhão de pessoas por ano, a serra da Piedade clama pela volta do que lhe foi retirado.
A mineração na mina do Brumado começou em 1950 e foi interrompida somente em 2005. Mais de 50 anos depois, uma decisão judicial deu uma pequena trégua aos inúmeros danos ambientais causados ao nosso patrimônio. Não bastassem todas as décadas de agressões e desrespeito com nossa serra da Piedade, voltamos à estaca zero? Ambientalistas e estudiosos garantem que o retorno das atividades no local pode desmatar mais de 20 hectares de campos rupestres, extinguir vegetação nativa, destruir cavidades, instalar grandes unidades de tratamento de minério, ao captar mais de 30 L de água por segundo do córrego do Brumado. Isso iria prejudicar a agricultura, fauna e flora locais.
Além disso, todo o Monumento da Serra da Piedade, incluindo a área que vai além do santuário, é protegido por diversos reconhecimentos: reserva da biosfera pela Unesco, tombamento como Patrimônio Cultural, Paisagístico e Religioso, título internacional por conter a menor basílica do mundo, duas unidades de conservação municipal em Caeté, uma reserva ambiental de propriedade particular, bacias hidrográficas de importância estratégica na região metropolitana, maior número de espécies ameaçadas de extinção no Estado.
A degradação, suspensa há 15 anos, retorna de forma ainda mais danosa para Minas Gerais. Uma ferida já aberta aos pés da serra da Piedade, um local onde a vida é tão exuberante que pulsa para mostrar todo o seu esplendor, e o ser humano, na sua ganância, tudo faz para que ela não possa se reconstruir.
Como afirma o papa Francisco, “é ilusão pensar que teríamos uma humanidade sempre saudável quando o mundo está doente”. Viva a serra da Piedade!