Após um longo processo de negociação entre os altos níveis diplomáticos do Brasil, do Egito e de Israel, a repatriação de 32 brasileiros que estavam na Faixa de Gaza foi concluída. Na noite de 13 de novembro, o presidente da República, Lula da Silva, acompanhado do chanceler Mauro Vieira e do assessor especial Celso Amorim, estiveram na recepção do grupo, o que contou com ampla divulgação da mídia nacional.

Na ocasião, o embaixador Mauro Vieira proferiu algumas palavras demonstrando a satisfação da diplomacia nacional em solucionar o processo de repatriação dessas pessoas e ponderou que há, ainda, brasileiros na região do conflito, mas que ainda não demonstraram interesse no seu retorno. Desde o início da guerra, centenas de pessoas saíram de Israel, da Cisjordânia e, mais recentemente, de Gaza para o retorno ao Brasil.

De forma muito emocionada, a mídia cobriu o encontro de parentes com os repatriados, e as imagens de esperança que pairavam, principalmente sobre jovens e crianças que haviam se distanciado das áreas de guerra. O governo brasileiro oferece recursos financeiros e sociais para que esse grupo se restabeleça no país. Houve uma clara politização da guerra para atrair boas imagens ao governo Lula.

Os problemas de fato começam a apresentar-se quando o presidente da República, em um discurso improvisado, equipara as ações do grupo terrorista Hamas às atitudes de Israel na Faixa de Gaza, utilizando-se, inclusive, do conceito de terrorismo para caracterizá-las. Para além de considerar-se, obviamente, contra a guerra e de defender a integridade física dos civis, especialmente mulheres, idosos e crianças, Lula dispara contra os israelenses, classificando suas atitudes como sendo tipicamente terroristas.

No início do confronto, em 7 de outubro, a opinião pública pressionou o governo brasileiro para que houvesse uma declaração condenatória ao Hamas. Embora tal desabono tenha ocorrido, a diplomacia nacional apresentava as suas limitações em descrever tal grupo como sendo terrorista pelo fato de que isso não havia sido deliberado pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas. Em diversas ocasiões, as autoridades brasileiras insistiram em aguardar o momento adequado para condenar o Hamas.

Fato é que o mesmo cuidado não se aplicou ao caso de Israel. Não há interesse neste artigo em defender as atitudes de nenhum dos lados. Tampouco de problematizar se está havendo genocídio, crimes de guerra ou limpeza étnica na Faixa de Gaza. Todas essas avaliações deverão ser feitas em tempo pelas organizações internacionais competentes. O que chama certamente a atenção é a falta de cuidado do presidente brasileiro em, de forma improvisada, indispor-se contra um dos lados da guerra.

Em um encontro realizado em Paris na última semana, o embaixador Celso Amorim, um dos nomes mais representativos da diplomacia brasileira sob Lula, afirmou que os embates em Gaza geram, necessariamente, um pensamento de que está havendo um genocídio na região. De forma não esperada, o tom das falas brasileiras sobre Israel começa a se tornar mais forte e deve ter repercussões no cenário internacional. A reação do primeiro-ministro Netanyahu e do ministro de Relações Exteriores de Israel, Eli Cohen, deve vir na sequência em desagravo ao Brasil.

É importante ressaltar que o Brasil é membro rotativo do Conselho de Segurança da ONU até dezembro do presente ano e mantém boas relações com Israel, pelo menos desde os anos 1940, quando tal Estado foi criado. O Brasil ocupava, inclusive, um papel de destaque no fórum que aprovou a resolução da criação do Estado de Israel sob a presidência do embaixador Oswaldo Aranha. O questionamento que nos orienta neste momento é: a diplomacia brasileira ganha ou perde ao posicionar-se frente a assuntos internacionais de tamanha sensibilidade?

Christopher Mendonça é doutor em ciência política e professor de relações internacionais do Ibmec-BH

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