O livro “Um Tempo para Não Esquecer”, da médica e pesquisadora Margareth Dalcolmo, une conhecimento da medicina ao talento da escritora. As páginas dos 81 artigos descrevem o que vivemos, no inesquecível período entre abril de 2020 e novembro de 2021.
Margareth lembra como começaram “estes tempos duros que marcaram indelevelmente nossas vidas e que, podemos dizer, deram início ao século XXI”. Sua formação médica se destaca na descrição da doença e seu enfrentamento, e a formação literária surge em citações apropriadas, não apenas de cientistas e médicos, mas também de escritores, filósofos, dramaturgos.
A médica ajuda a ver a pátria do século XXI formada pela humanidade, seus valores humanistas e concepções do mundo, graças à ciência; mostra a necessidade de uma ética, sobretudo entre políticos, capaz de aceitar as regras da ciência e usá-la a serviço dos interesses da humanidade.
Quando fala da consciência social da população brasileira ao se vacinar, deixa implícito que no Brasil a cultura venceu a política, ao nos transformar em um dos países com maior índice de vacinação, apesar de ter o governo mais negacionista entre todos no mundo atual.
“Um Tempo para Não Esquecer” faz lembrar como será diferente o Brasil quando tivermos consciência social pró-educação, vista como a mãe de todas as vacinas: contra a permanência da pobreza, a desigualdade, a ineficiência e o negacionismo. O capítulo sobre a aventura da ciência pode ser especial para despertar os jovens a descobrirem a beleza e o poder da ciência.
Margareth alerta para epidemias futuras, por vírus e bactérias ainda não conhecidos, e nos alerta para a maior das epidemias em marcha: o meteoro interno que por falta de ética usa a inteligência para depredar o meio ambiente e concentrar os benefícios sociais e econômicos do progresso.
Além do alerta, o livro acena para o caminho a seguir: “Esperamos que, dessa fusão entre o engajamento público e a comunidade científica, como o caminho mais democrático e sereno, seja possível vencer o reducionismo que distingue ciência e política e a cética encruzilhada entre certo e errado”.
As epidemias dizimam populações, desagregam economias, desesperam povos; de positivo ficam as obras literárias de seu tempo: são as flores da epidemia. Em verso, Quintana resume: “e eis que veio uma peste e acabou com todos os homens mas em compensação ficaram as bibliotecas”.
O livro de Margareth Dalcolmo faz parte desse jardim, onde estão livros de Camus, Boccacio, Defoe. Por isso, é preciso universalizar suas especificidades nacionais e traduzi-lo a outros idiomas, para mostrar ao mundo o tamanho de nossa tragédia e o nível de nossa literatura ao descrever um “tempo para não esquecer”.