Foi em novembro de 2018 que ouvi falar de Greta Thunberg. Li no celular a primeira notícia sobre ela ao passar por Kronborg, na Dinamarca, local do castelo onde Shakespeare imaginou Hamlet. Inspirado pela proximidade, deduzi que a menina da vizinha Suécia teria de enfrentar, em breve, seu próprio “ser ou não ser”. Acho que chegou a hora, e vejo duas opções hamletianas para Greta.
Na melhor, ela volta para a escola que abandonou há um ano. Paixão pela natureza, cara enfiada nos livros e amadurecimento devem produzir resultados fantásticos. A educação nos países nórdicos é inigualável. Greta, que tem síndrome de Asperger, contará com meios infinitos para se tornar, se quiser, uma brilhante cientista, descobridora de novas fontes de nutrição, de energia, de bioengenharias importantes no futuro. Seu sonho – ao contrário do que afirmou, chorosa – não foi destruído, diferentemente dos pesadelos de milhões de crianças de países miseráveis que morrem de fome e de doenças há décadas, sob o olhar complacente da ONU e das nações europeias que deles extraíram tudo, incluindo a dignidade.
A segunda opção seria lamentável: seduzida pelos refletores, pela turma gritando seu nome, ela deixaria a escola e viraria ativista profissional em definitivo. É um caminho mais fácil.
Estudar envolve disciplina, privações, anonimato dos bastidores. Já a militância precoce e bonitinha, não. Paparicos, aplausos, frases de efeito, “gadgets” ecológicos e amparo interesseiro dos bajuladores politizados não faltarão. Caso escolha essa via, teremos amanhã uma senhora frustrada e rica, falando de oceanos limpos e florestas preservadas quando não existir mais nada disso.
Ativismo costuma ser controverso – e até rentável, como vemos por aí. Jornais europeus revelaram nesta semana ligações da menina e de seus pais com George Soros, com um grande grupo espanhol e também com multinacionais lideradas por Ingmar Rentzhog, milionário sueco. O fato é que a saga de Greta tem perfil conveniente e oportuno. Pega-se um tema polêmico – meio ambiente, minorias, defesa de animais – e criam-se ícones fugazes, sugando dele tudo, inclusive lucros. Slogans, discursos, gente gritando nas ruas fazem sucesso; passam a falsa impressão de que o mundo será perfeito já no dia seguinte, por um milagre, como se fosse fácil.
Também eu, aos 16 anos, enchi o saco das aulas e passei a matá-las. Minha causa não era tão nobre: fugia da responsa navegando nas velhas barcas do Parque Municipal com alguns cúmplices vagabundos. Braços nos remos, impulsos metafóricos contra a estagnação das águas monótonas da juventude, matávamos aulas descaradamente. Mais tarde notei, um tanto envergonhado, que meus assassinatos no parque decorriam de puro medo da matemática, da física, da química e, principalmente, medo de me tornar adulto e ganhar a vida sem chororô.
Então, Greta, baixe a bola e volte para a escola. Aproveite o privilégio de estudar numa nação como a Suécia. Já no Brasil – país difícil para o qual estrangeiros inventam soluções fantásticas sem jamais terem vivido um dia aqui – muitas Gretas se perdem por não terem sequer um caderno. Professores abandonam o magistério para não serem espancados. Estudantes batem recordes de ignorância nos bê-á-bás das matérias. A militância e os modismos tomaram o lugar do conhecimento nas universidades. Por isso, muitos iludidos chegarão às entrevistas de emprego – se tiverem a sorte de encontrá-las – sabendo apenas repetir slogans que ouviram nas assembleias.
Trabalhando como cientista, pesquisadora, engenheira, nutricionista ou algo assim, Greta Thunberg e seu entusiasmo poderão certamente melhorar o mundo. Se preferir o ativismo midiático, pueril e birrento, só vai dividi-lo ainda mais.