Circula nas redes sociais uma frase de autor desconhecido, provavelmente da era medieval, que se aplica perfeitamente ao Brasil de hoje: “Difícil administrar um reino onde uma parte tem medo da morte, outra tem medo da fome... e a terceira quer atear fogo ao castelo. Espero que, ao final, os que têm medo da morte e os que têm medo da fome se unam contra os que querem atear fogo ao castelo”. A ironia é que, no Brasil, esses últimos estão dentro do próprio castelo.
Em plena pandemia do coronavírus, é o poder central, na figura do presidente da República, que se opõe aos que têm medo da morte e aos que começam a passar fome, condenando o isolamento social, abraçando seguidores nas ruas e retardando o repasse de recursos aos que perderam sua fonte de renda. Trata-se de um quase suicídio político promovido pela insensatez do ataque simultâneo à ciência e aos princípios humanitários.
Finalmente, o presidente, seguindo os passos do governante dos Estados Unidos, Donald Trump, e reconhecendo a ampla adesão dos brasileiros às recomendações da Organização Mundial da Saúde, começa a moderar seu discurso e a prometer verbas de emergência para a saúde e para a manutenção de empregos.
Tais medidas, no entanto, parecem não vir a tempo de prover o sistema nacional de saúde dos meios indispensáveis ao combate eficaz da pandemia. É isso que deixa transparecer o ministro da Saúde ao declarar que, mesmo tendo contratos assinados e dinheiro para pagar as encomendas de equipamentos no exterior, nada garante que tais produtos sejam entregues em tempo hábil e na quantidade contratada.
Sabemos que a escassez de produtos e equipamentos para combate à pandemia atinge a maioria dos países, mas nada justifica que o Brasil seja tão dependente da importação não só de insumos para a produção de medicamentos, como de reagentes, respiradores e, até, de simples máscaras protetoras.
Como no mundo contemporâneo o principal recurso econômico é o conhecimento, países como os Estados Unidos se desindustrializaram, isto é, deixaram para países menos desenvolvidos as velhas tarefas de produzir bens tradicionais. Curiosamente, apenas a China, onde a pandemia teve início, soube combinar alta tecnologia com a produção de bens materiais intensivos em mão de obra, tornando-se, ao mesmo tempo, o principal provedor de produtos de ponta e de uso convencional.
O Brasil, pelo visto, continuará sua trajetória de mero exportador de matérias-primas e importador de produtos de alto valor agregado. Se tanto, dada a tendência de crescente desvalorização dos seus principais produtos de exportação.