História tem atalho? É possível chegar a determinado ponto optando por um caminho alternativo mais curto? O questionamento é sobre a viabilidade de se atingir uma meta coletiva que tem por objeto uma coletividade maior – um bairro, uma cidade, um país ou até a humanidade inteira – lançando mão de estratégias objetivas e meios extremos, sem que seja necessária a construção gradual e incremental daquele desejo no decurso do tempo.
A resposta é positiva. Contudo, essa possibilidade de catálise histórica não se conjuga (e não deve se conjugar) com democracia. Há intervenções profundas conduzidas por grupos que se pretendem na condição de faróis coletivos e que geram resultados de impacto amplo na organização de determinada sociedade. E elas normalmente estão associadas a golpes, revoluções (outro nome eufemístico e autovalorativo para “golpe”), contextos de guerra e autoritarismo.
Portanto, se há algo na história que se assemelha a um atalho, quem o toma assume o risco de guiar seu povo, na verdade, a um ponto anterior no percurso. Em termos temporais, isso não seria possível, é claro. O máximo que se teria seria um novo contexto, com forma aparentemente inédita, mas substância velha.
Tal risco é evidente no presente, quando temos exemplos e subsídios históricos fartos em favor dos benefícios (ou da menor carga de consequências colaterais nocivas) que reserva a evolução lenta e constante de um corpo social. Os “cavalos de pau” nas instituições políticas demonstraram-se trágicos em seus transbordamentos, especialmente para os grupos que os faróis pretendiam iluminar e que, logo, não tinham luz própria.
Um país tem leis. O cidadão que as infringe, independentemente do papel que desempenha, deve responder. Não concordar com as leis? É um direito, e as regras coletivas não são, nem têm que ser eternas. É necessária a revisão permanente delas, mas, assim como no decurso da história coletiva, de maneira incremental, sem sobressaltos. E essa constitui uma das principais funções do Poder
Legislativo. De toda forma, ainda que se questionem as normas, também aprendemos que elas devem sempre gravitar sobre as pessoas. Não pode haver homem acima das leis.
Pois o respeito à legislação e o trabalho de vigilância pelo cumprimento dela e por sua revisão são alguns princípios democráticos. Portanto, favorecer a evolução gradual, permanente e universal de uma sociedade requer, antes, apreço à democracia.
Mas há o contrassenso. Líderes de partidos, gente da imprensa, parlamentares, movimentos da sociedade e intelectuais acalentam grandes desejos para o Brasil. Para vê-los se concretizarem, flertam com os supostos atalhos e, assim, não demonstram disposição para relegar aos netos e bisnetos os possíveis frutos desses sonhos coletivos. Sonham-nos para já. Entretanto, nos atalhos na história não cabem partidos, imprensa, Parlamento, movimentos sociais e pensamento independente.
Defender punição sem crime como solução fácil e reformas para romper com a história é suicídio para quem defende.
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