Mesmo cercada pelas dificuldades decorrentes da precária articulação política do governo Bolsonaro nas duas Casas do Congresso, a reforma da Previdência conseguiu vencer sua passagem pela primeira votação no Senado. Um êxito do senador Davi Alcolumbre, nos mesmos moldes que colocaram em destaque o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, pela sua liderança junto aos deputados, quando por lá passou a mesma reforma.

Principal bandeira do atual governo, a nova Previdência pretende ser o marco sinalizador de um novo Brasil, no caminho do equacionamento de seu déficit fiscal, tido por muitos como motivo da insegurança que carregamos na nossa imagem, diante, principalmente, dos investidores internacionais. Não conseguimos, na opinião de uns tantos, atrair investimentos, tendo como obstáculo a instabilidade econômica decorrente da nossa prática de gastar mais do que temos. Resumindo, o déficit público é tido como o nó górdio que sela nossos caminhos na direção do desenvolvimento econômico e social.

O texto original, formulado pela equipe do ministro Paulo Guedes, estava estruturado na perspectiva de se economizarem R$ 1 trilhão em dez anos, mas não passará de pouco mais de R$ 840 bilhões em igual período. Esse decote nos números sonhados está em pequenas modificações que deputados e senadores conseguiram fazer até o atual estágio de votação, devolvendo ao abono salarial, por exemplo, um poder que o faz alcançar beneficiados com ganhos de até dois salários mínimos, um pouco além dos R$ 1.364 lançados no projeto inicial do governo. Outras pequenas concessões foram feitas, como um ato de justiça aos trabalhadores menos favorecidos. Bingo.

O mal está em que a reforma vai deixar para Estados e municípios a incômoda discussão de privilégios abrigados nas folhas de pagamento desses servidores públicos, estes, sim, de quase impossível ajuste. Governadores e prefeitos de todo o país, quase todos, não querem enfrentar o corporativismo atuante nas unidades da Federação e nos municípios, certamente pelo receio de que eventual realinhamento das despesas com pessoal, cortando privilégios e ganhos sabidamente não suportáveis em médio e longo prazos, possa lhes trazer prejuízos nas próximas eleições. É uma postura medrosa e irresponsável, mas decisões regionais são, via de regra, assim inspiradas. Vale mais o grito das corporações que amedronta nossos gestores públicos.

Querendo ou não, tais mudanças são inadiáveis. A Lei de Responsabilidade Fiscal não é mais o instrumento suficiente para limitar gastos com pessoal; municípios muitas vezes sonegam à população seus serviços genuínos para ficar nos limites da lei; não reformam escolas, não melhoram o atendimento nos postos de saúde, mas usam verbas de até 8% de seus Orçamentos para comprar a boa relação com as Câmaras de Vereadores, cheias de gastos com representação e com assessores que trombam nos seus corredores. Nos Estados, igualmente, não há limites para os repasses aos seus Judiciários, às suas Assembleias legislativas, tribunais de Contas e tribunais militares, além de generosas aposentadorias estendidas a alguns segmentos dos Três Poderes.

Dinheiro não há, neste momento de crise econômica que transcende as nossas fronteiras. A economia mudou no mundo. E, no Brasil, não se veem ações que a façam reagir. Sem reformas, sem trabalho, sem criatividade e menos bancos na economia, iremos mais ao chão.