As eleições parlamentares francesas confirmaram os sinais emitidos pelo pleito europeu ocorrido algumas semanas atrás, ou seja, o crescimento da direita nacionalista no país. É uma clara indicação de que a França vem cedendo diante da onda de populismos que se espalha pelo mundo, levando ao poder governos que flertam com instrumentos cada vez mais distantes dos pilares da democracia.

Os resultados do pleito francês precisam ser enxergados com atenção e cautela, com o objetivo de entender seu real significado. Para além dos 33% alcançados pelo partido de Marine Le Pen, o Reagrupamento Nacional, é preciso olhar para o resultado da Nova Frente Popular, uma coligação de esquerda formada pelo Partido Socialista, Partido Comunista da França, França Insubmissa e Europa Ecologia. A frente recebeu 28% dos votos franceses.

A grande estrela dessa coalizão é a França Insubmissa, fundada por Jean-Luc Mélenchon, que obteve 22% nas últimas eleições presidenciais, chegando ao terceiro lugar. O corte político do partido é um populismo de esquerda, centrado no nacionalismo e naquilo que se convencionou chamar de “euroceticismo”. Sua popularidade vem crescendo a cada eleição e, por mais que guarde semelhanças programáticas em vários aspectos com o Reagrupamento Nacional, este pode se colocar como seu principal antagonista nas próximas eleições presidenciais, em 2027.

Estamos diante de uma mudança profunda no sistema político francês, que durante décadas oscilou entre a centro-direita e a centro-esquerda, elegendo gaullistas de um lado e socialistas de outro. O cenário de hoje reservou aos gaullistas um vergonhoso papel de coadjuvante, assim como os socialistas, que caminharam como um simples apêndice da coalizão de esquerda. À medida que o centro se enfraqueceu, os extremos ganharam força e passam, a partir de agora, a comandar o palco político.

Se observarmos as somas dos votos impulsionados pelo populismo, temos uma clara noção do problema enfrentado pela França. Um total de 61% dos franceses optou por soluções populistas ou ligadas ao populismo. Isso significa que a agenda anti-imigração, eurocética, nacionalista, protecionista e conservadora social de Le Pen e o nacionalismo eurocético, protecionista e socialista de Mélenchon encontraram um enorme eco na sociedade. Com algumas sutis diferenças, o eleitor optou pela mesma receita com colorações ligeiramente diferentes, mas similares na essência.

Tudo indica que o caminho do populismo até o Élysée está muito bem asfaltado e neste momento se tornou inevitável. Até lá, tudo aponta para um governo de coabitação entre os vencedores do pleito legislativo e o presidente Macron. Haverá um primeiro-ministro que carrega visões e projetos diferentes do presidente, algo que será um desafio para o sistema político e terá forte influência na sucessão de 2027.

O mundo vive mais uma onda impulsionada em muitos aspectos por atores externos com muito pouco apreço à democracia, que visam balançar os pilares de nações do ocidente para o surgimento de autocracias simpáticas aos seus regimes. Resta saber se o populismo francês flertará com a irresponsabilidade ou se será simplesmente mais uma guinada nacionalista.