Não é de hoje que a ciência nos alerta que o clima está mudando no mundo todo. Mas é quando sentimos seus efeitos no dia a dia é que nos conscientizamos que essas mudanças vieram para ficar e que é preciso agir. De acordo com pesquisa realizada pela Confederação Nacional de Municípios, 93% dos municípios brasileiros foram atingidos por algum tipo de desastre natural entre 2013 e 2022.
Ondas de calor, geadas, vendavais e tempestades, cada vez mais fortes e frequentes atingem áreas urbanas e rurais. Mas é nas cidades, onde se concentra o maior número de pessoas, negócios e infraestruturas, que a situação é mais grave, afetando de forma mais dramática os mais pobres, que já vivem em condições precárias e têm mais dificuldade para se reerguerem.
Ações em nível local
Promover a transição energética de combustíveis fósseis para energias limpas, por exemplo, deve ser um compromisso nacional. Mas é necessário também, em nível local, adaptarmos nossas cidades para conviver com riscos de desastres, dando especial atenção às populações mais vulneráveis.
Municípios têm sido convocados a elaborarem Planos Locais de Ação Climática e Planos de Prevenção e Gestão de Risco. Mas é fundamental que sejam feitos com ampla participação da população, para a identificação dos riscos e das áreas mais críticas a receberem intervenções prioritárias. Atuar em várzeas inundáveis e encostas sujeitas a deslizamentos, implementar sistemas de alerta e mobilização comunitária, incrementar a arborização urbana, as áreas verdes e permeáveis na cidade, reduzir a produção de lixo e aumentar a reciclagem são algumas das ações urgentes, em escala local, a serem priorizadas.
Mudanças de comportamento
É preciso, ainda, incentivar o comércio local, o caminhamento a pé, o uso da bicicleta e a melhoria do transporte coletivo para reduzir deslocamentos, emissões e a dependência do automóvel particular. É verdade que tudo isso depende de políticas públicas integradas, mas também de mudanças importantes nos nossos padrões de consumo e na forma como nos relacionamos com a natureza.
Os desafios são ainda maiores para os municípios de pequeno e médio porte (94% dos municípios do país) que, em geral, contam com recursos, informações e capacidade técnica insuficientes. Daí a importância de processos participativos para a identificação dos riscos locais, mas também de potenciais soluções, muitas delas presentes em práticas sociais e saberes tradicionais com frequência dispersos e invisibilizados no próprio território.
E como o clima, assim como a expansão urbana, não encontra barreiras nos limites municipais, é fundamental recuperarmos a bacia hidrográfica como escala de atuação no combate às mudanças climáticas. Neste sentido, soluções de prevenção e gestão de risco por meio da associação de municípios de uma mesma bacia, são altamente recomendáveis, inclusive para compartilhar custos.
Construção coletiva de soluções
Na escala dos bairros, a adoção de soluções baseadas na natureza, como telhados verdes, jardins de chuva e pavimentos drenantes, disseminados em construções e ruas de uma mesma sub-bacia, podem reduzir de forma significativa as enxurradas que causam inundações.
Em última análise, será necessário também que os municípios experimentem novos formatos de governança, envolvendo os diversos setores da gestão municipal, do empresariado local e da sociedade civil, na construção coletiva de soluções que incorporem iniciativas em curso, inovações tecnológicas, mas também mudanças de hábitos, práticas e valores que promovam transformação social e justiça climática.
(*) Natália Aguiar Mol e Rogério Palhares Zschaber de Araújo são professores do Departamento de Urbanismo da UFMG e Pesquisadores do Núcleo RMBH do Observatório das Metrópoles.