“Há músicas que contêm memórias de momentos vividos. Trazem-nos de volta um passado. Lembramo-nos de lugares, objetos, rostos, gestos, sentimentos. (…) Mas há músicas que nos fazem retornar a um passado que nunca aconteceu.” – Trecho do livro “Na Morada das Palavras” (Papirus Editora, 2003), de Rubem Alves, escritor, psicanalista e educador, evoca a importância da música em nossa história humana.
 
A música faz com que sintamos emoções positivas ou negativas. Ela evoca emoções que são ativadas em partes e áreas de nosso cérebro, por exemplo: córtex, amígdala, cerebelo, hipocampo etc. 
 
É possível ativar essas áreas ainda mais positivamente quando trabalhadas com a música. Melhora o humor, a atenção, concentração, a memória e lembranças profundas. Em tempos de pandemia, foi esta mesma música que conectou milhares de pessoas. Seu efeito agregador e contagiante fala alto no ser humano. 
 
Vi, nestes últimos dias, dois momentos que partilho com você. O primeiro proporcionado pela Orquestra Filarmônica de Minas Gerais, que realizou uma belíssima apresentação pela passagem do 1º de Maio na praça da Savassi. O concerto faz parte da programação do BH É da Gente, realizado pela prefeitura, e marcou o retorno das apresentações ao ar livre da Filarmônica, desde o início da pandemia. 
 
Foi impressionante ver os clássicos da música brasileira, escolhidos pelo regente Fábio Mechetti, arrebatar a emoção dos participantes. Uma senhora assentada um pouco atrás dizia: “Ver isso invade minha alma de alegria. Se fosse para ir embora deste mundo hoje, eu iria feliz”. A percepção de felicidade expressa por essa senhora diz da força das emoções positivas. Diz do impacto desses momentos em nossas mentes e das ativações que provocam. O ritmo bem elaborado, a beleza da melodia e o mais curioso para mim: nos faz estar atentos, nos faz nos conectar com o nosso melhor. Não é qualquer melodia que provoca isso. Muitos ouvem o que chamam de música para se fundir com guetos, para os distanciar mais ainda de suas subjetividades.
 
Mesmo letras inovadoras podem dizer verdades sem agredir. Ainda não consigo ver que defesa pode existir em letras que desumanizam a mulher e empobrecem as relações. É preciso voltar para dentro de si mesmo para ouvir-se. 
 
O segundo momento foi por meio da escuta de um novo cliente que me procurou. Especialista na recuperação de instrumentos e na afinação deles, foi acometido de um zumbido permanente no ouvido. Não fossem os incômodos, a situação ainda dificulta a fluidez do seu trabalho e o deixa imerso em uma tristeza. “Eu escuto a alma do som, e tudo o que atrapalha isso provoca um ruído interno. Ao mesmo tempo em que não ouvia os sons e notas específicas, fui ouvindo minhas dores e faltas”. 
 
As duas experiências com a música dizem do mesmo caminho de conexão: escuta dos nossos ritmos internos e do mundo. Permita-se e treine a si mesmo nestas conexões e sons. Aprenda a ouvir-se. Aprenda a ouvir seu corpo e este mundo que nos acolhe. Retome os ritmos saudáveis que nos conectam com o nosso melhor, e eles, os bons sons, estão por aí em nossa cidade! 
 
Boas escolhas. 
 
*Otávio Grossi é filósofo, mestre em psicologia, psicopedagogo de autistas e mentor de empresários. Escreveu o livro “Conquistas Autênticas”, da editora Cândido. É colunista do jornal O TEMPO e participante do programa Interessa, nas segundas-feiras, na rádio Super 91,7 FM.