Ao falar de completude, de faltas e de buscas, de coisas que lutamos para ter, me envolve o pensamento de ser.

Vim à minha cidade natal para o aniversário de 15 anos de meu sobrinho Gabriel.

Talvez como muitos, eu também perdi coisas na pandemia. Perdi umas e ganhei outras. Talvez as que perdi tenham me machucado mais devido à minha eterna luta em não aprender a ser mais humilde. Acredito até que esse olhar para as nossas supostas perdas deva ser porque não aprimoramos mais nosso olhar. Com foco apenas no que não temos, ficamos míopes às vitórias, aos ganhos que temos a cada momento. Longe de uma fala que justifique o não ter por uma aceitação tácita ou explicativa do não ser necessário. Quando não temos algo que principalmente configurava nosso conforto ou facilidades, conviver com essas faltas nos coloca de frente com sentimentos de inveja e falta de serenidade.

Para ser mais explícito, precisei vender meu carro nestes cenários de apertos. Mas essa falta inicial de uma mobilidade ou conforto, ou de não dependência do outro, me fez pensar nas minhas escolhas e em como meu coração ainda tem muito para melhorar.

Vende-se o carro, mas não se vende a alma. Dá mesma forma que se pode comprar um carro sem que se adquira a independência e leveza de alma.

Sentado no banco da rodoviária ao lado de uma mala pequena e do contêiner da Serena, a cadelinha que me acompanha sempre, penso na vida, no que se ostenta em ter e no que se conquista em ser. Só depois de se fazerem as pazes com o que temos no agora é que se vislumbra o que podemos ter. Não quero a miopia do não ver o essencial. Quero a paz da vida em sintonia e adaptável. Quero a paz de ser leve. O bom é que sei que me abato por alguns momentos, mas o que fica é o aprendizado com a conversa com minha tia de 88 anos: eu adoro a vida!

 

*Otávio Grossi é filósofo, mestre em psicologia, psicopedagogo de autistas. Mentor de empresários. Escritor do livro “Conquistas Autênticas”, da editora Cândido. É colunista do jornal O TEMPO e participante do programa Interessa, nas segundas-feiras, na rádio Super 91,7 FM.