Paulo César de Oliveira

Relação diplomática

Brasil e EUA após o resultado das eleições norte-americanas


Publicado em 10 de novembro de 2020 | 03:00
 
 
 
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Fico com esta análise sobre as futuras relações entre Brasil e Estados Unidos agora que Trump foi “dispensado” do Poder pelo eleitor norte-americano: “não pode ser uma relação de amigos, de compadres que têm certas tendências parecidas. A relação terá que ser normalizada, no âmbito diplomático”. E, se me convenci do acerto da análise, foi por ela ter sido feita por alguém com vivência e capacidade para olhar as coisas como elas são, sem paixões. São avaliações do professor Arturo Valenzuela, da Universidade de Georgetown (EUA).

Valenzuela colaborou com a campanha de Joe Biden e foi subsecretário responsável pelas relações com a América Latina no primeiro governo de Barack Obama. Também foi chefe do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca no segundo mandato de Bill Clinton.

Essa visão desmistifica a tese de que tudo mudará nas relações internacionais e, em especial, nas tratativas entre Brasil e Estados Unidos. Mudará, sim. Elas, ao contrário do que pensava Bolsonaro, deixarão de ser um conchavo entre amigos para serem tratadas de forma profissional, de respeito mútuo e de defesa de interesses muitas vezes conflitantes. Aliás, a cada dia fica mais evidente que o amadorismo de Bolsonaro é que levou a essa crença de que Trump é alguém que trate o Brasil com “especial carinho”, como um irmão mais velho cuida do caçulinha da família.

Bolsonaro foi tão ingênuo – ou terá sido espertalhão? – que tentou fazer de seu filho Eduardo, deputado federal por São Paulo, embaixador do Brasil nos EUA com um argumento pueril: ele teria um relacionamento fácil com Trump, que se tornara seu amigo.

Foram muitas as demonstrações de deslumbramento do governo brasileiro com a suposta influência da amizade entre os dois presidentes. A mais ridícula é curar uma doença desconhecida da ciência. Difícil não acreditar em um jogo de interesses envolvendo os dois novos amigos. Se a derrota de Trump acaba com um sonho infantil de Bolsonaro, a vitória de Biden não deve alimentar uma esperança juvenil nas oposições, em especial nos grupos de esquerda.

O novo presidente norte-americano não vai impor ao Brasil tudo o que desejam os que torcem pela derrota do capitão. Divergências? Sim, elas vão ocorrer, mas não pensem que serão tão profundas a ponto de obrigar grandes guinadas no comportamento brasileiro. Não sonhem com heróis do forte apache impedindo queimadas na Amazônia ou defendendo os direitos humanos. Quem sonhar com isso vai cair da cama.

Alguma coisa vai mudar, é claro, assim como teremos mudanças internas provocadas pelos resultados das eleições do próximo domingo. O quadro é de mais uma derrota política de Bolsonaro que as pesquisas mostram amplamente vencido nas grandes cidades, o que poderá complicar o seu projeto político de reeleição e torná-lo ainda mais dependente do centrão. Ruim para ele, pior para o Brasil.

Pior para o país, que terá um presidente atrelado e dependente dos chamados “burgos podres”, que, na troca de favores entre eleitores e candidatos permitem a eleição de populistas, quase sempre permissivos com a corrupção, que se aliam aos presidentes, governadores ou prefeitos em troca de benefícios.

Foi assim, só para citar um exemplo bem próximo no tempo, que a Arena sustentou os governos militares brasileiros. Foi a eles que Sarney se viu obrigado a se aliar para dar sustentação política a seu governo. Foi o que Lula e o PT fizeram. É o caminho que Bolsonaro, em cima do palanque, começa a trilhar.

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