É lamentável o nível de desorganização do setor público no Brasil em termos do Orçamento Geral da União. A estratégia de equilíbrio das contas públicas vem se processando por meio de corte de despesas, de aumento de impostos, de receitas extraordinárias derivadas de concessões e de privatizações. Prevalece, sem dúvida, a perspectiva de uma dominância contábil sob o imperativo do equilíbrio interno e externo das contas públicas. Qual o problema, então?

São, pelo menos, três. Como o governo federal não dispõe de um processo de planejamento de médio e de longo prazos, o corte das despesas se realiza sem uma definição de prioridades, com os cortes sendo selecionados casuisticamente em função da vocalidade e da pressão política da base de sustentação do governo e da disponibilidade de recursos em cada rubrica do Orçamento.

Em segundo lugar, por não dispor de uma visão de futuro para o país, o governo federal torna-se um multiplicador de incertezas para todas as instituições públicas e privadas que dependem, direta ou indiretamente, de algum recurso orçamentário, de custeio ou de investimento para a implementação de seus projetos.

Finalmente, como não há uma avaliação sistemática dos programas, projetos e atividades que compõem o Orçamento, frequentemente, de um ano para o outro, vão se corrigindo linearmente os diferentes gastos públicos, de forma tal que sua estrutura torna-se inflexível, independentemente de ter sido construída ao longo do tempo por meio de uma gestão pública ineficiente e de clientelismo político recorrente.

Diferentemente dos orçamentos tradicionais, que são de natureza repetitiva, o orçamento de base zero não faz apenas pequenas variações nos orçamentos passados, mantendo sua estrutura de base. Na verdade, o orçamento de base zero permite incorporar a nova agenda de prioridades da sociedade nas políticas, programas e projetos ao longo do processo de alocação dos recursos escassos disponíveis. Identifica e elimina atividades e funções programáticas obsoletas e socialmente inúteis. Amplia o grau de comunicação transversal e de interdependência entre políticas públicas de diferentes órgãos. Descortina oportunidades de privatizações, de terceirizações e de concessões de bens e serviços públicos e semipúblicos. Impõe a necessidade de que servidores públicos organizem suas metas e seus objetivos em função de sua missão, a partir de retreinamento profissional específico. Pode envolver certamente a necessidade de desvinculação dos recursos orçamentários de determinadas despesas previstas nas legislações vigentes.

De acordo com a metodologia do orçamento de base zero, nenhum órgão da administração direta e indireta dispõe, inicialmente, de cotas preestabelecidas ou corrigidas segundo regras uniformes.

É bastante provável que, no processo de mudanças a serem implementadas, surja o imperativo de reduzir o número atual de ministérios e de órgãos da administração federal; que programas e projetos de interesses clientelísticos ou velados tenham que ser desativados; que, ao adotar o modelo de planejamento participativo, as burocracias tenham que compartilhar seu poder de decisão com os novos protagonistas sociais; que novos programas e projetos inovadores sejam incorporados à agenda orçamentária.

Como parte da formulação e da implementação de um orçamento de base zero, há um conjunto de reformas de base que precisam ser realizadas a partir da avaliação dos acertos e dos desacertos das instituições e políticas públicas vigentes. Uma proposta utópica? Não. O Brasil precisa se reorganizar para sair da armadilha de mediocridades políticas em que está sufocado e viver um longo período de grandes transformações socioeconômicas e socioambientais compatíveis com suas potencialidades de desenvolvimento e com as aspirações de sua população.