A inveja habita no fundo de um vale onde jamais se vê o sol. Nenhum vento o atravessa; ali reinam a tristeza e o frio, jamais se acende o fogo, há sempre trevas espessas (...). A palidez cobre seu rosto, seu corpo é descarnado, o olhar não se fixa em parte alguma. Tem os dentes manchados de tártaro, o seio esverdeado pela bile, a língua úmida de veneno. Ela ignora o sorriso, salvo aquele que é excitado pela visão da dor (...). Assiste com despeito o sucesso dos homens e esse espetáculo a corrói; Ao dilacerar os outros, ela se dilacera a si mesma, e este é seu suplício.” Ovídio (43 a.C. – 17 ou 18 d.C.)

Já sentiu inveja? Conhece um invejoso? Esse sentimento que muitos negam é uma triste realidade.

Nas sociedades, há pessoas que inovam, desenvolvem, fazem o mundo andar. Têm medo, erram, mas encaram os problemas. Ao viverem a própria vida, levam o mundo para frente. Por outro lado, há pessoas imóveis, que não criam, não inovam, não pensam, não contribuem para a evolução. O invejoso pertence a esse segundo grupo.

Para falar sobre inveja, não há melhor referência que o mito de Aglauro, contado por Ovídio. Nele, o deus Hermes apaixona-se por Herse, uma bela princesa mortal. Humildemente, ele pede ajuda à irmã dela, Aglauro, que exige moedas em troca. 
Chateado, Hermes conta a história a Atenas, que manda a inveja infectar Aglauro durante a noite.

A partir desse momento, a vida de Aglauro se transforma. Ela não dorme, pensando em tudo que a irmã pode ter ao se casar com Hermes. Não é mero ciúme, já que ela não se interessa pelo deus, mas inveja: ela não aceita que a irmã tenha o que ela não tem. Aglauro não faz nada para mudar a própria situação, apenas deseja o que o outro tem ou pode vir a ter.

Assim acontece na sociedade: aqueles incapazes de se desenvolver tornam-se sanguessugas do desenvolvimento alheio. No final da história, Aglauro é transformada em pedra – um desfecho perfeito. O invejoso é como uma pedra: só critica, mas não possui capacidade para fazer. Nunca se sentirá capaz porque não tem tempo para conhecer as próprias capacidades, só para criticar os outros. O invejoso nunca irá para frente porque ele não tem vida própria, vive a vida alheia.

A inveja é o veneno mais letal que existe porque é fabricado pela própria pessoa. Como conta Ovídio na personificação que cria, a inveja mora em um local sem sol. Não há luz para o invejoso, apenas trevas, tristeza e frio. A inveja tem o corpo magro, pois não tem tempo de se alimentar; não se limpa, tem dentes sujos, pois não tem tempo para cuidar de si mesma. Não fixa o olhar em parte alguma, não sorri, exceto quando vê o outro cair.

Ao sorrir, a inveja nem percebe que, para alguém cair, a pessoa tem de subir primeiro. O invejoso sente tanto despeito pelo sucesso alheio que se torna incapaz de perceber que ele mesmo nunca terá como cair porque não crescerá, não subirá, não irá a parte alguma.

É um veneno suicida, o mais letal que já vi, como uma cobra que morde o próprio corpo.