ROBERTO ANDRÉS

Poucos contra a educação

Se havia um consenso no Brasil era o da importância do investimento em educação


Publicado em 16 de maio de 2019 | 03:00
 
 
 
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Se havia um consenso no Brasil era o da importância do investimento em educação. Nas manifestações de junho de 2013, pedia-se: “Educação padrão FIFA”, e “10% do PIB para a educação”. Em pesquisas de opinião, e mesmo em manifestações de direita, a educação sempre foi vista como prioridade ao país.

Vale lembrar que o Brasil ocupa as últimas posições nos rankings internacionais de educação. E o gasto por aluno é cerca de metade daquele realizado por países membros da Organização pela Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Segundo esta mesma organização, o PIB brasileiro pode ser sete vezes maior em 80 anos se o país assegurar que, em 2030, todos os jovens de 15 anos estejam na escola, com nível básico de conhecimentos.

Mas o consenso da educação acabou. Os governantes decidiram atacar e jogar a população contra o ensino público. Além do corte de 30% das despesas de toda a educação, iniciaram uma onda de difamação de universidades em redes sociais.

Grupos de Whatsapp foram inundados por imagens de pessoas peladas e plantações de maconha, que seriam a realidade em universidades. As agências de checagem mostraram que elas foram tiradas de contexto e, quando feitas em universidades, de fato, eram antigas e minoritárias.

Os portões das universidades estão abertos: quem entra vê pessoas trabalhando, como em qualquer outro lugar. Pergunte aos milhares de alunos, professores e técnicos quantas vezes se depararam vagando pelos campi. Em 20 anos na UFMG, nunca vi.

Basta uma pesquisa rápida na internet para encontrar milhares de notícias verdadeiras sobre as universidades. Tem cientista inventando plástico biodegradável e isolando moléculas capazes de combater a leucemia.

A Universidade Federal da Paraíba (UFPB) criou um sistema para evitar falsificação de diplomas. Na Universidade Federal Fluminense (UFF), desenvolve-se um piso de concreto permeável; na Universidade Federal de Uberlândia (UFU), um jogo para reabilitação de braços após AVC. A lista poderia ocupar todas as páginas deste jornal em diversas áreas.

Para explicar os cortes, o ministro da Educação tentou uma performance com chocolates. Não deu certo. Talvez ele tenha faltado à aula de planejamento: no pote de vidro utilizado não cabia nem metade dos chocolates, que ficaram esparramados. Deve ter faltado também às aulas de matemática, já que ele não consegue decidir se os cortes são de 30% ou representam 3,5 chocolates em 100.

Mas parece que o governo errou na mão. Os protestos de ontem, o #15M brasileiro, mostraram que tem muita gente disposta a defender a educação pública. Milhões de pessoas foram às ruas das capitais e do interior. Manifestações bonitas e pacíficas, de gente que batalha por um futuro melhor para todos.

Já o presidente da República está nos Estados Unidos. Depois de ter homenagem recusada por patrocinadores, museu e prefeitura de Nova Iorque, Bolsonaro foi a Dallas. Da porta do hotel, chamou os brasileiros nas ruas de imbecis e afirmou que “não sabem nem a fórmula da água”.

É deste nível o presidente do nosso país. Como uma criança mimada, acha por bem atacar e difamar quem não se alinha a ele. Por isso, a ofensiva contra as universidades é tão importante para seu governo: porque ali há pensamento independente e pessoas que não vão concordar bovinamente com o que vier de cima.

Professores e estudantes, que dão duro para melhorar a vida da sociedade brasileira, não têm vida fácil. A bolsa de mestrado é de R$ 1.500, e a de doutorado, R$ 2.200. Essas bolsas, ameaçadas de cortes, são muito menores, por exemplo, que salários de assessores parlamentares fantasmas, que “trabalharam”, nos últimos anos, em gabinetes dos filhos do presidente. Como um que passou 250 dias do ano em Portugal, mas recebeu salário todos os meses no gabinete de Flávio Bolsonaro.

Como foi cantado nas ruas: “não é mole não, tem dinheiro pra milícia e não tem pra educação”.

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