A passagem está marcada: no dia 20 de fevereiro, a publicitária Roberta Sousa embarca no Panamá, onde hoje reside, rumo a Belo Horizonte, onde pretende rever a família. A bordo, além da bagagem de mão, ela vai adentrar com Tuca, uma simpática pug, que lhe fará companhia durante todo o voo. Mas, não, ao contrário do que comumente se vê, no caso dela, o cão não irá acondicionado em uma caixa de transporte, e sim no seu colo. Tuca é um “animal de assistência emocional” – em inglês, “emotional support animal” (Esan). Resumindo, um animal de companhia indicado por um profissional de saúde por meio de uma avaliação e da emissão de um atestado em quadros como ansiedade, síndrome do pânico ou depressão. E que ninguém os confunda com os cães-guia, treinados para acompanhar pessoas com deficiência visual, mesmo porque, os Esans não exigem treinamento.
No caso de Roberta, a indicação do cão se deu diante de um quadro depressivo. “E foi a melhor coisa que poderia ter me acontecido”, assegura ela, referindo-se a Tuca. A pug, aliás, até ganhou da dona o jaleco que a identifica como um animal de apoio emocional. Importante: Tuca “trabalha” 24 horas por dia na vida de Roberta, ou seja, não é só sua companheira na viagem.
A roupinha não é exigida por todas as companhias aéreas que aceitam a presença de animais de suporte emocional, mas o atestado, sim. E ele não é definitivo: precisa ser renovado de tempos em tempos (conforme norma de cada companhia).
Tempos atrás, um animal como Tuca até poderia viajar na cabine, mas caso se enquadrasse nas regras adotadas pela companhia aérea. “A empresa que uso com mais frequência, por exemplo, prevê no máximo dez quilos, somando o peso do cão ao da casinha (cujas dimensões devem permitir que caiba sob o banco)”, lembra a publicitária. Roberta também explica que a companhia que emitiu seu bilhete exige que o animal esteja com a vacinação em dia, bem como com o certificado zoossanitário internacional (CZI). “Ela (Tuca) me dará mais segurança (no voo)”, festeja a moça.
A grande maioria das companhias aéreas não cobra adicional para que os Esans viajem – mas todas exigem que o passageiro avise a necessidade da companhia na aquisição da passagem.
Vínculo emocional
Segundo a médica veterinária Liziè Buss, da Comissão de Bem-Estar Animal do Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV), os animais têm, sim, capacidade para minimizar o sofrimento psíquico, dada a capacidade deles de criar um vínculo emocional forte com as pessoas. Ela lembra que existem trabalhos mostrando que só o fato de olhar para o animal de estimação libera oxitocina, o dito “hormônio do amor”, o mesmo que a mãe libera quando está amamentando ou quando duas pessoas apaixonadas se olham. Não por outro motivo, além dos Esans e dos cães-guia, existem, ainda, os animais de terapia (levados a hospitais, por exemplo). “Muitas vezes, eles atuam como uma ferramenta para a pessoa se sentir mais à vontade para interagir. Têm o papel socializador, são redutores de estresse e melhoram a qualidade de vida da pessoas”, advoga.
A veterinária Joana Prata, do site O Meu Animal (omeuanimal.com), endossa que os bichos conseguem reduzir a expressão de várias patologias mentais, e concorda que há um aumento do interesse pelos Esans. “No entanto, devemos distinguir entre quem realmente precisa e os cuidadores que querem usufruir de um estatuto especial sem terem uma necessidade clínica”, adverte. No You Tube, o tutorial “Viajando com meu cachorro de avião na cabine (animal de suporte emocional)”, a modelo, chef de cozinha e especialista em nutrição funcional Ana Carttori dá dicas dos procedimentos para viajar com um animal de suporte emocional.
Sem perigo
A bordo, os Esans (que além de cães e gatos, podem ser roedores e até répteis) não devem apresentar riscos aos demais viajantes nem bloquear os corredores.
Atenção
A maioria das companhias pede que o passageiro comunique a situação na aquisição do bilhete, ou pelo menos até 48 horas antes do voo.
Limite
Algumas companhias não transportam mais animais no porão. Outras limitam o número de pets por voo – geralmente, três.
Jazz veio para transformar a vida de Ana Carttori
Como dito, o cão Esan dispensa treinamento, mas Jazz, de Ana Carttori, nem precisaria. “Ela não late, é supereducada, calma, paciente...”. Ana, que hoje reside em Nova York, conta que, nas decolagens, Jazz se senta no seu colo, mas mais em função do barulho. “Depois, se deita sob o assento, e lá fica a viagem toda”. Ana também coloca uma fralda (especial para pets), mas, até hoje, não teve valia. “Ela é treinada para não fazer as necessidades em local não apropriado”.
Com dois anos e meio, Jazz foi indicada a Ana Carttori por conta de crises de pânico. “E realmente me ajudou demais”, diz a moça. Involuntariamente, Jazz acabou ajudando outros viajantes também. “Um dia, indo de Nova York para a Flórida, ficamos presos nove horas no aeroporto, devido a uma tempestade de neve. Enquanto esperávamos, várias pessoas brincavam com ela e, entre risadas, falavam: ‘Você salvou o meu dia’, ou ‘Era isso que eu precisava, obrigado!’”, revela Ana, acrescentando que, nos EUA, os aeroportos vêm se adaptando cada vez mais aos “novos passageiros”: “Inclusive com área designada como banheiro para os animais: um tapetinho de grama artificial, mangueira para limpar tudo depois, sacolinhas para o número dois... Bem legal!”.
Anna Claudia, do blog Mala de Viagem, alerta, porém, que as leis são bastante rígidas nos países da Oceania. “Mas é o Japão o mais exigente nesse quesito: para entrar lá, o pet deve passar por uma quarentena de 180 dias no país de origem”. Em tempo: ela já tentou viajar com sua Cacau, mas a cadelinha é da raça pequinês, que, como outras tantas, é braquicefálica. “Essas (assim como as consideradas ‘agressivas’) não são permitidas por muitas companhias, tampouco por alguns países”. É que os braquicefálicos apresentam fragilidade respiratória, o que pode gerar complicações no voo – e até óbito.