Gabriel Molnar e Rodrigo Campelo

Em uma calçada movimentada do bairro Buritis, em Belo Horizonte, uma vending machine vende cigarros de palha e isqueiros 24 horas por dia. Se até produtos como esses podem ser comercializados de forma automática, por que não um simples paracetamol? A resposta está na regulação da Anvisa — mas a provocação escancara um movimento maior: as vending machines estão deixando de ser apenas máquinas de snacks e ganhando espaço como modelo de franquia enxuto, escalável e adaptado ao consumo urbano. Redes como FarMelhor e Balcão Urbano apostam nesse formato para expandir presença física com investimento reduzido e foco em conveniência.

A FarMelhor, rede nacional de drogarias com sede em Minas Gerais, apresentou seu projeto de vending machines durante a ABF Expo 2025 como uma nova frente de microfranquias. O modelo tem como foco locais de grande circulação, como hospitais, aeroportos, faculdades e estações de transporte. Segundo o CEO da rede, Renan Reis, a operação foi estruturada com o apoio de parceiros técnicos. “Entendemos do varejo farmacêutico, mas da operação do machine a gente não tem essa expertise. Por isso buscamos empresas parceiras que pudessem dar suporte”, afirmou.

As máquinas foram configuradas para operar dentro dos limites permitidos pela legislação sanitária. “No Brasil, a Anvisa não permite a comercialização de medicamentos isentos de prescrição fora de uma drogaria com presença de farmacêutico. Então levamos para a vending machine produtos de perfumaria, higiene, beleza, primeiros socorros e vitaminas, dentro do que é permitido”, explicou Reis.

Drogaria em uma vending machine

Nos testes iniciais, realizados com unidades descaracterizadas, uma das operações, instalada em um pequeno aeroporto, registrou faturamento médio entre R$ 15 mil e R$ 20 mil por mês, com margem líquida de 20%. “A gente prevê um payback a partir de 30 meses”, disse o executivo. O investimento inicial por máquina é estimado em R$ 50 mil.

As vending machines da FarMelhor também contam com QR Code integrado, permitindo que o consumidor acione o delivery da loja mais próxima caso o item desejado não esteja disponível na máquina. “Se estou no hospital, preciso de um shampoo ou curativo, pego na machine. Mas se estou com dor de cabeça e não tem o produto, leio o QR Code e recebo da loja mais próxima”, exemplificou.

As primeiras unidades estão sendo implantadas em Minas Gerais e São Paulo. Antes de abrir o modelo a franqueados, a rede pretende operar diretamente cerca de 20 máquinas. Além disso, a empresa estuda a utilização das máquinas como espaço de mídia. Uma das unidades exibidas na feira possui tela de 65 polegadas para veicular publicidade da própria rede. “É uma forma de rentabilizar a operação em locais estratégicos”, afirmou Reis.

FarMelhor em mais de um formato

Paralelamente, a FarMelhor continua testando outros formatos físicos, como drogarias em aeroportos, lojas em atacarejos e containers em rodovias e estacionamentos. “Hoje nós temos nove drogarias em aeroportos. Se o atacarejo tem espaço físico, colocamos a drogaria dentro. Se não tem, instalamos container na entrada ou saída”, disse.

Com atuação nacional e maior presença no Sudeste, a rede mantém planos de expansão para o Norte e o Nordeste. “A gente vem com um crescimento de uma média de 60, 70 contratos por ano, sempre buscando um alinhamento de expectativas entre franqueado e franqueadora”, afirmou o CEO. “Por trás de um investimento, muitas vezes de 500 mil reais, há uma vida. Juntar esse valor não é fácil. Então hoje somos muito transparentes em tudo que a gente faz.”

Balcão Urbano oferece vending machines para varejo e indústria

Já o Balcão Urbano surgiu durante a pandemia com a proposta de transformar vending machines em canais de venda para varejo e indústria. Segundo o diretor-executivo Marcel Magalhães, o desafio inicial foi testar os melhores produtos e os pontos mais estratégicos para as máquinas. “Queríamos oferecer uma nova experiência de consumo e usabilidade para os clientes”, explicou.

A empresa atua como franqueadora e oferece estrutura completa para o operador, incluindo tecnologia, ponto de venda, controle de estoque e operação remota. “Os números mostram que as chances de sucesso são muito maiores com uma franquia. O franqueado recebe capacitação, suporte constante e escala, o que reduz drasticamente o risco de erro.”

O modelo elimina a necessidade de estoque local, funcionários e reformas. Até 2031, a meta da empresa é capacitar mil novos franqueados. O suporte inclui orientação em operação, contabilidade, prospecção de clientes e estratégia comercial. “Eu listaria quatro pontos fundamentais: capacitação constante, recalcular a rota sempre, acompanhar os indicadores diariamente e focar em vendas. Isso ajuda a manter o rumo e crescer de forma sustentável”, afirmou Marcel.

Futuro do franchising

Com crescimento acelerado, o Balcão Urbano prevê ultrapassar 1.000 operações até 2026 e chegar a 5 mil até o final da década. A virada estratégica da empresa ocorreu em 2024, quando passou a fornecer vending machines para grandes marcas como Ambev, Eurofarma e Nestlé. “Ter essas empresas no nosso portfólio foi fundamental para o crescimento. Foi um momento muito marcante para o time inteiro”, disse Marcel.

As duas redes refletem um movimento mais amplo de digitalização e automação do varejo, agora incorporado ao sistema de franquias. Embora limitadas em certos produtos, as vending machines seguem em expansão como alternativa de baixo custo e operação simplificada para marcas que desejam alcançar o consumidor onde quer que ele esteja.