Gabriel Molnar e Rodrigo Campelo

Se Bob Esponja protege o segredo do Hambúrguer de Siri com unhas e dentes, algumas franquias da vida real seguem lógica parecida. No setor de alimentação, receitas exclusivas e mantidas sob sigilo não apenas geram curiosidade como também se tornam ferramentas importantes de expansão. É o caso do L'Entrecôte de Paris, que serve apenas um prato em toda a rede, com um molho secreto que poucas pessoas sabem preparar.

“A gente só tem um prato, e a gente não pode ter outro prato”, explica Glaucia Fernandes, diretora executiva da marca. “Qual é o nosso diferencial? É o molho secreto. 21 ingredientes, 36 horas de preparo.” Segundo ela, os franqueados não têm acesso à fórmula. Todo o preparo é feito em uma cozinha central da franqueadora, e nas lojas ocorre apenas a finalização.

O controle rígido da produção é visto como uma forma de garantir padronização e preservar o posicionamento da marca, que se inspira nos bistrôs franceses. “Hoje nós somos uma marca singular. Nós nos inspiramos nos bistrôs parisienses e temos um prato só.” Para atender novas praças, a empresa vem adotando um modelo de operação compacta, com 40 a 50 lugares, menor custo e retorno mais rápido. “É uma operação muito enxuta, então a lucratividade é muito maior. Essa é a proposta que a gente traz, que é muito mais moderna.”

Molho do L'Entrecôte de Paris atrai curiosos

No cardápio, o molho é imutável, mas as guarnições e sobremesas são renovadas com frequência. Em datas comemorativas, a marca desenvolve edições especiais. “No Dia dos Namorados trouxemos uma sobremesa diferente. Nós lançamos uma sobremesa nova. Para as lojas maiores a gente contratou um violinista.” Já no Dia das Mães, a rede firmou parceria com a confeiteira Carole Crema para criar uma receita francesa inspirada em cadernos de família.

A restrição ao acesso da receita vale inclusive para clientes com alergias alimentares. “A gente recomenda que ele não coma o nosso molho. Porque a gente não pode abrir o que tem no molho. Porque ele é secreto, literalmente.” Questionada sobre a possibilidade de informar os ingredientes em casos mais graves, Glaucia é direta: “Se a pessoa tem alergia, a gente recomenda ela não comer. Não consome.”

Rede em expansão

Para a expansão física, a marca prioriza shoppings, por considerar o ambiente mais seguro. Fora do país, o foco está em ampliar a operação em Portugal e iniciar a entrada na Espanha.

O perfil dos investidores varia, mas muitos já atuam em alimentação. “Hoje o que está muito latente dentro do nosso perfil são pessoas que já vêm da área de alimentação. Um franqueado que já tem alguma franquia de alimentação e quer ter mais uma.”

Segundo Glaucia, embora a receita seja um segredo, o caminho para o sucesso não tem mistério. “Primeiro porque somos singulares. Hoje, se você olhar, todos os cardápios são muito grandes, você tem uma operação muito complexa. A gente não. A segunda coisa é que o nosso payback [tempo que o franqueado leva para recuperar o investimento inicial] é muito menor. E você tem todo o apoio da franqueadora.”

Coca-cola popularizou o imaginário da fórmula secreta

Um dos exemplos mais icônicos de como uma receita pode se tornar um ativo estratégico é o da Coca-Cola. Desde que foi criada, em 1886, a fórmula original do refrigerante é envolta por um forte aparato de sigilo. Oficialmente, a empresa afirma que apenas um pequeno grupo de executivos conhece a receita completa e que ela nunca foi revelada ao público. O acesso ao documento que registra a receita estaria restrito a um cofre localizado na sede da marca, em Atlanta, nos Estados Unidos.

O mistério em torno dos ingredientes virou parte da construção da marca. Ao longo das décadas, a Coca-Cola transformou o segredo em um elemento de diferenciação simbólica, reforçado por campanhas publicitárias e pelo imaginário coletivo. A ideia de que o produto é único e irreproduzível, mesmo com centenas de concorrentes tentando copiar, fortalece a identidade da empresa no mercado.

Apesar de existirem versões não oficiais que alegam ter descoberto a fórmula, nenhuma delas foi confirmada ou reconhecida. A manutenção desse sigilo extremo tornou-se um modelo para outros negócios que buscam proteger o que consideram seu “coração operacional”. Em vez de registrar a fórmula como patente, o que exigiria divulgação, a Coca-Cola optou pelo caminho do segredo industrial permanente.