A Câmara Municipal de Belo Horizonte pode estar prestes a se transformar em um campo de guerra. Isso quem diz é o vereador do PT, Pedro Rousseff, após um embate entre os vereadores Juhlia Santos (PSOL) e Pablo Almeida (PL). Em conversa com a coluna Aparte, Rousseff afirmou que a esquerda irá reagir às provocações da bancada do PL e vai começar a encher a galeria com público para dar mais força aos debates: “Eles [vereadores da direita] que não têm projeto nenhum para a cidade só fazem barulho para poder fazer corte para o TikTok, para as redes sociais. A nossa bancada vai partir para cima, principalmente eu, que estou na linha de frente. Não vamos abaixar a cabeça”.

A reação veio depois de declarações de Pablo Almeida, durante discussão em plenário na última terça-feira (8 de abril), que levaram Juhlia a protocolar um pedido de censura na Procuradoria da Câmara. “Molduras boas não salvam quadros ruins”, disse o parlamentar do PL à vereadora. E completou: “Minha filha, não adianta não, não tem jeito. Para melhorar você, só nascer de novo”. Juhlia, que é uma mulher transexual, afirmou à coluna que “cada vez mais têm sido naturalizados, infelizmente, esses ataques, essas ofensas fazem parte do meu cotidiano, refletem o pensamento de uma parte da população, e que a gente, como parlamentar, deveria repudiar e não naturalizar”.

Nos corredores da Câmara, o episódio expôs o que já se cochichava em voz baixa: uma Casa dividida, polarizada entre blocos ideológicos, e com um clima que oscila entre o institucional e o teatral. Desde a eleição municipal de 2024, parlamentares temiam que os debates ganhassem um viés partidário e identitário. Aos poucos, o receio se concretiza. “A Câmara se transformou numa 5ª série”, lamentou um vereador, sob condição de anonimato.

Nos bastidores, o desconforto é evidente. “Fico envergonhado com esse tipo de comportamento, sinceramente. Um desabafo, é um horror o que tem acontecido. Fugindo de discussões importantes para a cidade, fazendo ataques pessoais”, disse um parlamentar. A crítica não se restringe às sessões plenárias. “Tem acontecido até nos corredores, cheio de cartazes aleatórios nas divisórias.”

Há, também, quem minimize os impactos dessa escalada verbal. “Ninguém está nem discutindo esse assunto. Ninguém pensa nisso. Não atrapalha, porque é uma discussão política, ninguém percebe nada”, disse outro vereador à coluna. E um terceiro pontuou: “É meio indiferente. Assim que as luzes se apagam, a animosidade diminui, e há um certo respeito”.

A própria Juhlia reconhece esse duplo cenário. “Alguns vereadores sofrem com uma certa esquizofrenia, e quando desligam as câmeras e microfones, a gente estabelece uma relação mínima com alguns vereadores. Outros têm uma radicalidade de rompimento público, e isso vai para os bastidores.” A parlamentar ainda aponta que os ataques mais contundentes vêm de dois nomes específicos: Flávia Borja (DC) e Pablo Almeida. A vereadora do DC já havia protagonizado outro episódio polêmico no início do ano, quando convidou Juhlia para uma partida de boxe durante a defesa de um projeto de lei sobre critérios de sexo biológico em competições esportivas. 

Procurada pela coluna, Flávia defendeu que os debates são parte do parlamento e que não comprometem a produtividade da Casa: “As discussões não atrapalham de maneira alguma o ritmo da Câmara que tem discutido e votado todas as questões da cidade, sem exceção. As questões ideológicas fazem parte da nossa pauta assim como tantas outras e são também um anseio da população que nos elegeu. [...] É preciso fazer um debate de ideias e não de pessoas. Da minha parte, eu sei diferenciar muito bem isso e nos bastidores trato todos os colegas, sem exceção com muito respeito. O clima nos bastidores é amigável e cordial, num ambiente leve e produtivo como nunca se viu antes.”

Pablo Almeida não retornou os contatos da coluna Aparte. Já Juhlia, ao justificar o pedido de censura, reforçou: “Esses posicionamentos deveriam ser guardados para ele. Não me interessa o que ele pensa de mim num lugar pessoal”. A vereadora argumentou, ainda, que o clima hostil deslegitima o trabalho parlamentar e compromete a construção coletiva. “O que me assusta é o silêncio da maioria. Quando esses outros vereadores não se posicionam, esse não posicionamento é uma resposta. Se a Casa não se posicionar, e essas ofensas seguirem, vai mostrar para a população que a Câmara legitima essas violências.”