Com a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Edson Fachin, nesta segunda-feira (8), o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) voltou a ser ficha-limpa e está livre, neste momento, para ser candidato nas eleições presidenciais de 2022. Nesta conjuntura, de acordo com cientistas políticos ouvidos pela reportagem, a polarização entre o petismo e o bolsonarismo tende a ser mais intensa do que seria em um cenário sem o ex-presidente Lula em 2022, e com isso, nomes ligados ao centro saem prejudicados para o próximo pleito. 

O cientista político e professor da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Leonardo Avritzer afirma que com a possibilidade de Lula ter maior participação no processo eleitoral de 2022, “reconfigura o cenário”. De acordo com o professor, o centro mais oposição a Bolsonaro sai enfraquecido da eleição para presidência da Câmara e a presença de Lula traz mais viabilidade para uma candidatura ligada à esquerda. 

“Muito cedo ainda para dizer se o ex-presidente Lula vai ser o candidato do PT, o que vai haver é uma reorganização das forças políticas na qual ele vai assumir um protagonismo muito maior do que ele teve em 2018, quando ele foi tirado não só da disputa mas da capacidade de influenciar a própria disputa” ressalta Avritizer que aponta para um realinhamento de parte do centro a Lula. “Parte das forças dos centros já estavam apontando na direção de uma reabilitação dos direitos políticos de Lula, como a declaração do ex-presidente FHC dizendo que se arrependeu de votar nulo em 2018, assim como declaração em off de importantes nomes do sistema financeiro em apoio a Lula, por exemplo”, completou. 

Para o também cientista político e professor da PUC Minas, Malco Camargos, o PT com Lula ganha mais força para a disputa e a polarização entre o petismo e o bolsonarismo também. 

“A consequência disso também impacta os candidatos de centro, uma vez que tende a uma polarização entre PT e Bolsonaro. De um lado o Bolsonaro como o representante do anti petismo e de outro lado o PT com seu jogador principal o ex-presidente Lula”, pontuou Camarmos. 

O cientista político analisa também as possíveis narrativas que serão colocadas em jogo caso o cenário de disputa entre Lula e Bolsonaro em 2022 se perpetue. 

“Caso o PT viesse sem Lula, a narrativa adotada seria o Brasil do futuro. Com Lula, a disputa tende a ser entre qual tempo foi melhor? O Brasil de Lula ou o Brasil de Bolsonaro? Essa discussão projetada no passado, com toda certeza aumentará ainda mais a polarização”, ponderou e prevê uma mudança do presidente como pressão à presença de Lula no processo eleitoral. 

“Com a presença de Lula, o candidato mais forte que ele pode enfrentar, com certeza Bolsonaro intensificará sua guinada populista. Ele deve sinalizar com auxílio emergencial e com medidas impopulares para o mercado”, disse o cientista. 

Adriano Cerqueira, que é também cientista político e é professor da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), analisa a decisão desta segunda, como positiva tanto para Bolsonaro como para Lula, sob o ponto de vista eleitoral.

“Para Bolsonaro é positivo, porque coloca a disputa presidencial em um campo que ele já conhece, pois ele foi eleito se contrapondo ao PT, pelo lado do PT, claro que o nome de Lula, de certa forma, pode estar esquecido por parte do eleitorado, mas a  partir do momento que o ex-presidente se colocar como candidato uma série de lembranças de seus governo serão postas e isso dará à Bolsonaro grande dificuldade de se contrapor. Agora, outros esforços, como Sergio Moro, Luciano Hulk, João Doria, saem enfraquecidos de um cenário com Lula e Bolsonaro na disputa”, afirmou Cerqueira.    

Mundo político

A notícia da decisão de Fachin foi recebida com surpresa no mundo político nesta segunda-feira. Para o presidente estadual do PT, deputado estadual Cristiano Silveira, “a decisão, embora tardia, devolveu o ordenamento jurídico à Justiça Brasileira”.

“Ao nosso ver essa decisão já era para ter sido tomada lá atrás e isso poderia ter evitado toda essa crise que o Brasil entrou, mas é uma decisão importante e traz justiça ao que tem acontecido com o presidente Lula”, pontuou, para o petista, caso seja desejo do ex-presidente, ele provavelmente será o candidato do partido para 2022. 

“Diversas pesquisas apontam Lula como o candidato mais forte para enfrentar Bolsonaro em 2022. E Lula também tem a natureza conciliadora, do diálogo, acreditamos sim, que hoje, dentro do campo não só de esquerda, mas do campo da política civilizatória, do campo democrático Lula é sim o nome mais forte para se candidatar”, destacou Silveira. 

Já o deputado federal bolsonarista Cabo Junio Amaral (PSL-MG) disse que ficou indignado com a decisão de Fachin e que o ministro do STF “tirou a toga para apresentar a estrela vermelha estampada”, em referência ao símbolo do PT, partido de Lula.

Mesmo com a notícia de que a Procuradoria Geral da República vai recorrer da anulação da decisão de Fachin, e de outros processos em que o ex-presidente é réu e pode ser condenado em segunda instância, o deputado considera que Lula será candidato em 2022.

“Eu já o considero candidato porque o que o STF está fazendo demonstra que, se ele (o tribunal) foi capaz de cometer a ilegalidade de colocar o maior criminoso do país elegível, quer dizer que ele é capaz de qualquer uma das outras coisas que são mais fáceis de se resolver. Seja protelando, enrolando para julgamento, seja dando decisão semelhante em outros processos, tendo em vista que outros processos também podem ter esse mesmo vício alegado por Fachin. Já vejo com certa convicção a participação dele no pleito”, disse Cabo Junio Amaral.

O senador Carlos Viana (PSD), de forma mais moderada, também critica a decisão do ministro Edson Fachin. De acordo com o senador, é preciso maior transparência para as decisões monocráticas do Supremo. 

“As decisões monocráticas do STF têm gerado muita controvérsia e insegurança jurídica no país. O que eu espero que a PGR recorra dessa decisão e que o Fachin leve à todo o colegiado detalhes da sua decisão. O Brasil precisa de transparência. Não podemos permitir que a dúvida exista e que essas decisões sejam ligadas à questões políticas”, declarou Viana. 

Já a respeito da possível presença de Lula no cenário eleitoral e das mudanças que isso traria a disputa, o senador afirmou que essa decisão ficará para o eleitor brasileiro. 

“Quem tem que decidir se sim ou não, são os eleitores. É o Brasil que, democraticamente, tem que dizer qual o caminho que deseja seguir. Não dá para se fugir da possibilidade livre de se escolher os resultados das urnas”, ponderou.

Entenda

Nesta segunda-feira (8), o ministro do STF Edson Fachin declarou a 13ª Vara Federal de Curitiba como incompetente para o processo e o julgamento das quatro ações da operação Lava Jato contra o ex-presidente, o que anula todas as condenações tomadas até agora.

Isso faz com que o ex-presidente retome os direitos políticos e volte a ser elegível, podendo assim disputar o pleito presidencial de 2022. A decisão de Fachin, que é relator da Lava Jato no Supremo, atendeu a um pedido da defesa do petista. 

Ele ainda determinou a remessa dos autos dos processos à Justiça Federal do Distrito Federal, onde os processos vão ser reiniciados do zero. Para o ministro, Moro não era "juiz natural" para lidar com os casos -  triplex do Guarujá, do sítio de Atibaia, da sede do Instituto Lula e das doações da Odebrecht à Fundação do ex-presidente. 

Com esse posicionamento de Fachin, consequentemente há perda de objetos das ações. Em contrapartida, isso faz com que os 14 processos que tramitavam no Tribunal questionando se o ex-juiz federal agiu com parcialidade também se tornassem extintos. 

O plenário do STF não precisa referendar o entendimento de Fachin. Mas, a Procuradoria Geral da República (PGR) já avisou que vai apresentar recurso contra a decisão. Assim, o caso vai ter que passar pelo aval dos onze ministros da Corte.