BRASÍLIA - A Câmara dos Deputados impôs derrota ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) aprovando a derrubada do decreto petista que aumentou alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). Ignorando a paralisação informal do Congresso Nacional pelas festividades de São João e acordos anteriormente firmados com o Palácio do Planalto, o presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), incluiu na terça-feira (24) à noite, na pauta do plenário, o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) da oposição para derrubar o reajuste das alíquotas do IOF.
O recado assustou o governo Lula (PT), que não conseguiu impedir a derrota; e o prejuízo político pode aumentar: o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), indicou que pretende pôr o PDL para votação na quinta-feira (26).
Em sessão com o plenário praticamente deserto de deputados, petistas recorreram a manobras regimentais com pedidos de adiamento de votação, retirada de pauta e questões de ordem para impedir a votação. Não conseguiram; o desejo de Hugo Motta e a pressão da oposição prevaleceram. O núcleo duro de Lula saiu derrotado com 383 deputados votando pela derrubada do decreto e apenas 98 optando pela manutenção. Nesse ínterim, se acumularam críticas a Hugo pela falta de previsibilidade, por incluir o PDL na pauta sem se abrir às negociações e o caráter de revanchismo da posição do presidente da Câmara.
Com o recado dado à equipe de Lula, restará aos ministros e articuladores políticos recorrer a Davi Alcolumbre para impedir uma derrota maior com a derrubada do decreto também no Senado Federal. À primeira vista, o tempo é curto: Alcolumbre indicou a aliados e à oposição a intenção de votar o Projeto de Decreto Legislativo ainda nesta semana, respeitando apenas o tempo hábil de a proposta sair autografada da Câmara e chegar à mesa do Senado.
Virada de Hugo
A publicação do decreto reajustando alíquotas do IOF pelo Palácio do Planalto sem alerta às lideranças do Congresso Nacional irritou o colégio de líderes e deu munição à oposição contra a equipe econômica de Lula. O presidente interveio para reduzir a tensão e minimizar a reação negativa; o ministro Fernando Haddad cercado pela ministra Gleisi Hoffmann assumiu a dianteira das negociações e apresentou sugestões para pôr fim ao impasse.
A indisposição travou o mercado à espera dos anúncios do Ministério da Fazenda e da reação da Câmara dos Deputados e do Senado Federal; reuniões foram feitas até em um domingo à noite, e o cenário parecia bem acertado com as intervenções de Hugo Motta e Davi Alcolumbre para articular um meio-termo que atendesse parcialmente as exigências de um e de outro lado; a oposição cobrando um reajuste nas contas da União, e o governo Lula (PT) propondo a manutenção parcial do decreto do IOF e compensando a mudança com a tributação das letras de crédito Imobiliário (LCI) e do Agronegócio (LCA).
O remendo saiu pior que o soneto. A oposição liderada pelos deputados Zucco (PL-RS) e Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) manteve a pressão pela derrubada do decreto e ganhou como aliada a bancada do agronegócio. Àquela altura eram mantidos os acordos principalmente acertados na Câmara dos Deputados. O presidente se comprometeu a votar a urgência do PDL, mas não o mérito e poria fim à discussão. Mas a indisposição virou o tempo nos últimos dias e resultou na resposta que Hugo Motta deu ao Lula na terça-feira, incluindo na pauta das votações o PDL para derrubar o decreto do IOF.
As razões para mudança no humor do presidente da Câmara são ventiladas nos bastidores. Interlocutores analisam que fatores recentes que atacam os índices de popularidade o deixaram insatisfeito. O primeiro na reta é a repercussão do Projeto de Lei Complementar (PLP) que aumenta o número de deputados na Câmara e implica em um aumento de R$ 65 milhões nas despesas por ano. A irritação se agravou com os efeitos negativos da sessão do Congresso no último dia 17, que derrubou um veto de Lula e resultou em um provável aumento nas contas de energia elétrica para os consumidores. A indisposição é temperada, ainda, pela lentidão do governo Lula para liberar o pagamento das emendas parlamentares.