Investigação

CPI da Covid: senadores governistas apresentam votos em separado

Para Rogério e Girão, a CPI tentou criar uma “narrativa para atribuir responsabilidades por eventuais erros e omissões do governo federal durante a pandemia

Por Renato Alves
Publicado em 26 de outubro de 2021 | 12:12
 
 
 
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Dois dos senadores governistas que integram a CPI da Covid-19, Marcos Rogério (DEM-RO) e Eduardo Girão (Podemos-CE), apresentaram votos em separado ao texto do relator, Renan Calheiros (MDB-AL), na manhã desta terça-feira (26), quando o colegiado se reuniu para votar o parecer final.

Para Rogério e Girão, a CPI tentou criar uma “narrativa” para atribuir responsabilidades por eventuais erros e omissões do governo federal durante a pandemia. Eles também acusaram colegas da comissão de agir conforme caráter "eleitoral".

Girão afirmou que a comissão foi “covarde” ao não investigar a atuação de governadores e os repasses do governo federal a outros entes federados. O senador ainda acusou a CPI de ser parcial, citando especificamente o relator Renan Calheiros.

"A CPI elegeu um relator com flagrante conflito de interesses, pois seu filho é governador de um estado da federação envolvido nas investigações sobre o Consórcio Nordeste", afirmou Girão, em referência ao governador de Alagoas, Renan Filho (MDB).

Em seu voto, Girão pediu que a Procuradoria Geral da República (PGR) aprofunde as investigações sobre a possibilidade de ocorrência do crime de prevaricação pela mesa diretora da CPI por não deliberar sobre requerimentos “engavetados". 

Girão também pediu o indiciamento do secretário-executivo do Consórcio Nordeste, Carlos Gabas, além de solicitar o aprofundamento de investigações por organização criminosa sobre o papel desempenhado pelas empresas Davati e Precisa Medicamentos com o governo federal.

Já Marcos Rogério afirmou que é um “golpe rasteiro” querer atribuir ao presidente da República a responsabilidade pelos problemas causados pela pandemia do novo coronavírus. Rogério disse que a CPI foi marcada por muitos “absurdos e atecnias jurídicas”. “Se restou claro que queria se confirmar uma narrativa política”, afirmou.

Marcos Rogério criticou também o que chamou de “cruzada de parte dos membros da CPI contra a autonomia médica”. De acordo com o senador, o uso de substâncias no tratamento contra a covid-19 deve ser analisado caso a caso. Ele afirmou que “o mínimo” que a CPI deveria ter feito era produzir provas periciais a partir de dados concretos guiados por parâmetros científicos e "que não há isso no conjunto apurado".

Governo fez 'substanciais investimentos' contra covid, diz senador

Marcos Rogério disse que o governo federal fez “substanciais investimentos” para tentar conter o avanço da covid-19 no país. Ele apresentou números sobre leitos de UTIs, ventiladores pulmonares, kits de intubação e testes para detecção do coronavírus distribuídos a estados e municípios.

“Em 2020, foram publicadas 19.517 habilitações e, em 2021, mais 23.907 habilitações leitos de UTIs, com um valor total R$ 10,9 bilhões. Foram 17.888 ventiladores pulmonares e mais de 40,5 milhões de testes a um valor total de R$ 1,3 bilhão”.

O senador disse ainda que a União “garantiu assistência” aos quase 800 mil indígenas brasileiros que vivem em aproximadamente 6 mil aldeias.

“Por meio da Secretaria Especial de Saúde Indígena, o Ministério da Saúde reforçou o atendimento mesmo antes do decreto de pandemia feito pela Organização Mundial da Saúde. Foram disponibilizados mais de R$ 103 milhões em ações especificas para o enfrentamento da covid-19 entre os índios brasileiros”, afirmou.

Renan Calheiros chama Bolsonaro de “serial killer”

Pouco antes do início da sessão que marca o encerramento da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid-19, nesta terça-feira (26), o senador Renan Calheiros (MDB-AL) não poupou críticas ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido), quem chamou de “serial killer”, durante entrevista coletiva.

"[A situação atual] é responsabilidade desse serial killer que tem compulsão de morte e continua a repetir tudo que já fez anteriormente", afirmou Renan, que é responsável pelo relatório final, que será colocado em votação nesta terça. "Ele demonstra claramente que não zela pela saúde pública e não tem respeito pelas pessoas", completou.

Renan Calheiros afirmou que o Procurador-Geral da República (PGR), Augusto Aras, tem o dever de dar prosseguimento às investigações iniciadas pela CPI.

“O dever do PGR é dar prosseguimento. Essa investigação não é uma investigação qualquer. É baseada em provas, em depoimentos. É uma investigação que se fez à luz do dia, com acompanhamento da sociedade. Claro que o dever dele é dar consequência.”

Escolhido por Bolsonaro para o cargo e recentemente reconduzido, Aras tem engavetado denúncias contra o presidente e feito ou deixado de fazer denúncias que favorecessem Bolsonaro e seu governo.

Governador do Amazonas é incluído no relatório final

Logo após a entrevista, já com a sessão iniciada, Renan incluiu no relatório final o indiciamento do governador do Amazonas, Wilson Lima, e do ex-secretário estadual de Saúde Marcellus José Barroso Campêlo. 

O acréscimo foi feito por sugestão de Eduardo Braga (MDB-AM), que anunciou a retirada de um voto em separado que havia sido apresentado à CPI, caso Lima ficasse de fora.

“Tendo o senador Renan acatado em completo o adendo apresentado, inclusive com o indiciamento do governador e do secretário estadual, posso retirar meu voto em separado. Na realidade, ele acatou todo o relatório e apenas aditava o indiciamento”, explicou Braga.

Além de ampliar a lista de pedidos de indiciamento e incluir 11 novos nomes no relatório final que será votado nesta terça, a CPI da Covid-19 vai pedir o banimento do presidente Jair Bolsonaro das redes sociais.

Com a inclusão dos 11 nomes, o número de indiciamentos propostos deve chegar a 79. O acréscimo ocorreu após sugestões feitas por integrantes do grupo majoritário da CPI e de uma reunião desses parlamentares na segunda-feira (25) na casa do senador Omar Aziz (PSD-AM), presidente do colegiado.

A cúpula da CPI também decidiu que será votado um requerimento em plenário para que seja pedido ao Supremo Tribunal Federal (STF), em ação endereçada ao ministro Alexandre de Moraes, que Bolsonaro seja banido ou suspenso de todas redes sociais, por causa da divulgação de fake news em relação à pandemia.

A ideia ganhou força na CPI após Bolsonaro fazer, na live da última quinta-feira (21), menção a uma notícia falsa que associa a vacinação contra a Covid-19 ao desenvolvimento da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Aids). O registro da transmissão foi excluído por YouTube, Facebook e Instagram.

Os senadores também vão pedir no requerimento que a Corte determine a Bolsonaro que se retrate publicamente da afirmação, sob pena de ter de pagar multa de R$ 50 mil, por dia de descumprimento, caso não o faça.

Ainda deve ser incorporado ao relatório final da Comissão uma solicitação para que o Tribunal de Contas da União (TCU) determine à Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias (Conitec) que elabore, no prazo de 30 dias, um parecer técnico sobre os remédios.

Bolsonaro é protagonista no relatório

Os senadores vão se reunir em sessão marcada para começar às 10h. O parecer prévio foi apresentado na última quarta-feira (20) e pede o indiciamento de 66 pessoas e das empresas VTCLog e Precisa Medicamentos.

A maioria dos senadores precisa registrar voto favorável para que o documento seja aprovado. Isso significa que pelo menos seis senadores dos 11 integrantes da CPI devem registrar voto "sim" para que o trabalho do relator, Renan Calheiros (MDB-AL), seja levado adiante. Caso contrário, o parecer será rejeitado.

Figura como protagonista e primeiro citado na lista de indiciamentos de Bolsonaro. O relator credita a ele nove crimes ao longo da pandemia: epidemia com resultado em morte ao promover aglomerações; infração de medida sanitária preventiva ao descumprir a obrigação de uso de máscara; charlatanismo ao defender medicamentos sem eficácia comprovada; e incitação ao crime por incentivar a população a infringir medidas sanitárias e a invasão de hospitais.

Também, por falsificação de documento particular ao atribuir ao TCU um documento que questiona o número de vítimas da Covid-19; emprego irregular de verbas públicas ao usar recursos para a compra de “kit Covid”; prevaricação ao não agir contra suspeitas de irregularidades como o caso da vacina indiana Covaxin; crime de responsabilidade por ter atentado contra o direito à vida e à saúde ao defender a imunidade de rebanho com livre contágio; e crimes contra a humanidade, com citação a extermínio e perseguição ao longo da pandemia.

Bolsonaro é citado 80 vezes no relatório de quase 1200 páginas, que pede também o indiciamento dos filhos políticos dele Flávio (senador), Eduardo (deputado federal) e Carlos (vereador do Rio de Janeiro). Renan pede que os três sejam enquadrados por incitação ao crime na disseminação de informações falsas. Previsto no artigo 286 do Código Penal exatamente por “incitar, publicamente, a prática de crime”, a tipificação tem pena de três a seis meses de detenção ou o pagamento de multa.

Quatro ministros também são acusados pelo relator: o da Saúde, Marcelo Queiroga; do Trabalho, Onyx Lorenzoni; da Defesa, Walter Braga Netto; e da Controladoria-Geral da União (CGU), Wagner Rosário. Os ex-ministros da Saúde, Eduardo Pazuello, e das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, também são responsabilizados no relatório.

A lista traz o nome de deputados federais que atuam na tropa de choque de Bolsonaro, como Carla Zambelli (PSL-SP), Bia Kicis (PSL-DF), Osmar Terra (MDB-RS), Carlos Jordy (PSL-RJ) e Ricardo Barros (PP-PR). Este último é o líder do governo na Câmara e avisou que vai processar Renan e todos os senadores que votarem a favor da responsabilização dele.

O documento cita, ainda, outros agentes públicos e empresários em casos que envolvem a imunidade de rebanho, a disseminação de fake news, o tratamento precoce, o atraso na aquisição de vacinas, a crise de desabastecimento de oxigênio no Amazonas, a compra da vacina indiana Covaxin e a negociação paralela no contrato do imunizante da Astrazeneca.

Há também descrições sobre a negociação de testes pela Prceisa Medicamentos, o caso VTCLog, a atuação do chamado Gabinete Paralelo com comando dentro do Palácio do Planalto e as denúncias envolvendo a Prevent Senior, suspeita de usar pacientes em testes e coagir médicos a receitarem o “kit Covid” sem informar os riscos do tratamento aos pacientes.

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