Entrevista

Derrotados têm sentimento golpista, afirma ministro 

Leia entrevista com o ministro de Desenvolvimento Agrário, Patrus Ananias


Publicado em 16 de fevereiro de 2015 | 04:00
 
 
 
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O ministro de Desenvolvimento Agrário, Patrus Ananias, faz um balanço dos 35 anos do PT e condena as propostas de impeachment da presidente Dilma. Ele critica principalmente o posicionamento do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso

O que permanece e o que se modificou na ideologia do PT ao longo desses 35 anos de partido?

A essência permanece. O saldo é muito positivo. A agenda social do Brasil mudou. Em 2014, tivemos uma conquista que foi muito pouco divulgada: nós saímos do mapa da fome. Nós temos desafios, como tudo que reflete a condição humana.

A restrição de benefícios trabalhistas, anunciada recentemente pela presidente Dilma Rousseff, não rompe com a essência do PT?

Fui durante muitos anos advogado sindical, trabalhista, professor de direito do trabalho, direito previdenciário. Não senti que configure nenhum desrespeito às conquistas históricas da classe trabalhadora. São alguns acertos. Existem algumas anomalias mesmo. Têm situações que, no limite, configuram até mesmo privilégios. É claro que é importante conversar. Talvez tenha faltado um pouco mais de diálogo com as entidades sindicais e com a sociedade.

A ministra da Agricultura, Kátia Abreu, sempre defendeu uma linha de pensamento divergente da do senhor. O PT paga caro demais pela coalizão de governo?

Faz parte. Em todo lugar do mundo você tem pessoas com diferentes olhares participando do mesmo governo. Eu vou solicitar um encontro com a ministra. Fiz questão de comparecer à posse dela, fui convidado por ela. Temos nos encontrado em atividades ministeriais, estamos acertando uma conversa. Eu acho que, dentro de uma democracia, existem diferenças. E acho também que elas não devem ser escamoteadas. Existem pontos de convergência. Fazem parte da democracia as diferentes visões. O importante é que nós nos unifiquemos em torno dos objetivos estratégicos do governo.

Como estão orçamento e projetos do Ministério de Desenvolvimento Agrário? Há possibilidade de cortes em programas?

Nós sabemos que esse será um ano em que vamos ter que fazer ajustes para garantirmos desempenho mais solto. Se Deus quiser, já a partir do fim deste ou do próximo ano. É claro que a gente sempre pode aperfeiçoar. Aumentar e aperfeiçoar os critérios de fiscalização, melhorar a gestão, maximizar os recursos, criar ações integradas, intersetoriais. E, a partir dessas ações intersetoriais, criar sinergia. A gente sempre pode aperfeiçoar, inclusive, buscando mais resultados com menos recursos. E nós faremos isso. Programas que apontam a superação da miséria, da inclusão social, esses serão mantidos: Brasil sem Miséria e o Bolsa Família. Aqui no nosso ministério, Pronaf. Benefícios e políticas públicas mais diretamente voltados para assegurar a vida e promover a dignidade dos mais pobres serão rigorosamente mantidos.

Qual avaliação o senhor faz do movimento da oposição favorável ao impeachment da presidente Dilma?

Para ser sincero, é um assunto que me deixa mais do que perplexo. Não entendo.

Como o senhor definiria o impeachment em pauta?

Para mim é uma tentativa de golpe. É um golpismo, para ser bem claro. São as mesmas forças políticas. Se você fizer um resgate na história do Brasil, são as mesmas forças políticas que levaram o presidente Getúlio Vargas ao suicídio, que tentaram dar um golpe em 1955, impedindo a posse do presidente Juscelino Kubitschek. Foram as mesmas forças que tentaram dar o golpe em 1961, quando Jânio Quadros renunciou. Os mesmos que deram o golpe em 1964. Depois, o golpe no golpe, que foi o Ato Institucional número 5, de 13 de dezembro de 1968, data triste na história do Brasil.

E o que achou?

Muito ruim, muito ruim. Acho muito ruim que o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, com a autoridade intelectual que ele tem, esteja navegando nessas águas também. Eu li um artigo dele e achei muito ruim. Um artigo golpista. E justiça seja feita. Nesse resgate histórico que eu fiz aqui, ele não participou, não, mas eu achei muito ruim. Porque eu quero democracia no Brasil. Eu quero que nós consolidemos o estado democrático de direito. Acho que é legítimo ter oposição firme, combativa. Mas uma oposição dentro dos parâmetros democráticos. A presidenta Dilma foi reeleita. Ela está governando há um mês, depois de ser reeleita. Então eu sinto isso como uma coisa muito triste. É uma tentativa, um anúncio de um golpe. Vamos resistir bravamente. Infelizmente, essas forças golpistas, de direita, essas forças mais reacionárias, sempre marcaram presença na história do Brasil.

O que o senhor teme hoje?

O que eu temo no Brasil neste momento, o que está complicando, tornando as águas turvas, são esses setores que eu sinto que estão com um sentimento revanchista, de terem perdido as eleições, e sentimento golpista, de querer interromper o processo democrático no Brasil, usando formas assim, digamos, mais jeitosas de um golpe.

Quando o senhor fala em forças golpistas, se refere a quais setores?

Prefiro não indicar. Eu citei um nome aqui até porque é uma pessoa que eu respeito muito e cuja obra eu conheço. Eu citei um nome (Fernando Henrique Cardoso), mas normalmente não gosto de citar nomes, nem pessoas, nem partidos, pelo respeito que tenho pelas pessoas que pensam de forma diferente de mim. Sempre fui uma pessoa muito fiel a minhas concepções, mas também sempre uma pessoa da escuta, do diálogo, sempre buscando espaços consensuais, espaços convergentes.

O senhor prevê dificuldades para o governo no Congresso com Eduardo Cunha na presidência da Câmara?

Eu fui lá, por força da lei, tive que assumir o meu mandato de deputado para não perdê-lo. Fui deputado por dois dias, depois voltei novamente para o ministério. Não estou vivendo o dia a dia do Congresso. O que eu espero é que as questões sejam processadas sempre democraticamente. Acho importante. Tenho o maior respeito pelos adversários, sempre tive. Acho que nós não devemos temer o conflito – considero tão bonita a palavra “conflito”. E ele está em nós, seres humanos. Somos conflitivos. Lembro sempre os versos do Ferreira Goulart. Metade de mim almoça e janta. Metade de mim se espanta. Nós temos os conflitos em nós mesmos, diferentes apelos etc. Então, a democracia é conflitiva. Há forças políticas diferenciadas, os interesses, as diferentes visões de mundo, os diferentes interesses econômicos, sociais. O que acho importante, fundamental, é que os conflitos sejam explicitados. Quanto mais negados, escamoteados, pior. E que sejam processados de uma forma ética, respeitosa e democrática. Havendo isso, havendo essa transparência no processo democrático, esse conflito respeitoso, que se coloca sempre no campo da democracia pacífica, do respeito às ideias diferentes. Se o Congresso caminhar nesse sentido, acho que está tudo bem.

O nome de Helvécio Magalhães, atual secretário de Estado de Planejamento, vem sendo apontado para disputar a prefeitura da capital. O senhor tem participado ou vai participar de articulações com vistas à sucessão municipal?

É cedo. A maneira como Fernando Pimentel está conduzindo Minas Gerais está sendo esplêndida. Ele está consolidando alianças, incorporando forças de esquerda, movimentos sociais e sindical, integrando forças políticas e sociais que o apoiaram. E ainda mostrando grandes deficiências do governo que nos antecedeu, o choque de gestão que, na verdade, foi um choque na administração pública, no sentido de que estamos aí vendo os resultados, a questão hídrica e outros problemas. Agora, a sucessão de Belo Horizonte será em 2016, e o que eu posso dizer é que acho o Helvécio um ótimo nome. Trabalhou conosco na prefeitura, é amigo pessoal, respeito muito. Outros nomes do PT e do nosso arco de alianças podem surgir.

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