BRASÍLIA – Responsável pela gestão de recursos que pagam aposentadorias e pensões de mais de 235 mil servidores públicos estaduais do Estado do Rio de Janeiro, a Rioprevidência fez aplicações no Banco Master, que está sendo vendido ao BRB, o Banco de Brasília, do Governo do Distrito Federal.
O Ministério Público do DF (MPDFT) investiga a compra de parte do Banco Master pelo BRB, em um negócio estimado entre R$ 2 bilhões e R$ 3 bilhões. A investigação é conduzida pela Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público e Social (Prodep), que instaurou um inquérito civil, de ofício, na terça-feira (1°).
O MPDFT quer esclarecer as circunstâncias de compra e venda de ações entre o BRB e os acionistas controladores do Banco Master. O Conselho do BRB aprovou, em 28 de março, a compra de 58% da instituição financeira privada.
Ainda na terça (1°), o Ministério Público de Contas do DF (MPCDF) também informou que investiga a compra. Ele pediu ao BRB informações e acesso à íntegra do processo administrativo relacionado à aquisição de participação no Master.
O negócio chamou a atenção do mercado financeiro pelo rápido crescimento do Master, além de alertas de operações do banco fora do padrão levados ao Banco Central (BC). O BC e o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) têm 360 dias para analisar a negociação e concluir ou não a operação.
Já neste sábado (5), o jornal O Globo publicou que as aplicações da Rioprevidência no Master estão no bojo de um processo aberto pelo governo federal para apurar investimentos financeiros feitos por fundos públicos de pensão em 2024.
A fiscalização é conduzida pela Secretaria de Regime Próprio e Complementar (SRPC) do Ministério da Previdência Social (MPS), responsável por fiscalizar fundos do Regime Próprio de Previdência Social (RPPS).
No entanto, ainda conforme o jornal carioca, a pasta não detalhou quantos ou quais fundos públicos também são alvos da análise nem o que acontecerá se irregularidades forem encontradas.
Um parecer da SRPC diz apenas que técnicos têm recebido alertas de participantes do mercado preocupados com os critérios adotados pelos fundos de previdência públicos “e eventual influência de entes federados nas escolhas de ativos”.
Esses agentes têm pedido, segundo o documento, a possibilidade de que os investimentos de fundos de previdência do RPPS fiquem restritos a instituições financeiras dos segmentos 1 e 2 (S1 e S2).
A classificação do Banco Central agrupa o setor financeiro por atividade. Os bancos S1 são aqueles com porte maior ou igual a 10% do Produto Interno Bruto (PIB), caso do Itaú, Banco do Brasil e Caixa Econômica Federal. Já os S2, como XP e Safra, por exemplo, têm atividade de 1% a 10% do PIB.
O Master é classificado como S3, com porte proporcional a 0,1% a 1% do PIB. Segundo balanço de 2024, o banco tem R$ 2,1 bilhões em letras financeiras emitidas, títulos sem cobertura do Fundo Garantidor de Créditos (FGC), ou seja, que em caso de dificuldades do banco emissor não tem garantia de recebimento do valor aplicado.
A maior parte desse total, R$ 960 milhões, é do Rioprevidência, cerca de 10% do patrimônio no fundo.
O parecer destaca que o processo de gestão dos recursos precisa ter “seleção criteriosa” das instituições, já que são recursos públicos e previdenciários “que pertencem a uma coletividade”.
Além disso, os técnicos da Previdência observam que uma portaria ministerial de 2022 exige que ativos escolhidos por fundos do RPPS devem ser considerados de baixo risco. Para analistas, porém, a decisão do Rioprevidência de investir neste tipo de título, ainda mais com a concentração de fatia considerável do patrimônio, foi arriscada.
O documento do ministério detalha que, pela regulamentação atual, fundos do RPPS precisam aprovar em colegiado o montante a ser investido e o risco das aplicações.
“De extrema importância é a documentação de todo o processo decisório, desde a avaliação até a conclusão. Tal documentação deve ser meticulosa, registrada em ata do colegiado competente do RPPS, contendo detalhes minuciosos acerca das deliberações, incluindo a justificativa fundamentada para a opção de utilizar um intermediário em lugar da aquisição direta”, diz o texto.
Em nota divulgada quinta-feira (3), o Rioprevidência afirmou que todos os investimentos da entidade “seguem os limites e recomendações do Conselho Monetário Nacional (Res. CMN 4.963/2021), bem como a política de investimentos aprovada pelo Conselho de Administração da Autarquia”, mas não explicou o que justificou os aportes nem quais são as estratégias para garantir a sustentabilidade do fundo em caso de prejuízos com as aplicações.
Sindicato dos bancários vê transação com ‘profunda preocupação’
O Banco Master pertence ao mineiro Daniel Vorcaro, 41 anos, que é sócio em empresas de diversos ramos (como o Fasano do Itaim, em São Paulo, e o Will Bank) e dono de aproximadamente 26% da Sociedade Anônima de Futebol (SAF) do Atlético Mineiro.
Em 2023, Vorcaro ganhou destaque nacional ao gastar cerca de R$ 15 milhões na realização da festa de 15 anos da filha em Nova Lima, na região metropolitana de Belo Horizonte, com direito a show do DJ Alok. Na mesma época, ele teria comprado a mansão mais cara já negociada em Orlando, na Flórida, por US$ 37 milhões.
Daniel Vorcaro é próximo do ex-ministro Ciro Nogueira e do presidente do União Brasil, Antonio Rueda. Augusto Lima, o sócio baiano do Master, é casado com a ex-deputada federal e ex-ministra do governo Bolsonaro Flávia Peres (ex-Arruda), próxima de Ibaneis Rocha (MDB), o governador do DF, controlador do BRB.
O BRB foi criado em dezembro de 1964 para ser um agente financeiro para captar os recursos necessários para o desenvolvimento do Distrito Federal. Em 1991, passou a ser um banco com as carteiras: comercial, câmbio, desenvolvimento e imobiliária.
A empresa é uma sociedade de economia mista, de capital aberto, e o acionista majoritário é o Governo do Distrito Federal (71,92%). O BRB é uma instituição financeira com atuação no Distrito Federal e com agências no Rio de Janeiro, São Paulo, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Minas Gerais, Bahia e Paraíba.
Em 28 de março, o BRB informou aos acionistas e ao mercado sobre o contrato de compra e venda de ações entre o BRB e os acionistas controladores do Banco Master S.A., e disse que todos seriam informados “a respeito dos desdobramentos da Operação, nos termos da legislação e da regulamentação aplicáveis”.
O BRB afirmou que a operação envolveu 49,0% das ações ordinárias, 100% das ações preferenciais e 58% do capital total do Banco Master. O banco público diz estar interessado na “complementariedade de negócios”.
No fato relevante, informa que as duas empresas vão atuar apartadas, mas dividindo governança e coordenação estratégica. Afirma que o Banco Master “agrega expertise em cartão de crédito consignado, câmbio, mercado de capitais e atacado, áreas nas quais tem apresentado crescimento significativo nos últimos anos. Essa especialização complementa a estrutura do BRB, ampliando o alcance e a diversificação dos serviços oferecidos”.
Já o Sindicato dos Bancários do Distrito Federal disse, em nota publicada no último domingo (30), que tem “profunda preocupação” com a possibilidade de gestão temerária do BRB, diante da compra do Banco Master, no que tange ao interesse público e à segurança econômica da instituição.
“Ressalta-se que, em um passado próximo, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) apontou a concentração da carteira do Banco Master em precatórios, uma carteira sem liquidez, o que agrava as incertezas em torno da aquisição proposta pelo BRB”, destacou o sindicato em nota.
O Banco Master foi fundado em 1974 como corretora de valores e títulos imobiliários. Teve a aprovação do BC para operar como instituição financeira em 1990, ainda com o nome de Banco Máxima. Após a compra do Banco Vipal, a instituição foi renomeada como Banco Master, em 2021.
O Master acelerou o crescimento nos últimos anos com uma estratégia considerada agressiva. Ofereceu CDBs a taxas que chegaram a 140% do CDI (Certificado de Depósito Interbancário), enquanto o mercado mal encosta em 100%. Na posição de banco de pequeno porte, colocava o produto no mercado por meio de outras instituições. Na outra ponta, fazia empréstimos e investimentos em empresas consideradas problemáticas.