TRANSPARÊNCIA PÚBLICA

CGU vai reavaliar 234 casos de sigilo de informações impostos por Bolsonaro

Controladoria-Geral da União alegou que os sigilos impostos são questionáveis e desrespeitam a lei de transparência e acesso à informação

Por Manuel Marçal
Publicado em 03 de fevereiro de 2023 | 14:05
 
 
 
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O ministro da Controladoria-Geral da União (CGU), Vinicius de Carvalho, informou, nesta sexta-feira (3), que o órgão vai analisar 234 casos de sigilo de informação impostos pela gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro, entre os anos de 2019 e 2022.  

Ao longo de seu governo, Bolsonaro impôs restrições de até 100 anos em documentos e informações, como em seu cartão da vacinação e em visitas que recebeu no Palácio da Alvorada - residência oficial em Brasília (DF).    

A ordem para revisão dos sigilos partiu de um despacho do dia 1º de janeiro do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A partir de então, a CGU criou uma comissão para analisar 2510 casos. Desse montante, o órgão manteve a negativa total das informações para 1335 pedidos.  

Em relação aos 234 casos, a Controladoria-Geral da União alegou que os sigilos impostos são questionáveis e desrespeitam a lei de transparência e acesso à informação. Mas isso, não significa que todos serão "abertos". 

“Pode ter uma situação ou outra, a CGU pode entender que o sigilo pode ser mantido parcialmente, mas se acontecer, será uma minoria. O entendido é para abertura das informações” 

Diante disso, um parecer elaborado pelo órgão, com 12 diretrizes, vai basear o julgamento dos casos, que devem ser concluídos entre 60 e 75 dias. As súmulas também vão nortear o governo federal para que todos os ministérios e órgãos públicos se orientem a responder os pedidos de acesso. A CGU propôs também treinar servidores.  

O ministro da Controladoria-Geral da União afirmou ainda houve retrocessos da gestão Bolsonaro sobre o fornecimento de informação pública. “O que nós identificamos, e isso ficou muito claro, é que havia uma séria de argumentos que, no nosso entendimento, foram explorados de forma inadequada, extrapolaram as hipóteses de sigilo e de classificação de informação como: reservado, secreto e ultrassecretos. Queremos voltar aos padrões em que a informação é regra e o sigilo é a exceção”.

Caso Pazuello 

O ministro da Controladoria-Geral da União deu a entender que o órgão vai liberar o acesso público a sindicância que investigou o ex-ministro da Saúde, o general Eduardo Pazuello, durante a Covid-19. As Forças Armadas, à época, colocaram sigilo de 100 anos aos documentos, alegando que os dados eram pessoais. 

Com as novas diretrizes da CGU, o caso pode ser revertido. Uma das súmulas estabelece que os processos administrativos disciplinares conduzidos no âmbito das Forças Armadas são as mesmas regras referentes aos servidores civis, cabendo assim, pedido de acesso à informação. 

“Não vou fazer anuncio público de julgamentos, não vou. O enunciado (diretriz) responde qual é o tipo de preceitos que vamos usar nesses casos. É importante ressaltar que a CGU nunca fez distinção entre processos administrativos disciplinares de servidores públicos, entre civis e militares. Essa mudança de posição, ocorreu nos últimos anos. O que nós estamos fazendo, é simplesmente resgatar a postura da CGU historicamente", frisou Vinicius de Carvalho. Em seguida, enfatizou que transparência é regra e sigilo é exceção

 

Conheça as 12 diretrizes 

1 - Registros de entrada e saída de prédios públicos: Os registros de entrada e saída de pessoas em órgãos públicos, inclusive no Palácio do Planalto, são passíveis de acesso público, exceto quando as agendas sobre as quais eles se refiram forem classificadas por se enquadrarem em hipótese legal de sigilo ou estiverem sob restrição temporária de acesso à informação, nos termos do art. 7º, § 3º da Lei n. 12.527/11

2- Registros de entrada e saída de residências oficiais: Os registros de entrada e saída de pessoas em residências oficiais do Presidente e do Vice-presidente da República são informações que devem ser protegidas por revelarem aspectos da intimidade e vida privada das autoridades públicas e de seus familiares, salvo se tais registros disserem respeito a agendas oficiais, as quais têm como regra a publicidade, ou se referirem a agentes privados que estejam representando interesses junto à Administração Pública

3– Procedimentos disciplinares de militares:  Aplicam-se aos pedidos de acesso a processos administrativos disciplinares conduzidos no âmbito das Forças Armadas as mesmas regras referentes aos servidores civis, cabendo restrição a terceiros somente até o seu julgamento, nos termos do art. 7º, parágrafo 3º, da Lei nº 12.527/2011, regulamentado pelo art. 20, caput, do Decreto nº 7.724/2012. Assim, os processos administrativos disciplinares de militares são passíveis de acesso público uma vez concluídos, sem prejuízo da proteção das informações pessoais sensíveis e legalmente sigilosas.

4. Segurança do Presidente da República e familiares Durante o mandato presidencial, a classificação de informações sob o fundamento de que sua divulgação ou acesso irrestrito pode pôr em risco a segurança de instituições ou de altas autoridades nacionais ou estrangeiras e seus familiares, nos termos do art. 24, § 2º da Lei nº 12.527/2011, deve restringir-se estritamente às informações que, de fato, se enquadram nessa categoria, devendo as autoridades competentes para classificação do sigilo atentar-se para o cumprimento do princípio geral da Lei de Acesso à Informação de que o acesso é a regra e o sigilo à exceção.

5. Sigilo de licitações, contratos e gastos governamentais Informações sobre licitações, contratos e gastos governamentais, inclusive as que dizem respeito a processos conduzidos pelas Forças Armadas e pelos órgãos de polícia e de inteligência, são em regra públicas e eventual restrição de acesso somente pode ser imposta quando o objeto a que se referem estritamente se enquadrar em uma das hipóteses legais de sigilo.

6. Abertura de informações desclassificadas Transcorrido o prazo de classificação da informação ou consumado o evento que consubstancie seu termo final, a informação tornar-se-á automática e integralmente de acesso público, ressalvadas eventuais outras hipóteses legais de sigilo e a proteção de dados pessoais sensíveis, devendo o órgão ou entidade pública registrar tal desclassificação no rol de informações classificadas, o qual é de publicação obrigatória na Internet.

7. Títulos acadêmicos e currículos de agentes públicos:  Informações sobre currículos de agentes públicos, como títulos, experiência acadêmica e experiência profissional, são passíveis de acesso público, uma vez que são utilizadas para a avaliação da capacidade, aptidão e conhecimento técnico para o exercício de cargos e funções públicas.

8. Provas e concursos públicos A divulgação de documentos e informações relacionados a candidatos aprovados em seleções para o provimento de cargos públicos, inclusive provas orais, são passíveis de acesso público, visto que a transparência dos processos seletivos está diretamente relacionada à promoção dos controles administrativo e social da Administração Pública, ressalvadas as informações pessoais sensíveis.

9. Telegramas, despachos telegráficos e as circulares telegráficas produzidos pelo Ministério das Relações Exteriores: Os telegramas, despachos e circulares telegráficas produzidos pelo Ministério das Relações Exteriores são documentos que, à luz do princípio geral da Lei de Acesso à Informação de que o acesso é a regra e o sigilo à exceção, devem ter seu acesso restringido somente quando o objeto a que se referem estritamente se enquadrar em uma das hipóteses legais de sigilo. A proteção das negociações e das relações diplomáticas do País não pode ser utilizada como fundamento geral e abstrato para se negar acesso a pedidos de informação. Da mesma forma, a presença de informações pessoais no documento ou processo não poder ser utilizado como argumento para a negativa de acesso, uma vez que essas podem ser tratadas para que, devidamente protegidas, o restante do documento ou processo seja fornecido.

10. – Informações financeiras a respeito de programas e benefícios sociais: Informações referentes a valores de benefícios pagos e identificação de beneficiários de programas sociais, ainda quando esses são operados por instituições financeiras, são de acesso público, não incidindo sobre elas sigilo bancário, tampouco argumentos referentes à proteção de dados pessoais ou à preservação da competitividade de empresas estatais, ressalvados os casos em que a identificação dos beneficiários puder expor informação pessoal sensível.

11. Restrições de acesso em virtude da desarrazoabilidade do pedido: Pedidos de acesso à informação somente podem ser negados sob o fundamento de “desarrazoabilidade” caso o órgão ou entidade pública demonstre haver risco concreto associado à divulgação da informação, não podendo o argumento ser utilizado como fundamento geral e abstrato; no caso de “desproporcionalidade”, o pedido só pode ser negado se o órgão evidenciar não possuir os recursos, humanos ou tecnológicos, para atender ao pedido, não podendo o argumento ser utilizado como fundamento geral e abstrato. Nos casos em que restar configurada a desproporcionalidade do pedido, o órgão/entidade deve disponibilizar os meios para que o cidadão realize consulta in loco, para efetuar a reprodução ou obter os documentos desejados, em conformidade com o disposto no art. 11, §1º, I da Lei nº 12.527/2011. 1

12. Informação pessoal: O fundamento “informações pessoais” não pode ser utilizado de forma geral e abstrata para se negar pedidos de acesso a documentos ou processos que contenham dados pessoais, uma vez que esses podem ser tratados (tarjados, excluídos, omitidos, descaracterizados, etc) para que, devidamente protegidos, o restante dos documentos ou processos solicitados sejam fornecidos. Além disso, a proteção de dados pessoais deve ser compatibilizada com a garantia do direito de acesso à informação, podendo aquela ser flexibilizada quando, no caso concreto, a proteção do interesse público geral e preponderante se impuser, nos termos do art. 31, § 3º, inciso V da Lei nº 12.527/2011. 

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